sexta-feira, 31 de julho de 2020
"O que esta tragédia traz de bom", por Jeffrey Tucker
Aprendi três grandes lições a partir da experiência do lockdown. A principal, a certeza de que é preciso lutar permanentemente pela manutenção da liberdade.
Muitos milhões de pessoas passaram os últimos quatro meses em tristeza e depressão. É difícil ver o mundo despedaçado pelo mau comportamento dos governos — e ver tantos de nós torcer pela destruição — e não ter uma sensação de desespero.
No entanto, a humanidade é algo incrível. Se nos empenharmos, poderemos encontrar uma boa lição em eventos terríveis. Fazer isso — é preciso esforço — pode elevar espíritos e apontar o caminho para sair do pântano.
Eu tirei três coisas positivas dessa experiência.
Primeiro, superei completamente meu vício de décadas no noticiário. Sempre amei acompanhar as notícias, mesmo quando era criança. Por anos, li o Washington Post com meu café matinal. Então, eu pegava o New York Times. Aprendia a obter a verdade da cobertura tendenciosa, mas abrangente, deles. Então acrescentava o Wall Street Journal. Quando os home assistants surgiram, programei o meu para transmitir oito horas de noticiário sem interrupção: BBC, NPR, NYT e tantos outros. Parecia um luxo.
O ponto de virada aconteceu em 28 de fevereiro de 2020, quando o podcast do New York Times (que costumava ser meu favorito) lançou um episódio de pornografia do pânico que previa que o novo coronavírus mataria 8,25 milhões de norte-americanos, ou “seis amigos seus”.
Foi um choque constatar que eles colocaram seu principal podcast para provocar um medo público que estimulasse o lockdown. Explicitamente. Essa era a pauta. E mais ou menos admitiram isso. Soube naquele momento que o jornal tinha aceitado contribuir para essa trama maliciosa de encenar um empreendimento social/político sem precedentes.
O NYT abriu o caminho. Em pouco tempo, a mídia mainstream se tornou universalmente pró-lockdown, provavelmente por razões políticas. Um vírus leve e disseminado, perigoso principalmente para uma população específica com baixa expectativa de vida e quase inofensivo para todos os demais, foi retratado todo dia e toda hora como a nova peste bubônica.
Devo ter ouvido o podcast por mais uns dois dias. Então parei. Tudo ficou claro. Decidi, de maneira súbita e surpreendente para mim, parar de encher a cabeça com bobagens. As “notícias” não estavam trazendo informações para me ajudar a entender o mundo; elas estavam atrapalhando minha habilidade de pensar com clareza. Alguns meses depois, como estava programado, a revolução do New York Times foi concluída quando o diretor de opinião, contratado para diversificar as opiniões do jornal, foi demitido sem a menor cerimônia por diversificar as opiniões do jornal. (O pessoal da teoria crítica descobriu um novo amor pelo direito das instituições de demitir pessoas, contradizendo décadas de oposição da esquerda.)
Comecei a obter minhas informações procurando por elas, buscando perfis confiáveis para seguir no Twitter, dedicando meu tempo às páginas de estatísticas e, fora isso, pesquisando fatos, lendo história e me informando de maneira mais aprofundada, em vez de apenas confiar na mídia.
Uma exceção aqui: The Wall Street Journal, que teve um desempenho heroico durante o processo todo.
Neste momento, posso dizer que nunca mais vou voltar. Meu vício nas “notícias” se acabou. Estou melhor assim. Foi doloroso, mas estou feliz.
Alguns leitores agora estão dizendo: até que enfim. O noticiário sempre esteve interessado em atrair olhos e ouvidos e vender anúncios. É apenas entretenimento. Isso se tornou especialmente verdadeiro com o ciclo de 24 horas de notícias.
Não discordo. Eu deveria ter parado há anos. Mesmo agora, sou capaz quase imediatamente de ver a diferença entre uma pessoa que assiste ao noticiário da TV ou ouve rádio mainstream versus aquela que de fato se informa sobre o que está acontecendo.
De todo jeito, considero isso uma vitória real, cortesia do lockdown.
Segundo, economizei uma quantidade enorme de dinheiro não indo a restaurantes, bares e ao cinema. Fico triste por todos os lugares que fecharam. É injusto e ruim. Mas, da minha perspectiva, aprendi a viver uma vida boa gastando provavelmente 30% menos do que antes. Eu me apaixonei de novo por cozinhar, pelos coquetéis caseiros e pela leitura.
É melhor assim. Duvido que volte, agora que sei preparar todas as minhas refeições favoritas por uma fração do que costumava pagar. Agora que as coisas estão abrindo, talvez até vá a alguns restaurantes, mas duvido que volte a como as coisas eram.
Terceiro, aprendi uma lição muito valiosa, a de que uma civilização pode ser desmontada em questão de meses. Pode acontecer de novo se não houver vozes apaixonadas por aí que entendam sua base e sejam capazes de defendê-la com integridade intelectual, fatos e poder retórico. Nunca imaginei que algo assim pudesse acontecer. Achei que fosse impossível — com uma Constituição, uma tradição de liberdade, e um povo que nunca permitiria que os direitos humanos fossem retirados de modo tão repentino e cruel. Aconteceu, e saber disso trouxe uma paixão renovada por meu projeto de vida de amar, entender e difundir a ideia de liberdade.
É impressionante como tudo se deu.
Governos e seus defensores tomaram para si um assunto sobre o qual a população é, hoje, bastante ignorante e temerosa — um vírus e a afirmação de que 8,25 milhões de norte-americanos iam morrer — e exploraram essa ignorância para fazer as pessoas abrir mão de seus direitos. Mesmo que a coisa estivesse mapeada 14 anos antes, talvez como forma de encontrar alguma fundamentação para a presença contínua e crescente do governo em nossa vida, apesar de sua irrelevância cada vez maior em outras circunstâncias, muitos do lado pró-liberdade das coisas foram pegos com a guarda baixa e não souberam como reagir.
Muitas pessoas — até mesmo aquelas empregadas no trabalho de “promover a liberdade” — apenas ficaram em silêncio. Por meses. Exatamente quando suas vozes eram mais necessárias. Isso foi uma tragédia. Serei eternamente grato pelo site do American Institute for Economic Research [organização da qual o autor é diretor]. Em algumas ocasiões nestes meses, o site pareceu uma solitária voz de sanidade.
Essa terceira lição — ser grato pelas nossas liberdades e pela nossa civilização, e nunca achar que elas podem ser menosprezadas — talvez seja a mais valiosa. Tenho pensado que, certamente, muitas outras pessoas aprenderam lições semelhantes. Perderam a fé no noticiário, redescobriram a frugalidade e encontraram uma nova forma de se comprometer com a defesa da liberdade e dos direitos humanos. Nos dias vindouros, vamos precisar de mentes mais fortes e mais inteligentes para travar as batalhas do futuro. Esses meses terríveis podem ter sido a preparação de que precisamos para garantir que a verdade e a liberdade prevaleçam no fim.
Jeffrey Tucker é economista norte-americano, defensor da Escola Austríaca e do libertarianismo, associado do Action Institute e autor do livro Coletivismo de Direita (2017), publicado no Brasil pela LVM Editora.
Revista Oeste