Não é exagero afirmar que, apesar do Codace haver datado o final da recessão no primeiro trimestre de 2017, em dezembro de 2018 a economia brasileira ainda estava deprimida, com uma renda per capita 9% abaixo do pico prévio, ocorrido no primeiro trimestre de 2014. Mais grave ainda é que em 2019 o PIB possa, novamente, crescer perto de 1%, apenas pouco acima do crescimento populacional.
A velocidade de uma recuperação cíclica cresce com a intensidade do aumento da demanda agregada, que pode ser proveniente de quatro fontes: as exportações líquidas; o consumo do governo; o consumo das famílias; e os investimentos em capital fixo. Com o crescimento mundial em desaceleração, e com a tendência de queda dos preços internacionais de commodities, há forte redução no crescimento do valor em dólares das exportações mundiais, impedindo que as exportações brasileiras sejam uma força motriz da recuperação.
Também não podemos contar com o aumento do consumo do governo, que foi muito utilizado por Lula na saída da crise de 2008/09. Diante da necessidade de realizar a consolidação fiscal, invertendo o crescimento explosivo da dívida pública, a política fiscal continuará sendo fortemente contracionista, e a isso se soma a contração dos estados.
Será que o aumento do consumo das famílias poderia substituir o governo na função de “consumidor de última instância”? Com a renda per capita 9% abaixo do que era no primeiro trimestre de 2014 e uma taxa de desemprego de 12%, há pouca disposição das famílias em elevar o consumo. Houve, nos últimos anos, uma piora na qualidade do emprego, com forte crescimento do trabalho temporário e informal, que dificulta o acesso ao crédito, e no qual a insegurança quanto à continuidade do fluxo de renda leva ao conservadorismo dos gastos.
Restaria, assim, o papel desempenhado pela formação bruta de capital fixo, e neste campo há algo que o governo pode e deve fazer. São os investimentos em infraestrutura. Como não tem recursos próprios, terá que utilizar o setor privado através de concessões. Para isso são necessários leilões competitivos que selecionem empresas – nacionais e estrangeiras – com competência na alta qualidade e nos baixos custos dos investimentos, e não na transferência aos partidos (e apaniguados) de recursos gerados por práticas corruptas.
O governo atual parece ter entendido este ponto. Com o mercado de capitais privado florescendo depois do freio imposto ao BNDES, os estrangeiros poderão tomar empréstimos em reais sem o risco do “descasamento” de moedas. Finalmente, todas as indicações são de que o governo busca uma estrutura de regulação que reduza o risco regulatório, cuja compensação para o consequente “prêmio de risco” vinha dos subsídios através do BNDES, com reflexos fiscais desastrosos. A esperança é de que a partir de 2020 isto impulsione a recuperação cíclica. Porém, mesmo que o governo se apresse, não é possível ver quaisquer resultados ainda em 2019.
O lado negativo está na indústria. Seu nível de capacidade ociosa é provavelmente o mais elevado da história, o que impede que enquanto isto perdurar industriais conscientes dos riscos pensem em elevar a capacidade produtiva. Além disso, o “espírito animal” dos empresários está aprisionado pelo risco de um fracasso – ainda que parcial – na aprovação da reforma da Previdência, que é condição fundamental para o sucesso na consolidação fiscal. É muito diferente investir na compra de ações de uma empresa ou na aquisição de uma máquina. Em caso de erro, o comprador das ações poderá desfazer-se de sua posição no mercado secundário, mas não há mercado secundário líquido para máquinas e equipamentos. Diante destas restrições nem mesmo uma taxa real de juros persistentemente baixa leva ao aumento dos investimentos.
Cabe ao governo compreender que as forças que podem acelerar a recuperação cíclica estão ao seu alcance. Poderá apressar as decisões sobre os leilões de infraestrutura, que não precisam de aprovação do Congresso, e não há limites para um programa ambicioso. Já no caso da consolidação fiscal, terá que entender que contrariamente à corrupção, que deve ser condenada, uma coalizão política é arma legítima no exercício da democracia. De um lado, ela implica em divisão do poder, mas de outro reduz o risco da crise fiscal e cria a condição para o aumento dos investimentos privados, não havendo razões para sua rejeição.
O Estado de São Paulo