quinta-feira, 25 de abril de 2019

Raquel descarta crime eleitoral de Aécio e pede inquérito da Odebrecht na Justiça Federal

Fotos: Dida Sampaio e André Dusek / Estadão

Em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu o arquivamento das investigações de suposto caixa 2 envolvendo o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG) e defendeu o envio do restante da apuração (sobre corrupção e lavagem de dinheiro) à Justiça Federal de Minas Gerais. O pedido será analisado pelo relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski.
O inquérito, instaurado no âmbito da delação da Odebrecht, investiga também o senador Antônio Anastasia (PSDB-MG), o deputado federal Dimas Toledo (PP-MG) e o ex-ministro Pimenta da Veiga, e apura repasse de R$ 6 milhões em vantagens indevidas da Odebrecht ao grupo político de Aécio nas eleições de 2014. As suspeitas iniciais são de que foram cometido os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
De acordo com colaboradores da Odebrecht, o então senador Aécio Neves teria solicitado na campanha de 2014, doações em um total de R$ 6 milhões, em benefício dele e de aliados políticos.
Na avaliação de Raquel Dodge, o conjunto de provas coletadas até aqui “é bastante consistente e aponta para a prática, em tese, de crimes de corrupção ativa  e passiva qualificadas, de lavagem de dinheiro e organização criminosa”.
“O esforço investigativo realizado no bojo do presente inquérito permitiu que importantes passos rumo à elucidação dos fatos investigados fossem dados. Entretanto, o completo esclarecimento dos fatos ainda demanda novas diligências, e, assim, a continuidade das investigações”, observou a procuradora.
HISTÓRICO. De acordo com Raquel Dodge, o inquérito indica que o grupo Odebrecht “mantinha um histórico de relacionamento” com o deputado federal Aécio Neves, “pautado na oferta de valores, em troca de benefícios ilícitos, como no caso da Cidade Administrativa de Minas Gentis, bem como influência política sobre Furnas e o Projeto Madeira, em especial sobre a hidrelétrica de Santo Antônio”.
“Nesse contexto, o cenário não é de envolvimento ocasional em crimes de corrupção, mas da prática de corrupção sistêmica, de caráter marcadamente político”, frisou a procuradora.
Segundo a procuradora, o caso envolve supostos atos praticados valendo-se da função pública, o que caracterizaria os crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro, não estando presentes indícios de utilização de valores não contabilizados e não declarados à Justiça Eleitoral em campanha eleitoral, o que seria enquadrado como caixa 2.
Para Raquel Dodge, as investigações devem sair do Supremo, já que os supostos crimes foram cometidos por Aécio Neves no mandato de senador em 2014, sem relação com o atual cargo dele, de deputado federal – não se encaixando, portanto, no novo entendimento do STF sobre o alcance do foro privilegiado para parlamentares.
“Percebe-se, portanto, que no estágio atual da apuração existem fortes indícios de que a vantagem indevida foi paga em razão da função pública desempenhada por Aécio Neves, de sorte que a competência da Justiça Federal resta cristalina”, concluiu a procuradora.
COM A PALAVRA, CRIMINALISTA ALBERTO ZACHARIAS TORON, QUE DEFENDE AÉCIO
O Supremo decidiu no mês passado que crimes como corrupção e lavagem devem ser julgados na Justiça Eleitoral se estiverem relacionados a caixa 2 de campanha. Com base nesse entendimento, a defesa de Aécio pede que as investigações sejam encaminhadas para a Justiça Eleitoral de Belo Horizonte.
Para o criminalista Alberto Zacharias Toron, defensor de Aécio, a procuradora tenta uma “manobra inaceitável” para evitar que o processo vá para a Justiça Eleitoral.
“É triste dizer, mas é uma tentativa escancarada de não apenas se contrapor, mas se sobrepor à decisão do Supremo Tribunal Federal. É lamentável”, criticou.
“Ela pede artificialmente o arquivamento de eventual crime eleitoral e com isso mandar o caso para a Justiça Federal sem suporte algum”, avaliou Toron.

Rafael Moraes Moura, O Estado de São Paulo