Poucos passos separam a banca de jornais de Luiz Galan da barraquinha de flores de Mara Menezes, ambas na estação de trem do Retiro, na capital argentina. As sensações de seus donos em relação ao momento econômico, entretanto, não poderiam ser mais distantes. Enquanto o primeiro diz sentir uma retração nas vendas desde 2016, a segunda afirma que a situação melhorou. Em geral, esse é o cenário do País: a população está dividida entre os que já percebem, no dia a dia, a melhora proveniente do crescimento de 1,6% do PIB no primeiro semestre deste ano e os que não notam nenhum sinal.
Galan, que trabalha em sua banca há 30 anos, afirma que, há dois anos, comercializava 170 jornais por dia. Desde o ano passado, são 120 em média. Ele conta que as vendas vão bem na primeira semana de cada mês, logo após os trabalhadores receberem seus salários, e vão caindo até a última. Galán reclama ainda do aumento nas tarifas de luz, gás e transporte. Antes de o governo de Mauricio Macri começar a retirar os subsídios dos serviços, a conta de luz da banca de jornal era de 300 pesos por mês. Agora, são 1.300 pesos.
Mara também reclama dos preços. No caso do gás, diz que subiu de 40 pesos para 120 pesos. Por outro lado, afirma que as vendas dobraram em relação ao ano passado. De rosas, por exemplo, antes se abastecia com dois pacotes de cem unidades cada um por dia. Atualmente são quatro.
De acordo com o economista Andres Borenstein, do BTG Pactual na Argentina, é normal que as pessoas demorem a sentir a recuperação, já que muitas empresas estão procurando melhorar sua competitividade, aumentando a produção sem alterar seu quadro de funcionários. Na indústria, isso é mais acentuado: os segmentos que estão se destacando são pouco intensivos em mão de obra, explica. Além disso, as industriais que empregam mais, como a têxtil, são as que competem com produtos internacionais, e os importados ganharam força com a abertura do mercado que vem sendo promovida por Macri.
A taxa de desemprego recuou de 9,3% no segundo trimestre de 2016 para 8,7%, patamar ainda considerado alto. O trabalhador Emanuel Cancino, de 35 ano, está desempregado desde junho, quando a Pepsi fechou uma fábrica na região metropolitana de Buenos Aires e demitiu 691 funcionários – desses, 155 foram transferidos para outra unidade.
A empresa informou que encerrou as atividades da planta por ela estar em um bairro residencial – o que impedia a expansão –, por sua inviabilidade econômica devido aos custos altos de manutenção e por dificuldades logísticas. Sem o salário de 18 mil pesos por mês, Cancino, que tem um filho de quatro anos, vive de bicos e de ajudas e passa os dias em um acampamento diante do Congresso argentino, pedindo a reincorporação dos trabalhadores da Pepsi.
Até mesmo nos canteiros de obra, o clima não é de grande empolgação, apesar do crescimento de 9,7% do setor da construção entre abril e junho. O pedreiro paraguaio Salvador Lara, de 29 anos, diz não sentir diferença no mercado de trabalho nos últimos três anos. Apenas comemora o fato de estar alocado na construção de uma pista que ligará as regiões norte e sul de Buenos Aires. A obra pública deverá levar três anos. “Estamos garantido até lá”, diz.
O taxista Hercules Cejas, de 55, afirma que a situação começa a melhorar, mas que "a reativação que todos esperam vem muito lentamente".