Do UOL
- Ricardo Moraes/ReutersCitada na Lava Jato, obra do metrô do Rio custará quase o dobro do prometido
A Operação Lava Jato investiga há 25 meses um esquema de corrupção envolvendo políticos, empresas e algumas das maiores obras do país. Mais de 20 grandes projetos já foram citados em denúncias ou delações. A maior parte deles acumula atrasos em sua execução e aumentos sucessivos de custo.
O UOL levantou o andamento e o orçamento de 19 obras ligadas à Lava Jato(confira a lista abaixo). Verificou que o custo delas, juntas, aumentou pelo menos R$ 162 bilhões. Já o maior atraso em execução é de oito anos.
Vale lembrar que essas mudanças não têm necessariamente relação com corrupção ou superfaturamento das obras. Os aumentos e os adiamentos são, em grande parte, justificados por mudanças ou adaptações corriqueiras feitas nos projetos.
A diferença nos preços, contudo, é expressiva. Na média, o custo desses 19 projetos citados na Lava Jato e incluídos no levantamento do UOL aumentou mais de 120%. Ou seja, o preço deles mais que dobrou.
Quando foram anunciados pelo governo ou empresas, esses projetos custavam juntos R$ 134,7 bilhões. O orçamento mais recente das obras aponta que elas consumirão mais de R$ 297 bilhões.
Belo Monte quadruplica seu custo
Uma das obras que contribuíram para essa diferença é a da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira (PA), relacionada ao pagamento de propinas em delação premiada de executivos da Andrade Gutierrez. Seu custo subiu 320% desde 2007. Nesse mesmo período, a inflação oficial (medida pelo IPCA) acumula menos de 77%.
A obra da usina foi incluída na primeira versão do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Na época, o governo indicou que ela custaria R$ 7 bilhões. Seu custo hoje beira os R$ 30 bilhões. Ainda em 2007, foi previsto que a usina começaria a operar em 2014. Belo Monte só começou a funcionar no mês passado.
A Norte Energia, consórcio responsável pela usina, informou que obteve em leilão realizado em 2010 o direito de construir e operar Belo Monte. Na época, foi programado que a usina começaria a operar em 2016, estaria 100% pronta em 2019 e custaria R$ 25,8 bilhões. Os R$ 30 bilhões atuais devem-se à correção monetária do custo do projeto.
A empresa também lamentou a citação da usina em reportagens sobre propinas investigadas pela Lava Jato. Segundo ela, essas notícias são "levianas".
O Ministério do Planejamento, que monitora a execução do PAC, ratificou que o projeto da construção de Belo Monte é diferente do anunciado em 2007. Por isso, existe a diferença nos custos. "O escopo executado é diferente do originalmente previsto", declarou o órgão.
Aeroporto oito anos atrasado
A obra mais atrasada entre as investigadas na Lava Jato é a da construção do novo terminal de passageiros do Aeroporto de Goiânia. Ela foi contratada e começou em 2005. Deveria ter terminado em 2008, ao custo de R$ 257 milhões. Só foi entregue neste mês, depois de consumir R$ 467 milhões.
A obra é um projeto da Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária) tocado pelas construtoras Odebrecht e Via Engenharia. Na 26ª fase da Lava Jato, deflagrada em março, a Odebrecht foi acusada pela Polícia Federal de ter pago R$ 1,4 milhão em propinas relacionadas à construção. A empresa não se pronunciou.
O TCU (Tribunal de Contas da União) já havia apontado irregularidades na construção e chegou a determinar sua paralisação ainda em 2007. A obra, porém, foi retomada em 2012. A Infraero informou desconhecer qualquer investigação da Polícia Federal ou Ministério Público sobre o empreendimento.
Custo de refinarias da Petrobras explode
Ao menos quatro refinarias da Petrobras também foram envolvidas na Lava Jato. Três dessas obras estão paralisadas hoje. Em duas, o orçamento das obras quase quintuplicou. Mesmo assim, elas não ficaram prontas.
A construção do Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), por exemplo, custaria US$ 6,1 bilhões (cerca de R$ 21,4 bilhões no câmbio de R$ 3,50) quando foi anunciada, em março de 2006. Antes de a obra ser paralisada, em 2015, o TCU apontou que ela já custava até US$ 30,5 bilhões (mais de R$ 106 bilhões). Procurada, a Petrobras não confirma o valor nem dá prazo para concluir o complexo.
