sábado, 30 de setembro de 2017

"Privatização da Eletrobras é melhor notícia do ano, mas incomoda muitos"

Renato Costa/FramePhoto/Folhapress
O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho, fala sobre privatização da Eletrobras durante audiência pública em Brasília, nesta terça
O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho, fala sobre privatização da Eletrobras durante audiência pública em Brasília
Paulo Mayon - Folha de São Paulo



Toda divergência e todo debate são salutares. Eles cumprem a função de promover um processo mais detido e transparente na condução do processo.

Afinal, a Eletrobras é responsável por mais de 32% da geração e quase metade das linhas de transmissão do nosso sistema integrado, que promove as transferências de energia de uma região para outra do país.

Os anos se passaram, e a governança do setor elétrico sofisticou-se a ponto de já estar se movendo na direção do direito de escolha do consumidor. Em breve, consumidores passarão a optar pelo seu fornecedor de energia elétrica, como já o fazem com as telecomunicações.

Outra importante transformação foi que, da década de 90 para cá, o setor passou a contar com instituições e autarquias altamente técnicas e preparadas, como o ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica), a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e a EPE (Empresa de Pesquisa Energética), que exercem papéis fundamentais em planejamento, operação, fiscalização e contabilização das atividades -atribuições outrora concentradas na Eletrobras.

A velocidade de mudança nas tecnologias e hábitos de consumo vem impactando diretamente o uso da energia elétrica, tornando o ambiente cada vez mais disruptivo. Tudo se move aceleradamente para um cenário de alta competição.

Nesse contexto, a Eletrobras demanda rápida transformação. O desafio de buscar uma rentabilidade adequada ao nível de risco de suas atividades se torna quase impossível se levarmos em conta: o atual endividamento (são cerca de R$ 23 bilhões), as características próprias nas relações internas de trabalho com seus colaboradores, os arranhões de imagem com as investigações que a Operação Lava Jato iniciou por meio da Eletronuclear, e a histórica perda de valor de mercado devido à medida provisória 579.

Nada melhor do que os números para iluminar a discussão em curso. Bastou o governo indicar que pensava em sair gradualmente de sua participação da Eletrobras que as ações subiram 50% em um dia.

Para referendar o custo da 'não privatização', estudo recente do Instituto Acende Brasil demonstrou que, em 2016, a medida Lucro/Receita da Eletrobras foi de 6 centavos para cada 1 real.

A sua congênere Engie Brasil, na mesma medida, auferiu 25 centavos para cada 1 real de receita. Isso mesmo, 4 vezes mais rentável após a privatização. Em outra medida importante, a de receitas por empregado, no mesmo ano, a estatal atingiu R$ 2,64 milhões; a Engie Brasil, R$ 5,82 milhões.

Uma nova Eletrobras sem o controle da União, que tem hoje mais de 60% das ações, permitirá agilidade decisória, acesso mais "barato" ao mercado de capitais, independência na formulação de suas estratégias corporativas, e mudança na forma de gestão dos recursos disponíveis.

A proposta que se desenha se ancora nas direções apresentadas por meio da Consulta Pública 33, fundamentais para que esse passo seja vitorioso.

O encaminhamento até agora divulgado mantém a União como acionista, com a possibilidade de deter ações de classe especial; separa do processo a usina de Itaipu e Eletronuclear; e permitirá que recursos a programas sociais importantes, como Luz para Todos, Proinfa (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia) e Procel (Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica), e pesquisa e desenvolvimento (P&D) sejam administrados de forma mais eficaz.

Que o bom debate prevaleça e que a necessária medida promova mais eficácia na gestão desse conglomerado. E que, como resultado final, os consumidores possam se beneficiar de mais competição setorial.

PAULO MAYON é sócio da Compass Energia