sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Raquel questiona R$ 99 milhões para comunicação institucional do governo. A propósito, por que no Brasil governo tem que torrar nossa grana com propaganda? Maior democracia do planeta, EUA não têm essa excrescência

Amanda Pupo, Fabio Serapião, Julia Affonso e Fausto Macedo


Raquel Dodge e Michel Temer. Foto: Dida Sampaio/Estadão
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5863) no Supremo Tribunal Federal contra a dotação orçamentária de R$ 99 milhões em favor da Presidência da República, com destinação específica para a comunicação institucional. A dotação está prevista na Lei 13.528/2017, que abre crédito suplementar no valor de R$ 6,9 bilhões para reforço de dotações constantes da Lei Orçamentária vigente. A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, no plantão durante o recesso judiciário, requisitou informações com urgência e prioridade sobre a matéria aos presidentes da República e do Congresso, no prazo de dez dias.
As informações foram divulgadas no site do Supremo. O relator da ADI 5863 é o ministro Marco Aurélio.
“É natural que cada governo busque a implementação de uma dada ordem de propostas políticas”, observa a procuradora-geral. “Se, porém, o governo entende que deve esforçar-se por persuadir a população do acerto de uma proposta polêmica, não pode valer-se de recursos financeiros públicos para promover campanha de convencimento que se reduza à repetição de ideias, teses e juízos que não são de consenso universal.”
Para Raquel, a comunicação pública deve ter caráter estratégico não apenas para os governos, mas, e sobretudo, para a cidadania.
“O dever de transparência abrange, inclusive, o dever de clareza quanto a posições de governo expressas em propagandas denominadas institucionais”, sustenta a procuradora.
Do ponto de vista constitucional, a procuradora-geral argumenta que a Constituição atribui à publicidade dos órgãos públicos um caráter educativo ou de orientação social e veda a promoção pessoal de autoridades públicas.
“A publicidade em favor de uma medida notoriamente controvertida é substancialmente distinta de uma publicidade em favor da conscientização da população sobre a necessidade de cuidados, por exemplo, para evitar a proliferação do mosquito da dengue”, compara.
“Neste caso, há consenso em que a saúde pública se beneficia das medidas propugnadas. No caso da reforma da previdência, esse consenso não existe – por isso mesmo não se pode verter recursos públicos exclusivamente para favorecer um dos polos da controvérsia.”
Ao pedir liminar para suspender a eficácia da norma quanto à destinação da verba, Raquel Dodge assinala serem irreparáveis, ou de difícil reparação, tanto o dano gerado aos cidadãos brasileiros submetidos à campanha governamental, ‘com fim de mero convencimento sobre a necessidade de nova reforma na previdência’, quanto as verbas públicas despendidas com essa forma de propaganda.
Argumentando que o uso de dinheiro público para financiamento de publicidade institucional que extrapole os limites traçados pelo artigo 37, parágrafo 1.º, da Constituição, afronta os princípios democrático e republicano (artigo 1.º, caput e parágrafo único), o direito fundamental à informação (artigo 5.º, inciso XXXIII), a publicidade, a imparcialidade, a moralidade e a finalidade dos atos administrativos (artigo 37, caput), a procuradora pede que o STF fixe interpretação conforme a Constituição para a dotação destinada à comunicação institucional, assentando sua inconstitucionalidade.
COM A PALAVRA, O GOVERNO
A reportagem fez contato com a Advocacia-Geral da União. O espaço está aberto para manifestação.