Também houve aumento de preço na construção da Refinaria Abreu e Lima, em Ipojuca (PE). O orçamento da obra saltou de US$ 2,4 bilhões (R$ 8,4 bilhões) para R$ 40,1 bilhões (estimativa do Ministério do Planejamento).
Além desses dois projetos, foram citados na investigação os planos para construção da Refinaria Premium 1, em Bacabeira (MA), e da reforma da Refinaria Presidente Getúlio Vargas, em Araucária (PR).
A Petrobras foi contatada pelo UOL nos dias 5 e 27 de abril para comentar custos e prazos de obras da empresa citadas na Lava Jato. A empresa não divulgou valores envolvidos nos projetos nem confirmou dados divulgados na imprensa. A Petrobras diz que o esquema de corrupção investigado na Lava Jato causou danos à empresa e que ela tem colaborado com autoridades para reparar essas perdas.
Para Gil Castelo Branco, fundador da organização não governamental Contas Abertas, o fato de a Petrobras não divulgar dados sobre seus projetos é preocupante. "Não é à toa que esse escândalo de corrupção atinge a estatal. Há falta de transparência", disse.
Metrô do Rio e reforma do Maracanã
Também foram citadas em investigações da PF a construção da Linha 4 do Metrô do Rio de Janeiro e a reforma do Maracanã para a Copa do Mundo de 2014. Ambas são do governo do Rio. As duas ficaram mais caras que o inicialmente previsto
A primeira versão da Matriz de Responsabilidades da Copa previu que a reforma do Maracanã custaria R$ 600 milhões. Segundo o governo, porém, o primeiro orçamento da obra já previa gastos de R$ 705 milhões. Ela saiu por R$ 1,2 bilhão. O governo não explicou o aumento. Também não comentou as investigações sobre a obra. Só lembrou que suas contas foram aprovadas pelo TCU.
Já o custo da linha de metrô subiu de R$ 5,6 bilhões para ao menos R$ 9,15 bilhões. A Secretaria Estadual de Transportes do Rio, órgão que executa a obra, não comentou as suspeitas de propina relacionadas ao projeto.
Estádio Mané Garrincha, em Brasília
O custo da reconstrução do estádio Mané Garrincha, em Brasília, também saltou de R$ 745 milhões para R$ 1,4 bilhão, segundo a Matriz de Responsabilidades da Copa. O governo do Distrito Federal negou irregularidades na obra.
Informou que o aumento de custo está ligado à antecipação do cronograma de obras para que o estádio pudesse ser usado na Copa das Confederações de 2013. A primeira previsão de conclusão era dezembro de 2012. A reconstrução terminou em maio de 2013.
Estádio do Corinthians, em São Paulo
O Corinthians não se pronunciou sobre a construção de seu estádio, a Arena Corinthians, em São Paulo. O governo do Amazonas também não respondeu aos questionamentos a respeito da Arena da Amazônia.
O governo de Alagoas é responsável pelo Canal do Sertão. Ele declarou que acompanha as investigações da Lava Jato. Informou que o aumento do custo do trecho 4 da obra, citado em relatórios da Polícia Federal, está ligado a um aditivo assinado para adequação do projeto dos canais de irrigação.
A empresa federal Trensurb (Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre) informou que o aumento do custo da obra de expansão da linha de trem urbano da região metropolitana de Porto Alegre está ligado ao pagamento de desapropriações, modificações de projeto e correções monetárias.
A Valec, empresa federal responsável pelas ferrovias Norte-Sul e Integração Leste-Oeste, também culpou mudanças em projetos, reajustes e outros fatores pelo aumento no custo dos empreendimentos e pelo atraso na execução deles.
A Eletrobras foi procurada pelo UOL. Ela é responsável pelo projeto de Angra 3. Não respondeu à reportagem.
Porto Maravilha, no Rio
O Porto Maravilha, projeto municipal de revitalização da região portuário do Rio, está dentro do prazo prometido. Ele foi envolvido na Lava Jato. A prefeitura já afirmou que as suspeitas não estão diretamente relacionadas ao projeto, mas sim a financiamentos. Negou irregularidades.
O UOL ainda procurou as empresas Odebrecht, Andrade Gutierrez, Engevix, Carioca Engenharia e Queiroz Galvão para tratar das obras investigadas. Nenhuma delas se pronunciou sobre os projetos.
A concessionária Rio Barra, formada por um grupo de construtoras que executa a obra do metrô no Rio, informou que a mudança de custo do projeto se deveu a mudanças no modo de construção. Declarou também que parte da nova linha de metrô será entregue a tempo de atender as demandas da Olimpíada de 2016, que começa no dia 5 de agosto.