sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

José Paulo Kupfer: "O investimento sai da toca"

O Globo

Embora ainda longe de superar a enorme contração dos últimos anos, a demanda positiva por máquinas foi a melhor novidade do PIB no terceiro trimestre


Apesar das possíveis surpresas com a divulgação pelo IBGE, hoje, da evolução do PIB no terceiro trimestre, em razão dos efeitos da revisão definitiva dos resultados de 2015, o padrão da recuperação em curso na economia brasileira não sofrerá modificações significativas. É um desenho que confirma o presente melhor do que o passado e o futuro chegando a passos lentos. Como nos trimestres anteriores, em termos numéricos, a expansão se apresenta mais intensa na comparação com o mesmo período de 2016 do que em relação aos três meses anteriores.

Este é um fenômeno típico dos períodos de recuperação pós-recessões intensas e prolongadas. O ritmo da retomada, nessas circunstâncias, caracteriza-se por um efeito estatístico mais acentuado, na medida em que a comparação com o mesmo período do ano anterior parte de uma base deprimida, o que já não se verifica quando o cotejo é com o trimestre precedente. Nesse caso, por definição, pois se trata de um período de recuperação, a base de comparação é necessariamente mais alta.

A mesma situação ajuda a explicar as projeções para o último trimestre deste ano, completando o retrato econômico de 2017 como um todo. Os analistas esperam, para o período outubro-dezembro, uma repetição da pequena expansão registrada no terceiro trimestre — o que levaria o PIB a um crescimento nas cercanias de 0,8% em 2017 — e um avanço considerável no quarto trimestre sobre o mesmo período de 2016, em torno de 2%. 

Lembrar, para entender esse ritmo “mais forte” na comparação interanual, que o fundo do poço da recessão deu-se justamente no último trimestre do ano passado. E não esquecer, a propósito, que as estimativas de um crescimento mais robusto em 2018, entre 2,5% e 3%, levam em conta um carregamento estatístico de 1%, de 2017 para 2018, independentemente das vastas incertezas que rondam o ano eleitoral peculiar.

Assim como tem ocorrido nos trimestres precedentes, o impulso da retomada continua vindo, principalmente, do consumo das famílias. A diferença é que o ritmo de expansão deste item, depois de esgotado o impulso promovido pela liberação do FGTS inativo — o equivalente, como política econômica, a lançar dinheiro de helicóptero — está mais contido. 

Mesmo assim, permanece positivo porque o recuo do desemprego, ainda que lento e mais concentrado no segmento informal do mercado de trabalho, em combinação com a inflação baixa, eleva a massa real disponível de rendimentos. Juros menores, apesar da queda modesta em termos efetivos, reforçam o movimento, colaborando tanto para a redução do endividamento quanto na concessão de novos financiamentos.

Desta vez, porém, apareceu uma novidade importante no quadro conhecido e relativamente bem estabelecido da evolução recente da economia brasileira. Depois de cair, ininterruptamente, por 14 trimestres, a taxa de investimento voltou a dar o ar da graça e registrou uma primeira inflexão positiva desde o primeiro trimestre de 2014. A saída da toca, depois de um longo período de hibernação, se deu pelo aumento da demanda por máquinas e equipamentos e também na construção civil. O ímpeto do terceiro trimestre, segundo as previsões, deverá arrefecer no último quarto do ano, mas se manterá positivo. 

As previsões são de que os investimentos, com queda acumulada de 25% nos dois anos anteriores, reduzam a contração para 3% em 2017 e afinal avancem algo como 5% em 2018.

Não se trata ainda de um movimento de ampliação da capacidade instalada, até porque a ociosidade do parque produtivo permanece muito acima da média histórica e as incertezas políticas mantêm em suspenso a tomada de decisões nessa direção. De acordo com especialistas, o que parece ter tido início é um processo de modernização do parque existente (reposição de capital depreciado, em economês), apoiado em oportunidades de importação abertas pela taxa de câmbio favorável. Já os números positivos do investimento na construção civil estão sendo atribuídos a reformas de residências, um colateral dos impulsos observados no consumo das famílias. Investimentos destinados a aumentar a oferta na economia, o sinal mais concreto de superação consistente da longa crise, ainda não estão visíveis no horizonte.