A alta nas exportações de móveis e madeira, motivada pelo aquecimento desse mercado na pandemia, fez o porto de Navegantes bater recorde de cargas em 2020.
Entre janeiro e novembro, o porto aumentou em 16,7% o volume de cargas transportadas, na comparação com o mesmo período do ano passado. O crescimento veio mesmo com a queda nas importações, que tiveram recuo acentuado no primeiro semestre, principalmente no auge da pandemia de Covid-19.
A alta nas exportações foi motivada pela disparada das vendas de móveis na pandemia, diz Arnaldo Huebl, vice-presidente regional da Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina) e empresário do setor.
“Acredito que é porque o pessoal ficou dentro de casa e resolveu ter uma vida melhor, arrumar a casa, comprar móveis. Quando perceberam, as coisas deslancharam e as empresas não tinham nem material pra atender a demanda do mercado”, afirma.
A movimentação foi tão expressiva que superou a de carnes congeladas, carro-chefe da região —Navegantes é responsável por 55% de toda exportação de suínos e 30% do frango do país. Entre 2019 e 2020, a participação do item nas exportações do porto caiu de 30,9% para 29%. Enquanto isso, a participação de madeira e seus derivados (como móveis) passou de 45,7% para 47,4% no mesmo período.
Segundo a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), as obras de madeira —categoria que engloba móveis, material de construção, vigas, cabides e tábuas em geral— lideram as exportações, superando as de madeira bruta em quase dez vezes (1,2 milhão de toneladas contra 131 mil toneladas, respectivamente).
Apesar de ficar em segundo lugar, a madeira bruta apresentou a maior alta nas exportações em 2020 na comparação com 2019 —uma expansão de 66,9%.
No caso das obras de madeira, o aumento foi de 12,21% no mesmo período. Enquanto isso, as exportações de carne de aves caíram 9,9%.
De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a indústria catarinense de produtos de madeira viveu um boom na pandemia, com alta de 45% entre outubro, depois de uma queda de 21,5% no primeiro trimestre.
Para Huebl, da Fiesc, o crescimento só não foi maior pela falta de mão de obra e matéria-prima —algumas empresas não conseguiram ser abastecidas na mesma velocidade que os pedidos chegavam.
Segundo ele, 50% dos móveis exportados são da região serrana de Santa Catarina, proveniente de cidades como Jaraguá, Rio Negrinho e São Bento do Sul. Os principais tipos exportados são madeira serrada, painéis, molduras, móveis, toras de pinus, eucalipto e pellets.
Cerca de 60% dessa produção é exportada para os EUA —os americanos são os principais compradores do produto, movimento que se intensificou em 2020. Em setembro, por exemplo, eles adquiriram 55% a mais de madeira do que no mesmo mês do ano anterior.
“O câmbio ajudou muito, não tenho dúvidas. O câmbio fez os clientes voltarem em grande número, pois ficou favorável. Poderíamos fazer um preço competitivo. Deve dar uma pequena desaquecida em 2021, pois a matéria-prima subiu demais e o câmbio se ajusta, diminui a nossa competitividade, mas esperamos que primeiro semestre do ano continue assim”, apontou.
Depois dos Estados Unidos, os principais destinos das exportações de madeira de Santa Catarina são México, China, Vietnã e Arábia Saudita.
Impulsionado pela explosão madeireira, o PIB de Navegantes também cresceu: foi de R$ 3.258.291 em 2016 para R$ 3.820.584 em 2018, data do último levantamento municipal do IBGE. Em 2007, antes de Portonave, o PIB era de R$ 726.858.
Osmari de Castilho Ribas, diretor-superintendente administrativo de Portonave, creditou a expansão da madeira à maior disponibilidade de guias de navegação no porto, com novas linhas que ligam Estados Unidos, México, Europa e China.
“Fomos buscar esse mercado, para atrair as linhas e armadores. Os madeireiros e toda cadeia produtiva têm bastante opção conosco e a logística justifica também, estão relativamente próximos, estamos sendo efetivos e temos mostrado esse crescimento”, afirmou.
Com o aumento das cargas, também foram adquiridas 25 novas carretas reforçadas para a movimentação de contêineres, além de duas empilhadeiras de bateria de lítio. No total, foram investidos R$ 16,6 mihões na aquisição de equipamentos, e há mais investimentos aguardados em infraestrutura para o ano que vem.
Segundo a Antaq, Portonave é o terminal com maior produtividade do país, superando os maiores terminais de Santos. São 101 unidades de contêineres por hora de operação, acima dos 92 da Santos Brasil e 76 da BTP, que ocupam o segundo e terceiro lugar no ranking.
O fluxo de caminhões também foi impactado pelo movimento. Em dezembro, o gate de Navegantes bateu um recorde, com quatro dias acima de 2.000 caminhões. No dia 10, atingiu 2.349.
A média diária de caminhões no terminal portúario é de 1.600. Em novembro de 2020, foram 39.707 veículos no complexo —no ano anterior, haviam sido 26.836 naquele mês.
Segundo Ribas, a movimentação recorde pode ser explicada pela pandemia. “Aqui não temos ferrovia, e esse movimento é absorvido pelos caminhões”, diz.
A ausência de acesso por trens é um dos obstáculos enfrentados pelo complexo marítimo. Egídio Martorano, executivo da Câmara e do Conselho de Infraestrutura de Transporte e Logística da Fiesc, afirma que o terminal enfrenta um problema principalmente no acesso do alimento animal, como milho e soja.
“Estamos com estradas em condições terríveis. Temos um dos maiores complexos portuários da América sem acesso ferroviário. Precisamos de investimento logístico”, afirma.
“Essa é a preocupação para manter a competitividade e participação no mercado externo.”
Enquanto as exportações aumentaram, as importações sofreram com a diminuição do fluxo de comércio durante a pandemia, segundo Caio Morel, representante da Abratec (Associação Brasileira de Terminais de Contêineres).
“Os produtos importados alimentam as indústrias e consumo das famílias e esses dois setores sofreram com a pandemia. O PIB decresceu, falando-se de acumulado [de queda] de 5% a 6% no ano e isso reflete no poder de compra no país e consequentemente nas importações”, diz.
Os principais produtos importados em Navegantes são químicos (25,31% de participação) e plásticos (19,97%), ambos utilizados especialmente para abastecer a indústria nacional. Nesse fluxo, o principal parceiro comercial é a China.
Também em 2020, o terminal se adaptou para receber grandes navios. Em 31 de maio, o primeiro gigante atracou, do armador Evergreen, o Ever Laurel, com 334,9 metros de comprimento e 45,8 de largura. Já em 16 de junho, segundo a Portonave, foi recebido o maior navio que já navegou na costa brasileira, o APL Paris, de 347 metros. Até outubro, 40 gigantes foram operados com a nova bacia.
Ao todo, mais de 7.000 navios atracaram em Navegantes em 2020. O porto conta com 989 profissionais diretos e já movimentou cerca de 8,4 milhões de TEUs. Ainda representa 45% do market share de Santa Catarina, segundo a Portonave
Diego Garcia, Folha de São Paulo