sábado, 2 de janeiro de 2021

Meio de pagamento eletrônico vive revolução global, diz Odilon Almeida, da ACI Worldwide

 O meio de pagamento eletrônico vive revolução global, e o Pix deve dominar grande parte das transações no futuro. A afirmação é de Odilon Almeida, o brasileiro que preside a ACI Worldwide, empresa que atua na área de pagamento eletrônico em tempo real em 95 países.

Com sede nos Estados Unidos e ações listadas na Nasdaq, a ACI atende cerca de 6 mil organizações no mundo, incluindo 19 dos maiores bancos.

Odilon afirmou que parte dessa evolução também passa pela chegada do open banking no país, no ano que vem.

“Todos os países que entraram com o sistema financeiro aberto viram um aumento significativo no mercado de meios de pagamentos eletrônicos. A abertura da plataforma é, também, uma revolução. Mil inovam mais do que três ou quatro participantes juntos”, disse.

Presidente da ACI, Odilon Almeida, no escritório da empresa, em São Paulo
Presidente da ACI, Odilon Almeida - Eduardo Anizelli/Folhapress

O movimento também deve impulsionar o uso do Pix, novo sistema de pagamentos instantâneos do BC (Banco Central), pelos consumidores, afirmou o executivo.

“Com o tempo, o Pix deve dominar uma grande parte das transações no país”, disse. “Mas o aumento dessas transações, não deve fazer com que o dinheiro ou o cartão acabem. Existem diversas ocasiões em que o papel moeda é melhor do que o pagamento instantâneo, como em uma gorjeta, e isso vai continuar acontecendo. O mundo sempre será um balanço desses três meios.”

A pandemia do vírus chinês colocou em evidência os meios eletrônicos de pagamento ao longo deste ano. O que esse crescimento sinaliza para o setor?
Esse movimento não aconteceu só no Brasil, mas no mundo. E isso também se reflete nos números do mercado.

Quando as vendas nas lojas físicas caíram tremendamente por causa da pandemia, vimos um crescimento cavalar das compras por meios digitais.

Isso já era uma tendência, mas mudou de nível depois da pandemia. E, agora, é um caminho sem volta.

Isso significa que as vendas digitais devem ganhar mais espaço daqui pra frente?
É claro que a experiência de a pessoa ir à loja para fazer compras vai voltar. O ser humano precisa sair e interagir com outros. Mas, por outro lado, a pessoa que não estava acostumada a comprar digitalmente começou a fazê-lo e viu como é fácil.

O que vamos ver é uma mudança de estágio dos meios digitais de pagamento. Quem não usava e experimentou começará a aderir, e quem pagava digitalmente apenas raramente, vai aumentar a frequência.

Acredito que veremos uma juste real do mercado. Mais espaço de lojas e escritórios disponíveis do que procura por esses meios, porque o mundo se adaptou.

Nós teremos um mundo muito mais remoto daqui pra frente.

O que podemos esperar sobre a evolução do Pix no Brasil?
O Pix começou e, como acontece no mundo inteiro, ainda tem alguns pontos a serem melhorados. Isso é normal. Você lança com compliance, segurança e regulamentação, mas muita coisa voltada para a experiência do consumidor ainda deve melhorar.

A única coisa que não pode acontecer com o Pix é ele parar de evoluir. Mas os bancos, regulamentadores e agentes financeiros já entenderam que esse sistema precisa de progresso constante.

Se essa continuar a ser a forma de pensar do mercado, eu tenho certeza que o Pix vai dominar grande parte das transações no futuro.

O open banking também vai fazer parte dessa evolução do mercado de meios eletrônicos de pagamento?
O open banking tem um papel significativo em todo esse processo. Todos os países que entraram com o sistema financeiro aberto viram um crescimento significativo no mercado de meios de pagamentos eletrônicos.

abertura da plataforma é, também, uma revolução. Mil inovam mais do que três ou quatro participantes juntos.

Além disso, o sistema traz força para a inclusão financeira no país. Todo mundo ganha com isso: o povo, o governo, os bancos, as fintechs, todo mundo.

