A chegada da cavalaria americana anuncia a derrota do bando fora da lei
O Brasil nasceu sem saber direito o que era. Foi Ilha de Vera Cruz até algum marujo alertar que era muito litoral para uma ilha só. Então virou Terra de Santa Cruz, porque sem dúvida era terra o que pisavam depois do desembarque das caravelas. E as trilhas escuras que começavam a poucos metros da areia fina e branca levavam a terra da boa, cheia de gente cor de cobre a ludibriar, muita fruta sumarenta e, melhor que tudo, muita índia pelada.
“Com as vergonhas à mostra”, suavizou Pero Vaz de Caminha na carta ao rei de Portugal que transformou o Brasil no único pedaço do planeta com certidão de nascimento. Redigida uma semana depois da chegada da frota de Pedro Álvares Cabral, a carta-certidão é um monumento à imaginação destrambelhada. Caminha talvez soubesse que acabara de desembarcar num dos portos naturais do continente americano, descoberto anos antes por Cristóvão Colombo, navegante a serviço da família real da Espanha. Se sabia, fez de conta que tinha poderes para doar ao rei de Portugal o colosso territorial onde, em se plantando, tudo dá.
Nascido sob o signo da confusão, o Brasil cresceu sem pressa. Os pioneiros demoraram meio século para escalar a muralha verde que separava o mar do sertão e dar uma espiada no que havia do outro lado. E então começou o desfile de maluquices coloniais. Primeiro, o Brasil foi retalhado em 14 faixas horizontais distribuídas entre amigos do rei. Dois conheceram a prosperidade. Outros 11 afundaram na miséria, e um sequer se deu ao trabalho de cruzar o Atlântico para espiar o que ganhara.
Desfilaram na sequência os governadores-gerais, os vice-reis, o príncipe regente e a rainha Dona Maria I, a Louca. D. Pedro I proclamou a Independência, brigou com meio mundo e achou mais interessante voltar à Europa para instalar uma filha no trono usurpado por um tio. Sem pai nem mãe, na Quinta da Boa Vista, D. Pedro II soube que se tornara maior de idade aos 14 anos e era o novo imperador. Assessorado por uma regência una e uma regência trina, achou melhor errar sozinho. Nunca entendeu direito por que se tornou rei. Tampouco entendeu por que foi deposto em 1889.
“Os senhores são uns doidos”, foi a última frase de D. Pedro II aos soldados que o escoltaram até o ponto de partida para o exílio. A continuação da história parece dar-lhe razão. Se tivesse juízo, o Brasil não teria inventado, além do brasileiro, o analista de juiz de futebol, o jurado de escola de samba, o flanelinha, o guerrilheiro que não sabe a diferença entre o cano e o gatilho, o despachante, a tomada de três pinos, o senador biônico ou Geraldo Alckmin. Como entender um povo que elegeu Juscelino Kubitschek, o mais risonho dos presidentes, e em seguida Jânio Quadros, o mais carrancudo entre todos? Ou substituiu FHC, o mais culto entre os chefes de governo, por um analfabeto funcional orgulhoso da própria ignorância? E em seguida, sem pausa para hidratação, uma mulher incapaz de dizer coisa com coisa?
Entre janeiro de 1995 e dezembro de 2002, quando o mundo não demonstrava maior interesse pelo que acontecia no País do Carnaval, o Brasil liderou a América do Sul com sensatez, sem bravatas nem bazófias. Durante os dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, enquanto o Itamaraty mantinha a política externa a serviço dos interesses nacionais, FHC concentrou-se pessoalmente na remoção de tumores antigos e recentes. Foi ele quem costurou, por exemplo, o acordo entre o Equador e o Peru que encerrou um dos mais antigos conflitos de fronteira do subcontinente.
Também coube a FHC, a pedido de Bill Clinton, silenciar no nascedouro berreiros inconvenientes ensaiados por Hugo Chávez, eleito em 1998 presidente da Venezuela. O Paraguai abrandou a choradeira pela revisão do Tratado de Itaipu. A Bolívia entendeu que o preço do gás vendido ao vizinho tinha de levar em conta que o comprador havia bancado sozinho a construção do gasoduto bilionário. O Brasil não foi desafiado por ninguém. A coisa começaria a desandar com a vitória de Lula na eleição presidencial de 2002.
