A grande diferença é o
tamanho do grupo atendido,
o que expõe mais um
privilégio do funcionalismo
público no país
A gestão de aposentadorias e benefícios do Executivo federal conta com um efetivo que, proporcionalmente, é mais de 75 vezes superior ao disponibilizado para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) atender trabalhadores da iniciativa privada.
O INSS tem um funcionário para 3.100 segurados na ativa. No Executivo federal, essa proporção é bem menor: um para 40 servidores.
A falta de pessoal é apontada como uma das razões para a fila de espera por aposentadorias e benefícios do INSS, como auxílio-doença.
Cerca de 1,3 milhão desses pedidos aguardavam, em dezembro, a análise havia mais de 45 dias, descumprindo o prazo legal para resposta.
Para servidores públicos, a realidade é outra. Cada órgão tem um departamento próprio de gestão de pessoas, responsável pela avaliação dos requerimentos de aposentadorias.
Pouco mais de 15,2 mil funcionários atuam nessa área no governo federal. Já o quadro do INSS é composto por 23 mil funcionários para o atendimento da população e análise dos pedidos de benefícios.
A grande diferença, portanto, é o tamanho do grupo atendido, o que expõe mais um privilégio do funcionalismo público no país.
São cerca de 71,3 milhões de trabalhadores da iniciativa privada vinculados ao INSS, enquanto o aparato de gestão da folha de pagamento do governo federal cobre cerca de 610 mil servidores na ativa.
O quadro do funcionalismo deve se reduzir nos próximos anos. O ministro Paulo Guedes (Economia) quer travar concursos públicos e espera que metade dos servidores se aposente nos próximos cinco anos.
O processo para pedir a aposentadoria também é diferente no serviço público e na iniciativa privada.
No governo federal, isso começa em cada órgão, com a apresentação dos documentos. Depois, quando chega ao departamento de centralização de serviços de inativos e pensionistas do Ministério da Economia, a média é de 15 dias para a conclusão do processo.
O procedimento é mais eficiente do que no INSS.
Hoje, o tempo médio de espera para a liberação de benefícios ao trabalhador do setor privado é de 65 dias. No caso específico das aposentadorias, o prazo chega a 125 dias.
Os servidores do Legislativo e do Judiciário, embora tenham menor peso na quantidade de funcionários públicos, também são privilegiados pelo modelo de gestão.
Na Câmara, por exemplo, os processos são concluídos de 10 a 15 dias após a solicitação do servidor. Na Casa, cada 1 dos 15 funcionários que atuam na gestão de pessoas atende 185 servidores.
No STF (Supremo Tribunal Federal), o tempo médio para a análise e concessão da aposentadoria é de 30 dias. Cada tribunal tem um departamento próprio para essa área.
Levantamento da consultoria de recursos humanos Propay aponta que 82% das companhias com mais de 10 mil funcionários têm pelo menos 30 profissionais de RH.
Considerando esse dado como base, cada profissional de RH atende cerca de 330 funcionários, número maior do que o do serviço público e muito menor do que o observado no INSS.
A consultoria pondera que estabelecer uma proporção exata entre o tamanho do RH e o número de colaboradores é uma medida controversa.
A redução do efetivo do INSS era um problema anunciado. O governo já registrava a queda no número de servidores ativos por causa de aposentadorias. O quadro caiu de 33 mil para 23 mil de 2016 a 2019.
Para tentar zerar a fila de espera por benefícios do INSS, a equipe do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou uma nova força-tarefa, após duas tentativas fracassadas no ano passado e em 2018, para acabar com o estoque em atraso.
Dessa vez, o plano prevê aumento temporário de funcionários no INSS por meio da contratação de militares e servidores aposentados. As medidas, contudo, ainda não estão em vigor.
Técnicos do governo esperam que os atos legais para a adoção do efetivo adicional sejam publicados ainda neste mês. A previsão é que o edital de convocação para os cargos temporários possa ser
lançado no início de março.
lançado no início de março.
No caso do atendimento aos servidores, que já apresenta performance melhor do que no INSS, a equipe econômica também estuda uma reestrutura. A meta é adotar alternativas que possam tornar o RH do serviço público mais eficiente e produtivo.
A ideia é criar um centro único para gestão do regime previdenciário da União, em vez de deixar essa função pulverizada em diferentes órgãos públicos, como é atualmente.
A estratégia, porém, está em gestação desde abril do ano passado, quando o então secretário de Previdência do Ministério da Economia, Leonardo Rolim, informou à Folha a perspectiva de realocar até 9.000 servidores do Executivo para outras áreas.
Rolim assumiu em janeiro o cargo de presidente do INSS, diante da crise envolvendo a fila de espera por benefícios com o desafio de desafogar o atendimento.
Na avaliação do economista Paulo Tafner, especialista na área de Previdência, uma revisão na estrutura de atendimento é justa, pois há um excesso de pessoas na análise de aposentadorias do regime de servidores públicos.
“Tem muita gordura para queimar. Antigamente havia diferentes regras [de aposentadoria] para diferentes carreiras, que foram sendo padronizadas. Agora, isso [departamentos próprios em cada órgão] não faz mais sentido”, disse Tafner.
Economista da PUC-RJ, José Márcio Camargo afirmou que a unificação dos departamentos de gestão de benefícios para servidores mostraria que o governo está no caminho certo nessa questão, pois quer racionalizar o uso de recursos públicos. “É também uma questão de justiça.”
Guedes criou um grupo para concluir a proposta de unificação dos órgãos em outubro. Porém, ainda não há conclusão do trabalho.