Intervenção na previdência dos funcionários
dos Correios chama a atenção para
desmandos ocorridos em outras entidades
semelhantes, uma norma no setor público
Ajulgar pelo noticiário sobre rombos abertos no Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios — basicamente abertos pela corrupção, segundo as evidências —, a intervenção na entidade não surpreende. Faltam R$ 7 bilhões para equilibrar as finanças do fundo, cujas contas foram rejeitadas. É muito dinheiro.
Os auditores independentes do Postalis, Baker Tilly Brasil, já não haviam aprovado o balanço de 2016. Em dezembro deste ano, os gestores usaram da criatividade e criaram quatro fundos de investimentos para receber em suas carteiras papéis podres, já contabilizados como prejuízo no próprio Postalis.
Num passe de mágica, esses títulos passaram a valer R$ 1 bilhão, e isso diminuiu de forma fraudulenta, artificial, os déficits dos planos de aposentadoria. Pela terceira vez, o conselho fiscal recomendou a rejeição das contas, o que foi aceito e levou à intervenção no fundo pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc).
Apenas uma operação dá ideia da má-fé na administração do Postalis: soube-se em 2014 que o fundo havia comprado títulos das dívidas da Argentina e Venezuela, dois dos maiores riscos do mercado financeiro global.
O Postalis não é caso isolado. O setor de fundos de previdência complementar acumula um déficit de R$ 77,6 bilhões, dos quais, segundo a associação das entidades do ramo (Abrapp), 88% são de responsabilidade de dez grandes fundos, entre eles o Previ (Banco do Brasil), o Petros (Petrobras), o Funcef (Caixa Econômica) e o próprio Postalis.
Não por coincidência, todos de empresas estatais. É porque a falta de profissionalismo e a desonestidade que permitem a ingerência política dos poderosos de turno nas companhias públicas fazem o mesmo com os fundos de previdência complementar de seus funcionários.
Há inúmeros casos comprovados de prejuízos causados em fundos de estatais por ingerência política. Os autos da Lava-Jato estão repletos deles. O mais emblemático é a Sete Brasil, empresa criada a partir da Petrobras, para produzir sondas a serem usadas no pré-sal, um negócio bilionário. Segundo denúncia do ex-ministro Antonio Palocci, peça-chave no PT, Lula determinou que este programa fosse usado para gerar propinas a serem usadas na campanha presidencial de Dilma Rousseff — entre outros fins, soube-se depois.
Fundos de estatais tiveram de investir no projeto criminoso. E assim, o Funcef e o Previ estão entre os que levaram um calote de R$ 8 bilhões. Os funcionários da Caixa e do BB, além do Tesouro, arcarão com o prejuízo. O que não falta no mundo das estatais.
Informou ontem O GLOBO que um grupo de empresas públicas entrou em estado de coma financeiro: Eletronuclear, CBTU, Infraero, entre elas. Sabe-se das ingerências dos governantes de turno nesses setores.
Tudo compõe um quadro já conhecido, que reforça o diagnóstico de que o Estado não pode atuar como empresário. Porque é por estatais e subsidiárias que negócios obscuros são feitos — mesmo que as empresas tenham acionistas privados —, e se instala a corrupção. Não escapam sequer fundos de pensão.