Federico Rios/Reuters | |
Papa Francisco acena para fiéis durante passagem pela cidade de Cartagena, na Colômbia Folha de São Paulo
Visitei nesta semana a Colômbia e impressionaram-me os persistentes desafios do processo de paz em curso. A desativação da mais antiga guerrilha do continente, as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), não é um processo simples, carregado que é de sentimentos contraditórios, já que o conflito, iniciado em 1964, causou 220 mil mortes e seis milhões de deslocados, que clamam não só por paz, mas por justiça.
O problema das vítimas como mobilizador da continuidade dos conflitos, magistralmente retratado por Antonio Callado em "Bar Don Juan", envolve uma percepção de que abandonar a luta significaria uma traição aos que caíram. Assim, em nome dos mortos passados, novas matanças se iniciam, num processo que se perpetua.
Foi contra essa dinâmica que o papa Francisco se colocou em visita recente ao país, enfrentando oposição dentro da própria igreja. O papa pediu aos colombianos que renunciassem à vingança para conseguir uma paz duradoura, apoiando assim a proposta do presidente Santos e chamando os bispos a se engajarem no processo.
O caminho para a paz incluiu a entrega das armas pelas Farc e de lista de seus ativos para a ONU, para que sejam usados tanto para reparação das vítimas do grupo quanto para programas de reintegração de ex-combatentes.
E, para ser completo, precisa avançar com as negociações com o ELN (Exército de Liberação Nacional), em sequência ao recente anúncio do cessar-fogo bilateral.
Nos muros de várias escolas em Bogotá, vi a menção à importância da paz e pude, nesta que foi a Semana do Estudante, ver em seu desfile na praça de Bolívar bandeiras e cantigas com referências ao processo. No rosto das crianças tudo parecia fácil, mas não será —que o digam países como Ruanda, em que, apesar da paz e da reconciliação, a sensação de justiça demorou a se fazer sentir, o que também levou o papa a, em 2017, 23 anos depois do genocídio dos tutsis, pedir perdão pelo fato de a igreja católica, como instituição (e não apenas com a participação eventual de alguns padres e freiras, como se afirmava anteriormente) ter contribuído para o massacre.
A educação sofre muito com a falta de paz, que o digam os alunos de áreas conflagradas do Rio de Janeiro ou as crianças sírias privadas de acesso a escolas, mas pode também ser um caminho para construí-la. Se, em vez de invocarmos nacionalismos estreitos e entoarmos chamamentos para uma ação tão viril quanto destrutiva, educarmos para a cidadania global e para a solução pacífica de conflitos, muito sangue deixará de correr em guerras que tendem a se eternizar, em homenagem aos mortos dos dois lados que precisam ser vingados.
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