Marlene Bergamo - 29.set.2017/Folhapress | |
O prefeito João Doria em entrevista à Folha em seu gabinete |
IGOR GIELOW - Folha de São Paulo
Candidato a presidenciável tucano em 2018, o prefeito paulistano, João Doria, repete o mantra ao ser perguntado sobre o tema: "O ano que vem está longe".
Motivos não lhe faltam. Vem sendo chamado de traidor por aliados do seu padrinho político, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que busca o Palácio do Planalto em 2018.
Nesta entrevista à Folha, defende que o PSDB, se for ter prévias para decidir o candidato tucano à Presidência da República, que as faça entre todos seu 1,2 milhão de filiados —alckmistas sugerem algo restrito, teoricamente mais sob controle do governador, embora no fundo nenhum dos dois lados acredite que o embate irá ocorrer.
Isso estabelecido, Doria fala com a naturalidade de quem está testando discursos. Definiu o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o candidato a ser derrotado, esteja o petista impedido ou não de concorrer por provável condenação em segunda instância por corrupção.
Com isso, valoriza o ativo que burilou ao longo do ano, o discurso antipetista.
Mas Doria já elabora ideias para "o candidato em 2018", como diz: privatização da Petrobras e um programa amplo de desestatização para buscar investimento —na sua equação, mola para gerar emprego e renda. Defende reformas e apoio a medidas do governo Temer, apesar do desgaste.
A conversa ocorreu em uma sala de reuniões da prefeitura. Além de uma tela do polêmico Romero Britto na parede, as estantes do local envergam quadros com publicações sobre o prefeito, como exemplar da Folha no dia de sua eleição, com destaque a uma revista que o elegeu como o "anti-Lula".
Folha - Nas últimas semanas, desenhou-se um quadro mais claro de sua postulação à Presidência. O sr. é candidato?
João Doria - Eu sou candidato a continuar sendo prefeito da cidade de São Paulo. O ano que vem está longe. Agora é precipitado. O momento para discutir isso é janeiro.
O próprio PSDB vai adensar o debate sobre a candidatura, o que deverá ocorrer entre janeiro e março.
Se o sr. deixar a prefeitura, não teme ficar com a pecha de traidor de seus eleitores? E o governo do Estado, o sr. considera a disputa?
Não, isso é um tema que não está colocado. Sobre o Estado, nem creio que o PSDB terá uma decisão em novembro, quando há convenção, sobre isso. A meu ver seria precipitado.
O sr. coloca a posição nas pesquisas como o fator preponderante para a escolha do candidato, enquanto apoiadores de Alckmin falam em prévias. Qual sua posição agora?
Defendo que a pesquisa tem de ser respeitada, uma ou duas pesquisas. É um elemento de tecnologia e informação confiável. Soma-se a isso a ideia de prévias, mas prévias amplas, não restritas.
Só se justificam prévias para todos os filiados nacionalmente do PSDB. Fora disso, não dá para chamar de prévia. Se for para ter, que seja com o 1,2 milhão de filiados, aí as prévias se legitimam pela sua amplitude e sua dimensão.
O Datafolha o coloca em condição de igualdade com Alckmin na disputa, com Lula na liderança [8% cada]. Como o sr. vê o resultado?
Para um não candidato como eu, é um ótimo resultado.
Como o sr. vê os apoios que vêm surgindo, como o do prefeito ACM Neto (DEM-Salvador)? Mudaria de partido?
Eu respeito muito as opiniões, especialmente as do ACM Neto, cuja gestão é brilhante. Fico honrado e feliz, mas acho que a hora para discutir é ano que vem. Não há razão nesse momento de pensar em qualquer desvinculação do PSDB.
O sr. tem falado com Alckmin?
Acabei de falar, falo quase todo dia. Aproveito para ressaltar: as relações são boas, amistosas e constantes.
O PSDB novamente debate apoio ao governo. Isso ocorre com o fato do afastamento de Aécio Neves (PSDB-MG) do mandato pelo Supremo. Como o sr. avalia o caso?
Começo pela segunda parte. O PSDB é parte do governo Temer, tem quatro ministros no governo, e Aécio Neves não é um deles. Minha defesa não é do governo, é do Brasil, e a economia está melhorando.
Em relação ao senador, não me cabe evidentemente questionar posições do Judiciário, mas talvez tenha havido uma dose um pouco excessiva na medida adotada de punir sem dar a ele a continuidade de seu direito de defesa.
Essa associação com o impopular governo Temer não será pesada demais para o PSDB no ano que vem?
Talvez seja. Mas é preciso compreender que a dimensão de um partido com a história do PSDB não pode estar apenas alicerçada nas suas legítimas ambições eleitorais, em interesses pessoais. Mesmo que isso gere um desgaste.
A campanha de 2018, e mesmo seu discurso antipetista, vinham sendo pautados pela presença de Lula e de um anti-Lula. Se o ex-presidente não estiver no páreo, como será a candidatura de seu campo?