Fruto do acasalamento de guerrilheiros de festim, homicidas sem remorso, velhotes viúvos de Stalin, marmanjos apaixonados por Fidel Castro, operários seduzidos por pregadores vigaristas e nacionalistas de galinheiro já infiltrados no Itamaraty, o aleijão ideológico disfarçado de “política externa” nasceu com 200 (ou 300?) anos de idade. Teria morrido de velhice nos trabalhos de parto se não fosse apadrinhado pelo único presidente brasileiro que não aprendeu a ler nem escrever. E não cruzaria a primeira infância sem os cuidados dispensados pela dupla de babás composta por Celso Amorim, o Pintassilgo do Planalto, e Marco Aurélio Garcia, uma boca implorando por dentistas.
Nos dois primeiros mandatos de Lula, o Brasil suportou com passividade bovina bofetadas desferidas pela Argentina e pela Bolívia. Hostilizou a Colômbia democrática enquanto afagava os narcoterroristas das FARC. Curvou-se aos caprichos e vontades da Venezuela bolivariana. E deixou voluntariamente de ser sinuelo para virar mais um no rebanho. Simultaneamente, fantasiou-se de “potência emergente” para intrometer-se em assuntos internos de outras nações que não têm tempo a perder com anões diplomáticos.
Reduzido a braço internacional da seita lulopetista, o Itamaraty não perdeu nenhuma chance de escolher o lado errado. Entre os Estados Unidos e qualquer obscenidade que se opusesse ao imperialismo ianque, preferiu invariavelmente a segunda opção. Subordinado aos napoleões de hospício que proliferam nos grotões cucarachas, Lula rebaixou a embaixada em Honduras a Pensão do Companheiro Manuel Zelaya. Para prestar vassalagem a Fidel Castro, não enxergou diferenças entre os bandidos encarcerados em São Paulo e os dissidentes trancafiados nas masmorras da ilha-presídio.
Entre a civilização e a barbárie, Lula jamais hesitou. Afrontou o país que presta ao bajular o faraó de opereta Hosni Mubarak, o psicopata líbio Muammar Kadafi, o genocida africano Omar al-Bashir ou o iraniano atômico Mahmoud Ahmadinejad. Coerentemente, o último ato de um presidente que se achava capaz de resolver os conflitos do Oriente Médio com meia dúzia de conversas de botequim foi promover a asilado político o assassino italiano Cesare Battisti. A primeira passagem de Lula pela Presidência terminou em dezembro de 2010. Dilma Rousseff demorou poucas horas para avisar que nada mudaria.
Engajou-se com o entusiasmo de baliza de fanfarra na trama golpista que tentou manter na presidência do Paraguai o ex-bispo Fernando Lugo, o Reprodutor de Batina, que engordava com filhos do padre os rebanhos das paróquias onde baixava. O oneroso noivado com Nicolás Maduro, as mesadas ao governo em decomposição de Nicolás Maduro, os donativos secretos do BNDES à ditadura cubana, a importação de escravos de jaleco que rendeu à ilha-presídio mais de US$ 23 milhões por mês e outras iniquidades confirmaram a suspeita: Dilma era um Lula que falava dilmês.
Hoje no terceiro mandato, Lula faz o que pode para provar que, com o PT no governo, o que parece ter ultrapassado todos os limites da infâmia pode ficar muito pior. Marco Aurélio Garcia morreu. Celso Amorim trabalha dois dias por semana, mas tenta compensar o expediente curto com declarações ainda mais abjetas. Para os superjuízes do Supremo Tribunal Federal, é pouco. Inquietos com a visão dos xerifes americanos com a mão no coldre, Alexandre de Moraes e Flávio Dino ameaçam empunhar o tresoitão e cuidar da política externa.
Tomara. Se tal duelo acontecer, o final será infeliz para os fora da lei fantasiados de juízes. Com a entrada em cena da cavalaria americana, ficou claro que há limites até para o mais obsceno anti-herói do faroeste à brasileira.
Augusto Nunes - Revista Oeste