NOVA YORK
Responsável no Rio pelas investigações oriundas da Operação Lava Jato, o juiz Marcelo Bretas afirmou nesta sexta-feira (26) que o suicídio do ex-presidente do Peru Alan García foi uma forma de o político fugir de forma covarde de um eventual erro cometido.
O juiz classificou a morte de García como um episódio lamentável e disse que os acusados de crimes de corrupção precisam encarar as acusações e se defender no processo.
"A gente tem feito um trabalho razoável, tanto que outros países da América Latina usam material da Lava Jato para investigar seus ex-presidentes, presidentes, recentemente um deles cometeu suicídio, o que é lamentável. Acho que as pessoas têm que encarar a acusação e se defender, e não fugir de uma forma covarde de eventual erro", afirmou Bretas durante palestra na Câmara de Comércio Brasil-EUA, em Nova York.
O ex-presidente peruano se matou em Lima há dez dias com um tiro na cabeça, depois de receber uma ordem de prisão preventiva emitida pela Justiça do país.
García, de 69 anos, era um dos quatro ex-chefes de Estado do Peru investigados sob acusação de ter recebido suborno da construtora brasileira Odebrecht. Ele negava ter se envolvido em qualquer irregularidade.
"Tem sido no Equador, Peru, Argentina porque, infelizmente, o Brasil é uma referência mas também uma referência ruim. Exportou para alguns 'hermanos' algum tipo de técnica ilícita de ganhar dinheiro mais fácil em grande quantidade, corrupção, né", completou o juiz.
Diante de uma plateia de aproximadamente 40 pessoas, entre empresários e investidores, Bretas usou seu discurso para contrapor instâncias superiores e inferiores da Justiça no Brasil, criticar mais uma vez ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e advogados, e dizer que atos de corrupção podem ser comparados ao genocídio.
Na avaliação do juiz, o agente público que desvia dinheiro que seria destinado a serviços básicos de saúde, educação e transporte, por exemplo, equivale àquele que comete crime de violação de direitos humanos.
Bretas tem histórico de embates públicos com ministros do STF e, nesta sexta, aproveitou seu discurso em Nova York para escalar as críticas e dizer que há componente político na formação do Judiciário no país.
"O fato é que não se pode negar que existe um componente político na formação do Poder Judiciário nas instâncias superiores, o que não existe nas instâncias inferiores. Na Justiça ordinária um juiz não depende de agradar a presidente ou a governador para ser juiz", afirmou Bretas.
"Eu sou o primeiro advogado da família e consegui meu espaço com mérito próprio, daí falar o que falo sem preocupação de agradar a quem quer que seja".
Bretas também centrou fogo em advogados que, de acordo com ele, "assumem muito mais do que a defesa dos interesses corporativos" chegando, inclusive, a cometer crimes.
"Às vezes ele é autor de crime e está ajudando o criminoso a dar uma forma adequada. Isso não é papel de advogado, isso é um participante de um crime. É preciso ter muito cuidado para não sair da função de aconselhamento e assumir posturas como essas com práticas de crime, ainda que seja advogado, porque advogado não tem imunidade e nem escritório de advocacia é inviolável".
Na sua avaliação, ainda há problemas de vaidade entre os magistrados que tomam decisões em processos da Lava Jato, por exemplo, porque "cada um quer fazer do seu jeito para colocar sua marca", mas que a ele, como um juiz de primeira instância, cabe obedecer ordens de cortes superiores.
Um dos principais conflitos de Bretas com o Supremo tem como epicentro o ministro Gilmar Mendes, que já concedeu diversos habeas corpus para soltar presos por ordens do juiz da 7ª Vara Federal do Rio.
Como fez nesta quinta em palestra na Universidade de Columbia, Bretas disse que há muitas críticas ao trabalho da Lava Jato, mas elas vêm sempre de um mesmo grupo.
"O processo é criticado por quem é investigado. A opinião pública apoia as investigações", disse.