Processo capaz de impedir o ex-presidente de voltar ao Planalto em 2026 tem inconsistências e destoa de entendimento anterior do TSE
Um processo com argumentos fracos que fere a liberdade de expressão. É o que afirma o jurista Dircêo Torrecillas Ramos, membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas, sobre a ação movida pelo PDT, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível.
O TSE vai retomar nesta terça-feira, 27, o julgamento da ação. A sessão de hoje prevê os votos dos ministros. Tudo indica que Bolsonaro ficará fora das disputas eleitorais por oito anos, sobretudo em virtude da composição da Corte. Há algumas semanas, Lula emplacou dois desafetos de Bolsonaro no TSE, também aliados do presidente do tribunal, Alexandre de Moraes.
A seguir, os principais trechos da entrevista com o jurista.
O processo movido pelo PDT contra o ex-presidente Jair Bolsonaro tem argumentos suficientes para fundamentá-lo?
A ação para tornar Bolsonaro inelegível não tem substância. As acusações do partido ferem a liberdade de expressão. Como presidente da República, Jair Bolsonaro tinha ainda o direito de se reunir com representantes de outros países para falar o que quisesse. No que diz respeito ao encontro com embaixadores, ele convidou o então presidente do TSE, ministro Luiz Edson Fachin, que não quis comparecer. Nada havia a esconder, portanto. Dessa forma, a afirmação segundo a qual Bolsonaro cometeu abuso de poder não se sustenta.
O corregedor-geral do TSE, Benedito Gonçalves, acrescentou ao processo a chamada “minuta do golpe” encontrada na residência de Anderson Torres, ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal. Naquele momento, contudo, a ação do PDT já havia sido acolhida. O ministro poderia fazer isso?
Não deveria, pois a ação já estava em andamento. O adequado seria abrir um novo procedimento, por se tratar de conteúdo diferente daquele apresentado pela sigla. A respeito do conteúdo da “minuta”, viu-se que não tinha nada de mais, conforme já demonstrou o professor Ives Gandra Martins. O jurista não viu validade jurídica no documento. Há uma série de conceitos errados nessa história.
O PDT acusa Bolsonaro de abuso, por ter usado canais oficiais do governo, como a TV Brasil e redes sociais, para transmitir o evento com embaixadores. Essa afirmação se sustenta?
O uso desses canais por presidentes é comum. O inciso 7º, do artigo 84 da Constituição, diz ser competência do presidente manter relações com Estados estrangeiros e fazer acreditar os seus representantes. Bolsonaro estava exercendo um direito. Em outra ocasião, o ministro Fachin se reuniu com representantes estrangeiros. Não houve abusos, por parte de Bolsonaro.
Tudo indica que o TSE vai tornar o ex-presidente inelegível. Quais as semelhanças e as diferenças entre o julgamento de Bolsonaro e o da chapa Dilma-Temer?
No caso da chapa Dilma-Temer, estava claro que havia evidências e provas suficientes para cassá-los, mas o TSE os absolveu. Houve, inclusive, o julgamento único para os dois, em vez de fatiamento, como deveria ter ocorrido, por causa da prestação de contas de ambos, feita individualmente, em que apenas a de Dilma apresentava irregularidades. A Corte preferiu, contudo, julgá-los juntos. Por motivos de coerência e pelo princípio de igualdade entre os presidentes, o TSE deveria manter o entendimento anterior e absolver Bolsonaro, cujos argumentos das acusações não têm substância.
O TSE, provavelmente, vai tornar Bolsonaro inelegível. O ex-presidente pode reverter essa situação?
A Constituição determina que as decisões do TSE são irrecorríveis. O parágrafo 3 do artigo 121, porém, diz que, se a decisão for contrária à Carta Magna, cabe recurso. As mais recentes decisões do Judiciário não parecem ser imparciais, mas, sim, políticas. Pelo fato de tratamento distinto a Bolsonaro, que fere a Constituição, ele poderia tentar reverter a situação.
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Cristyan Costa, Revista Oeste