O embaixador do Brasil em Madri, Pompeu Andreucci Neto, reagiu ao editorial de El País, denominado “Brasil em Perigo”, em carta de quatro páginas enviada ontem (28) à diretora do jornal Soledad Gallego-Díaz. No texto divulgado pela Embaixada como sendo uma resposta a “mentiras e vitupérios” de El País, o diplomata acusou o jornal espanhol de atuar com “arrogância obscurantista” na fixação por criticar o Brasil, beirando “as raias de uma verdadeira tara”, com “vocação neocolonialista”.
O diplomata inicia sua carta afirmando que, pela décima vez desde que chegou à Espanha, dirige-se ao jornal para responder ao tratamento injusto e desequilibrado que o El País concede ao Brasil, ao seu povo e ao seu governo. E condena a diretora e editores do jornal por achar que têm o falso direito de ensinar o Brasil e seu povo sobre como se comportar, como governar e como administrar sua economia, sem nunca exercer um mandato político, sem nunca ter governado um bairro e, muitas vezes, sem nunca ter visitado o Brasil, a partir do conforto de seus escritórios com ar-condicionado na Europa.
“Fingem ensinar ao povo brasileiro que está nas ruas, aquele que tenta ganhar a vida lutando dia a dia, como conduzir seus negócios, como pensar e como viver. Que pretensão e que desperdício!”, critica Pompeu Andreucci Neto. “Até quando, senhora diretora, durarão esta perseguição, esta guerra contra o meu país, seu povo e seu presidente? Até quando?”, questiona.
A chamar de “tara” a fixação do jornal em criticar o Brasil, o diplomata afirma que El País chega a cobrir notícias negativas quase com maior amplitude do que acontecimentos no continente europeu.
“No grande número de páginas que dedica ao Brasil todos os dias, o El País concentra-se no nocivo, excêntrico ou exótico. Destaca as falhas econômicas, aumenta as lutas políticas e amplia os obstáculos ao desenvolvimento social ainda a serem superados. Nesses casos, seus correspondentes e colunistas geralmente se alegram em fornecer aos seus leitores a descrição do quanto se fracassou, falhou ou retrocedeu”, escreveu o embaixador.
Pompeu Andreucci Neto reage ao editorial publicado na edição de terça-feira (26), que criticou o que chamou de “gestão errática” do governo de Jair Bolsonaro sobre a pandemia, bem como a grave crise político-institucional vivida “com flertes com o golpe”. O jornal ainda criticou a insistência do presidente brasileiro em ignorar a quarentena e o acusou de desviar a atenção da prioridade de combater o coronavírus, no momento em que já se contabilizavam 360.000 contágios e as mais de 22.000 mortes causadas pelo covid-19 (números que hoje já atingem 438.238 casos e 26.754 óbitos e 177.604 pessoas recuperadas).
Para o diplomata, o editorial é mais um exemplo, e típico, do pensamento ideológico retrógrado, arrogante e imperialista, da redação do El País.
“Você e seus editorialistas tentam ensinar ao presidente Bolsonaro, a quem chamam de ‘irresponsável’, como liderar a nação e como governar as pessoas que o elegeu para esta tarefa com 58 milhões de votos. A ideia por trás de suas receitas mágicas é a de que 58 milhões de miseráveis ignorantes estavam errados em apoiar seu líder máximo diante da consciência clara e sábia da escrita do El País. Desta forma, você finge ser o detentor exclusivo das luzes do conhecimento europeu podendo, independentemente do insulto, dar lições de governo ‘aos bons selvagens do Brasil’ e os pobres e ‘atrasados’ ‘Ibero-americanos'”, escreve o embaixador.
O que está em perigo?
O diplomata também relata que El País apresenta dez acusações sérias contra o presidente Jair Bolsonaro, todas desprovidas de bom sentimento, sinuosas, simplistas, genéricas e falsas. E reforça que as acusações são falsamente baseadas no pretexto arrogante de dar a ele e ao povo brasileiro lições sobre (i) como e quais visões científicas adotar ou descartar no combate ao covid-19; sobre como e por que orientar a direção da economia brasileira e sobre como e com quais objetivos governar o Brasil.
Entre outras críticas, Pompeu Andreucci Neto classifica os artigos de El País como histéricos e que excedem os limites da normalidade clínica. E afirma que quem está em perigo não é o Brasil, mas que correm perigo:
– A credibilidade de um jornal que escolhe seus adversários do posicionamento ideológico; escolhe fatos para manter posições preconcebidas e preconceituosas, e descarta qualquer outra realidade que se oponha às suas conclusões anteriores. “Infelizmente, no que diz respeito ao Brasil, se os fatos não concordam com as ideias preconcebidas do El País, então… Que os fatos mudem!”
– Quem está em perigo é o pobre brasileiro, afetado pela perspectiva de uma crise econômica sem precedentes. O que está em perigo, também, são os empregos de milhões de cidadãos brasileiros, que dependem de seus salários para alimentar, educar e criar seus filhos e sustentar suas famílias no Brasil.
– O que está em perigo é a liberdade de expressão e pensamento, que têm como premissa a aceitação do outro. O que está realmente em perigo é a verdade dos fatos, manchada pelos perversos viés ideológicos que punem os países democráticos espalhando uma imagem nefasta e nefanda de uma nação. Nação lutando para crescer, desenvolver-se e com mais de 500 anos de história e quase 220 milhões de pessoas que não precisam de lições de moralidade, muito menos de servilismos aduladores de pretensos editoriais médicos.