Lula Marques - 1°.jan.2003/Folhapress | |
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso passa a faixa presidencial ao seu sucessor, Lula, em 2003 |
MARIANA CARNEIRO
DE BUENOS AIRES
DE BUENOS AIRES
Folha de São Paulo
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse lamentar que seu sucessor no cargo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tenha sido "absorvido pela política brasileira tradicional, clientelista, corporativista e ideológica".
Em entrevista publicada neste domingo (1º) no jornal argentino "La Nación", FHC afirma que é "muito penoso ver no que se converteu Lula".
"Era um líder sindical autêntico, não necessariamente de esquerda, que tinha um compromisso real com os trabalhadores. Mas se foi deixando absorver pela política brasileira tradicional, clientelista, corporativista e ideológica", afirmou.
FHC disse que, durante o governo de Lula, houve progressos sociais, mas afirma que o legado do ex-presidente está "sendo comprometido por acusações inaceitáveis".
"Não sei se é culpado ou não de todas as acusações contra ele, seu filho e pessoas próximas".
"Quando, em 2005, ocorreu o escândalo do Mensalão, eu me opus ao seu impeachment porque não me parecia bom para o país que seu primeiro presidente operário terminasse perdendo o poder. Mas hoje me parece também muito ruim para o país que Lula tenha perdido tanta credibilidade".
O tucano afirma que Lula é o pai da atual crise política, mas diz que ele tem habilidade política para "virar a maré" a seu favor. "Já Dilma é mais rígida e essa crise está condenando seu governo".
Na entrevista, FHC voltou a defender que a presidente renuncie ao cargo e disse que estaria disposto a ajudá-la a encontrar uma saída da crise, se fosse convidado.
ARGENTINA E VENEZUELA
FHC também fez comentários sobre a política da Argentina, que está em meio a eleições presidenciais.
Ele se disse "surpreso e animado" com o que considerou um revés para o kirchnerismo na eleição do último dia 25 de outubro.
Na ocasião, o candidato da situação, Daniel Scioli, foi o mais votado, mas não conseguiu evitar um segundo turno contra o opositor Mauricio Macri, da coligação Mudemos.
"Me pareceria muito positivo que houvesse uma alternância de poder na Argentina", disse. "Não porque Macri e eu tenhamos as mesmas ideias, mas porque o que fez o governo de Cristina Kirchner nos últimos anos na Argentina foi desastroso".
Segundo FHC, uma mudança na política Argentina poderia ter repercussão na Venezuela, que tem eleições legislativas em dezembro.
"Se a vitória da oposição na Argentina repercutisse nas eleições legislativas da Venezuela, seria uma maravilha. Porque a Venezuela tampouco pode seguir assim", disse o brasileiro.
FHC também fez recomendações a Macri, candidato de origem abastada e que tenta vencer o popular peronismo argentino.
"Tem que vencer o preconceito de que pertence a uma classe alta, não com palavras, mas com gestos de aproximação com pessoas de todos os tipos", aconselhou o sociólogo que recorreu até a buchada de bode durante a campanha pela sua reeleição, em 1998.