| Albert Gea/Reuters | |
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| Líder catalão Carles Puigdemont é aplaudido após discursar ao Parlamento regional nesta terça (10) |
DIOGO BERCITO - Folha de São Paulo
O presidente catalão, Carles Puigdemont, afirmou nesta terça-feira (10) diante do Parlamento regional ter recebido um mandato para declarar a independência da Catalunha. Mas, em seguida, frustrando separatistas, pediu que legisladores suspendam a proclamação para que haja um diálogo com Madri.
Essa parece ter sido a fórmula encontrada por seu gabinete para declarar a independência, como vinha prometendo para a população, e ao mesmo tempo evitar o confronto imediato com o governo central em Madri.
A manobra, no entanto, parece ter apenas adiado o caos institucional na Espanha. Os próximos passos da separação não estão claros.
"Não somos uns delinquentes. Não somos uns loucos. Não somos uns golpistas. Somos gente normal que esteve disposta a todo o diálogo necessário", Puigdemont disse ao Parlamento catalão por volta das 19h40 locais (14h40 em Brasília).
Os próprios legisladores ficaram confusos após a fala de Puigdemont. Miquel Iceta, do Partido Socialista Catalão, afirmou: "Você não pode suspender um acordo que não foi travado".
Os corredores da Casa estavam abarrotados com centenas de repórteres, que improvisavam suas redações em pequenos gabinetes para acompanhar as declarações.
O país e a comunidade internacional aguardam agora, ansiosos, a reação do Estado espanhol. O premiê conservador, Mariano Rajoy, pode utilizar o Artigo 155 para suspender a autonomia parcial já existente na Catalunha e convocar eleições nessa região. Ele pode também pedir a detenção de Puigdemont.
Segundo informações do jornal espanhol "El País", o governo de Rajoy considera que a declaração, mesmo em suspenso, contraria a lei e exige uma resposta oficial.
Não existe nenhum cenário aparente em que esse conflito se dissipe com facilidade. Caso não reaja, Rajoy arrisca fortalecer o movimento separatista. Se ele utilizar a força, alimentará também os separatistas –que terão a prova do argumento de que são reprimidos por Madri.
Mesmo acionando o Artigo 155, Rajoy não tem garantias de estabilidade. Partidos separatistas catalães já anunciaram seu boicote a eventuais eleições antecipadas.
Antes de sua fala, uma hora mais tarde do que o previsto devido a reuniões de emergência, o presidente catalão havia se sentado na sala parlamentar mordiscando as pernas dos óculos. Um sino convocava legisladores.
Do lado de fora, ativistas se aglomeravam em torno do edifício, localizado no histórico parque da Cidadela, para apoiar o governo regional. Agricultores estacionaram os tratores nas imediações.
PLEBISCITO
A proclamação foi feita –e em seguida suspensa– no Parlamento regional após semanas de tensão política.
Em 1º de outubro, catalães haviam votaram em um plebiscito separatistaconsiderado ilegal pelo governo central. Essa consulta teve 90% de votos no "sim", mas apenas 43% de participação.
A segurança do Parlamento foi feita exclusivamente pelos Mossos d'Esquadra, a polícia catalã –a mesma força acusada por Madri de não cumprir com seu dever de impedir o plebiscito. Quando a polícia nacional espanhola tentou impedir o plebiscito, 900 pessoas foram feridas.
Puigdemont citou, em seu discurso, o plebiscito separatista escocês, com o aval do governo britânico. "Por que isso não pode ser feito na Espanha? A resposta foi uma negativa absoluta, uma perseguição policial e judicial."
A Catalunha já tem uma série de liberdades, como seu próprio Parlamento e polícia. Mas uma sucessão de vitórias políticas deu força a partidos separatistas, que aceleraram nestes anos seu projeto de independência. Há vários argumentos, incluindo cultura e economia.
Catalães falam uma língua própria, aparentada ao francês, e têm uma história particular dentro da unidade territorial espanhola. No campo econômico, a separação é justificada pela pujança catalã. Essa região corresponde a 20% do PIB espanhol, que é hoje de US$ 1,2 trilhão, e separatistas afirmam que uma Catalunha independente poderia crescer ainda mais.
ILEGAL
Madri considera que o plebiscito foi ilegal porque contraria a Constituição espanhola, à qual esse tipo de consulta teria que ser convocada pelo governo central e realizada em todo o país.
O Estado espanhol é apoiado por importantes forças externas, como a União Europeia. O bloco econômico concorda com o argumento de que o plebiscito e a separação são inconstitucionais. Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, pediu na terça-feira que Puigdemont não tomasse "uma ação que torne o diálogo impossível".
Um de seus aliados mais poderosos é a França, que na segunda-feira (9) deixou claro que não aceitaria uma eventual proclamação de independência da Catalunha. Em entrevista ao canal CNews, a ministra francesa da Relações Exteriores, Nathalie Loiseau, disse que uma a separação da Catalunha "não seria reconhecida". A primeira consequência automática seria sua saída da União Europeia", afirmou.
A negativa francesa sinaliza que, caso o governo catalão siga adiante e se declare independente, será isolado e pressionado por influentes atores externos. A própria UE já indicou que não reconheceria a separação catalã.
A falta de apoio externo é apenas um dos percalços ao sonho separatista deste governo catalão. Outro revés é a contínua debandada de bancos e empresas dessa região durante os últimos dias.
O banco catalão Sabadell, por exemplo, transferiu sua sede a Alicante. O CaixaBank, terceiro maior banco espanhol, se mudou a Valência. Gigantes como a Gas Natural também deixaram a Catalunha. A mensagem aos investidores é grave, e afeta a disposição popular pela independência dessa região.
As transferências de sede significam que essas empresas estarão sujeitas à legislação e aos impostos de seus novos município. Não quer dizer, no entanto, que as estruturas físicas ou os empregados vão ser deslocados.