Quais são os próximos passos neste curto ou médio prazo?
A grande revolução do mundo são os pagamentos imediatos, que acontecem sem passar pelo network do cartão de crédito e débito. Isso já está crescendo brutalmente em todos os lugares.

E assim como os cartões atacaram brutalmente as transações com dinheiro, veremos uma grande migração de volumes de transações para os pagamentos imediatos.

Isso acontece tanto pela maior facilidade do sistema como pelo próprio custo, uma vez que o cartão cobra até 3% de toda a transação no varejo – preço bem mais barato nos pagamentos instantâneos.

Essa é a próxima revolução. Outra coisa que pode acontecer depois disso é o aparecimento de hubs mundiais, que promoverão os pagamentos transfronteiriço. Você, aqui no Brasil, poderá comprar algo nos Estados Unidos, na Europa, na Argentina, onde for.

Claro que ainda existem questões voltadas para a importação e câmbio que precisariam ser solucionados, mas essa é a próxima revolução mundial em pagamentos.

Podemos chegar ao ponto de dizer que o cartão ou o dinheiro vão acabar?
Eles não vão acabar. O dinheiro é um produto tremendo. Você entra em uma loja e entrega um papel que não vale nada para o vendedor, que te devolve, como troco, outro papel que não vale nada. E, ainda assim, a matemática fecha e você consegue comprar.

Existem ocasiões de uso nas quais um produto é melhor do que os outros dois. Isso vai continuar acontecendo. É mais fácil dar gorjeta em dinheiro do que pedir o telefone do garçom, por exemplo.

A mesma coisa com o cartão, que oferece o crédito, por exemplo, para que o consumidor compre coisas com o dinheiro que ainda não tem.

É sempre um equilíbrio. O mundo sempre será um balanço dessas três opções de pagamento.

O que podemos esperar do futuro em mais longo prazo, nesse segmento?
Tem alguns países no mundo que estão avançados tecnologicamente quando você pensa em meios de pagamentos. O Brasil é um desses países.

E isso reflete o nosso histórico hiper inflacionário, quando o sistema financeiro investiu brutalmente em tecnologias em busca de proteção. Isso fez com que avançássemos muito rápido.

O Brasil está completamente em mutação sobre o tema, mas, ainda assim, é difícil dizer como vai ser o futuro. O que podemos, é dizer que existem dois ou três pontos importantes nos quais as companhias precisam investir para estarem preparadas para isso.

A conversa hoje é que tudo é um jogo de xadrez. É preciso posicionar sua empresa para um futuro que, com certeza, será diferente.

E quais são esses pontos?
Existem, por exemplo, dois tipos de serviços que as companhias podem comprar. A primeira é terceirizar a gestão do seu software para um processador – o que não é muito flexível porque, neste caso, quem escolhe o meio de pagamento, o emissor ou a adquirente não é a empresa, mas este terceirizado.

Para agentes financeiros isso não é aconselhado. A melhor solução é quando o banco ou instituição contrata o software para gestão própria. Assim, ele consegue dar melhores opções para seu cliente e controlar melhor o que diferencia seu produto.

Como fica essa discussão em termos de segurança?
Do lado do consumidor, ele precisa ser ensinado de que existe um mercado inteiro de fraude que cresce e se prepara melhor a cada dia. É uma guerra e o consumidor precisa assumir as rédeas para analisar qual é a melhor instituição para ele e se ela é realmente segura.

Ele precisa estar ciente desse movimento porque, com a evolução tecnológica do mercado, as fraudes são parte do dia a dia e não vão diminuir, só aumentar.

É como pegar o carro e parar em um sinal vermelho às 02h da manhã. Você não pode relaxar, é preciso entender que existe bandidagem e sempre estar com todos os alertas ligados.

Já para os agentes financeiros, a nuvem é uma ótima saída. A nuvem pública tem um investimento em cybersecurity muito maior do que o datacenter do maior banco do mundo. Os grandes bancos do Brasil estariam ainda mais seguros em uma nuvem pública do que estão em seu próprio datacenter.

Os bancos digitais, por exemplo, já trazem isso dentro do pacote. É por esse caminho que o mercado deve evoluir.

Isabela Bolzani, Folha de São Paulo