As empresas brasileiras devem continuar se financiando na Bolsa para promover sua expansão em 2020, a exemplo do que já aconteceu em 2019. As operações de abertura de capital (IPO, na sigla em inglês) e emissões de ações de companhias já listadas na B3, a bolsa paulista, podem atingir de R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões no ano que vem, segundo fontes ouvidas pelo Estado. Em 2019, as operações no mercado de capitais somaram cerca de R$ 90,2 bilhões, com 42 transações (37 emissões de ações e 5 IPOs).
Do total movimentado em 2019, cerca de R$ 80 bilhões foram em emissões de ações – quase metade desses recursos foi para financiar os projetos de expansão das empresas e o restante foi para o bolso dos acionistas.
“As operações de emissões de ações (follow on) e IPO podem, no mínimo, dobrar em relação a 2019. Há potencial para bater R$ 200 bilhões”, disse à reportagem Fabio Nazari, chefe de mercado de capital de renda variável do BTG Pactual. Se concretizada a expectativa, poderá superar a marca recorde histórica de 2010, quando as operações totalizaram R$ 150,3 bilhões.
Fôlego de estatais
O movimento deve ser impulsionado pelas estatais, como Petrobrás e Caixa, além da venda de boa parte da carteira de ações nas mãos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na Bolsa. Somente a venda dos papéis do banco de fomento na petroleira deve movimentar cerca de R$ 25 bilhões. O BNDES também já tornou pública a intenção de se desfazer de metade de sua participação na JBS, podendo levantar cerca de R$ 10 bilhões.
O chefe de mercado de capitais e renda variável para América Latina do Morgan Stanley, Eduardo Mendez, destaca que a carteira de ações do banco de fomento é da ordem US$ 90 bilhões.
O Estado apurou que a BR Distribuidora, empresa de distribuição de combustíveis da Petrobrás, deverá fazer nova oferta de ações da companhia ainda no primeiro trimestre de 2020. Em julho, a Petrobrás levantou R$ 8,6 bilhões com a venda de 30% da fatia da BR Distribuidora na B3. A distribuidora de combustíveis, líder no País, abriu seu capital em 2017. A Petrobrás, dona do controle da empresa até julho de 2019, detém atualmente 37,5% de fatia na empresa.
Segundo Pedro Costa, chefe de renda variável do banco Santander, há potencial de 75 operações de emissões de ações e IPOs na Bolsa em 2020. Mais conservador, ele acredita que o valor movimentado pode ser de até R$ 150 bilhões. O Santander participou de 17 das 42 operações realizadas em 2019.
O setor de saneamento, que passa por uma mudança no marco regulatório, também deverá ser bastante ativo em 2020, de acordo com Costa. “Pelos menos duas companhias – a Cagece, do Ceará, e Compesa, de Pernambuco – já tornaram pública a intenção de fazer abertura de capital”, disse Costa. A Cagece já fez o pedido de registro de oferta pública na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
O Estado apurou que a Bahia, Distrito Federal e Rio de Janeiro também estudam a possibilidade de abertura de capital de suas empresas de saneamento como forma de melhorar suas contas e conseguir investir na expansão da rede. Nesses casos, no entanto, o processo ainda pode demorar mais algum tempo.
Na fila
Entre as empresas que já estão com processos em andamento para abertura de capital na B3 estão, por exemplo, a empresa catarinense de shoppings Almeida Junior, o birô de crédito Boa Vista SCPC e as construtoras Kallas e Cury. Já entre as ofertas de novas emissões de ações que devem acontecer já no primeiro trimestre é a do Banco Votorantim.
Para Eduardo Mendez, chefe de mercado de capitais e renda variável para América Latina do Morgan Stanley, com a queda da taxa de juros de 14% para 4,5% fez com que os investidores iniciassem um processo de realocação de seus investimentos, em fundos imobiliários e renda variável. Antes eles não precisam se preocupar muito, pois os títulos públicos conseguiam dar o retorno necessário para seus recursos. Por isso, diz ele, o apetite do investidor brasileiro está grande.
Do outro lado, a valorização da Bolsa tem atraído companhias que em outros momentos não queriam se financiar com emissão de ações. Nesse cenário, ele aposta que o volume e número de operações cresça 50% em 2020, com 18 a 25 IPOs. “Isso pressupondo um céu de brigadeiro com relação a apetite do investidor para as ofertas públicas”, diz o executivo.
A expectativa é que a demanda mais forte, de 60%, venha do mercado doméstico. “Mas não subestimaria o investidor estrangeiro se o governo continuar fazendo as reformas necessárias.” Na avaliação dele, o ano de 2020 vai mesclar grandes ofertas com operações de empresas menores. Acho que tem todo tipo, todo formato e todo gosto.
Renée Pereira e Monica Scaramuzzo, O Estado de S.Paulo