Lula estará no páreo mesmo se não for candidato. Se ele não for, talvez até com mais força, porque vai se apresentar como vítima de todos. Haverá maior força e vigor de Lula defendendo, se não for sua candidatura, a do PT. É ilusão achar que, se Lula estiver inelegível, ele estará inabilitado para fazer campanha.
Sem Lula, o campo da centro-direita tende a se pulverizar. Isso é positivo ou negativo?
É preciso ver como se comporta essa área de centro, entre centro-esquerda, centro-direita. Quem terá o discurso inovador, quem terá o discurso motivador, o discurso aglutinador. Os outros discursos você já conhece. É a esquerda e a extrema-esquerda com Lula ou preposto, e a direita, extrema-direita, com o [deputado federal] Jair Bolsonaro.
Qual o tom para essa candidatura? Há uma apatia em relação à política.
E há. Uma parte sensível do eleitorado é refratária aos políticos de forma geral, até com certa dose de injustiça, pois qualifica todos dentro de um patamar de negatividade.
É preciso um discurso motivador para que as pessoas voltem a ter esperança de que é possível mudar o Brasil pelo voto. Não será pela nulidade, pela negligência ao voto que se vai transformar o Brasil.
Como apresentar uma candidatura como o "novo" dentro de um partido tradicional? Em 2016, o PSDB fez isso com o sr. em São Paulo, mas não soaria contraditório nacionalmente?
Não creio. O eleitorado, é claro, avalia o partido, não o dissocia do candidato, mas a avaliação é muito pessoal.
O sr. falou recentemente em privatização da Petrobras. Poderia elaborar?
Defendo a privatização gradual de toda a Petrobras. Um processo bem planejado para que sua valoração não seja diminuída e que ela tenha seu valor de mercado preservado. É possível fazer um plano de demissão voluntária que não prejudique quem dedicou 20, 30 anos de trabalho à empresa. A Agência Nacional do Petróleo seria reguladora do processo, para que não se perca o controle sobre as políticas públicas de combustível. A privatização dará maior competitividade. E com isso a Petrobras fica protegida do assalto, das indicações políticas.
O sr. e o governo lançaram programas de privatização. Há receio de que o governo acabará usando os recursos para custeio. O sr. vê paralelos entre os dois programas?
Zero para custeio. Não creio que essa seja a intenção, mas, se for, seria prudente rever. Recurso deve ser colocado em um fundo para aplicação no social. É o que estamos fazendo em São Paulo, irá tudo para saúde, educação, mobilidade e assistência social. No plano federal, deveria acrescentar a infraestrutura.
O PSDB deve manter a agenda de defesa de reformas na campanha? Como é improvável aprovar algo na Previdência, o próximo presidente terá de fazer o trabalho sujo.
Não diria o trabalho sujo, mas um trabalho limpo. Ele pode ser impopular, mas é necessário. Preservar o câmbio flutuante, a política fiscal e não permitir a ruptura de gastar mais do que a Constituição permite. Agilizar privatizações, concessões, parcerias público-privado.
O modelo de gasto social está desatualizado?
Está, porque faltaram recursos. Esse é um legado do PT, como o desemprego, que é um flagelo social. Modelo de transferência de renda não deve ser interrompido, mas é preciso um programa de geração de renda e emprego, de empreendedorismo. Como? Trazendo investidores. O mundo está próspero, e tem dinheiro em abundância. O que falta é confiança.
Há um buraco social, explicitado nas cenas da Rocinha, mas que está na esquina aqui ao lado. Em 2018, o que falará mais alto ao eleitor?
Economia eficiente e governo transparente. É o binômio.
O sr. recebe várias críticas sobre suas relações com o setor privado. Como o sr. vê isso do ponto de vista de formação de imagem pública?
Eu vejo de forma positiva. Só tem investimento privado governo que tem confiança privada, e isso temos.
Há um apoio do MBL (Movimento Brasil Livre) à sua figura. O movimento vem fazendo críticas pessoais a jornalistas, buscando boicotar exposições de arte. Como o sr. vê isso?
O MBL é legitimado pelas ruas e por sua história. Tem acertado muito mais do que errado. Não quero dizer que concordo com todas as posições do MBL, mas reconheço sua importância.
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RAIO-X
NASCIMENTO
16 de dezembro de 1957, em São Paulo
16 de dezembro de 1957, em São Paulo
CARREIRA
Empresário, jornalista, apresentador de TV e publicitário. Fundou em 1992 o Grupo Doria, composto por braços como o Lide
Empresário, jornalista, apresentador de TV e publicitário. Fundou em 1992 o Grupo Doria, composto por braços como o Lide
NA POLÍTICA
Filiado ao PSDB desde 2001, foi eleito no primeiro turno prefeito de São Paulo, em 2016
Filiado ao PSDB desde 2001, foi eleito no primeiro turno prefeito de São Paulo, em 2016