Quem ganha com uma 'inflexão' da política econômica?
A notícia do Valor de hoje — de que o ex-Presidente Lula e o PT estão tentando convencer a Presidente Dilma a abandonar o ajuste fiscal e reduzir os juros ‘na marra’ — está tendo reflexo no dólar e no mercado de juros, onde as taxas longas estão subindo.
Sim: em matéria de incerteza, é possível passar do fundo do poço.
Lula, o ex-sindicalista não-ideólogico cujo pragmatismo garantiu a continuidade do tripé macroeconômico herdado dos governos tucanos, agora está interessado em desmantelar mais essa parte da sua biografia.
Com a maior parte de seus apoiadores presos na Lava-Jato, o ex-presidente aposta na inflexão da política econômica com dois cálculos de sobrevivência política. No primeiro, a mudança na economia ajudaria a reenergizar a consumidor e, deste choque de demanda, num gesto de imaculada concepção, nasceria o crescimento econômico, garantindo ao PT uma sobrevida em 2018. (Esqueça. Não é assim que o mundo funciona).
Como Lula não tem faculdade mas não é burro, ele sabe disso. Assim, o mais provável é que esteja fazendo outro cálculo: ele sabe que o cavalo-de-pau na economia vai apavorar os empresários e os mercados, mandar o dólar pro espaço, causar uma espiral inflacionária e agravar a recessão. Neste cenário, o PT pode vender a tese de que foi ‘sabotado’. E, mesmo que isso não funcione, o desastre na economia (ainda maior que o atual) faria a Lava-Jato parecer um detalhe na paisagem. Lula ganha, o País perde.
O problema com essa estratégia é que a ‘inflexão’ da política econômica tem tudo para galvanizar, também, a vontade política necessária para o processo de impeachment.
A ideia de que uma economia desarranjada vai jogar a população nos braços do PT é, no mínimo, uma aposta duvidosa. O aumento do desemprego pode ter o efeito contrário, com os ‘deserdados’ da classe C migrando sua simpatia para setores mais ao centro. (E o PT, hoje, não tem mais dinheiro para pagar bons marqueteiros.)
Na tentativa inglória de precificar os cenários à frente, cerca de 40 gestores se reuniram ontem à tarde com Périso Arida, um dos pais do Cruzado e hoje sócio do BTG Pactual.
Desperdício de espaço dizer que ninguém saiu de lá otimista, mas Arida, um economista liberal, notou que o cenário mais ‘mal precificado’ pelo mercado é justamente o impeachment. Em outras palavras: um impeachment de Dilma, se acontecer, não está no preço dos ativos hoje. Arida disse que haveria um rali imediato — a Bolsa subiria, o dólar afundaria, etc. — mas que o percurso à frente continuaria a ser a estrada rumo ao Gólgota.
Pensando nisso, alguns grandes fundos de investimento nos últimos dias começaram a comprar Bolsa com a tese de que o impeachment vai prosperar em breve.
Talvez seja por isso que a Bolsa não esteja entregando os pontos hoje.
Enquanto os juros futuros sobem — o DI para janeiro 2021 sobe 30 pontos-base para 15,29% — e o real se desvaloriza 1,6% (enquanto todas as outras moedas emergentes caem menos de 1% antes do Fed), a Bovespa está no zero a zero.
Lula, querido, cuidado com as apostas.
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PS: Há pouco, o Instituto Lula negou a matéria do Valor, assinada por repórteres de notório calibre. Resultado imediato: o dólar ‘só’ sobre 1.1% e o DI só sobe 22 bps para 15,21%…
Estamos na era em que o ‘menos mal’ é a nova ‘boa notícia.’