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O advogado Ramón Fonseca Mora, sócio da Mossack Fonseca, empresa panamenha especializada na montagem de offshores em paraísos fiscais |
NAIEF HADDAD - Folha de São Paulo
O título pode soar pretensioso: Secrecy World: Inside the Panama Papers Investigation of Illicit Money Networks and the Global Elite (O Mundo do Sigilo: Os Panama Papers e a Investigação das Redes Financeiras Ilícitas da Elite Mundial).
Mas a verdade é que o livro recém-lançado nos EUA, ainda sem uma edição brasileira, entrega mesmo o que o longo enunciado promete.
O norte-americano Jake Bernstein, colaborador de publicações como Washington Post e The New York Times, dá uma aula de jornalismo em duas partes.
A primeira é o mote em si, a saga que envolveu persistência, curiosidade, cruzamento de dados, capacidade de hierarquizar informações. Em uma palavra, reportagem.
Como conta Bernstein, a Alemanha foi o ponto de partida dos Panama Papers. Uma fonte entregou ao jornal de Munique Süddeutsche Zeitung um banco de dados com mais de 11 milhões de documentos da Mossack Fonseca, empresa panamenha especializada na montagem de offshores em paraísos fiscais.
(Aqui valem parênteses: embora moralmente questionável, a abertura de offshores não está associada necessariamente a atos ilícitos. No entanto, a empresa se valia desse artifício para receber fortunas de clientes acusados de evasão fiscal e lavagem de dinheiro obtido com tráfico de drogas e armas, entre outros crimes.)
Para esmiuçar a enorme quantia de dados da Mossfon, como o escritório é conhecido, o diário alemão se uniu ao Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), de Washington (EUA).
Ao longo de seis meses, entre 2015 e 2016, mais de 370 repórteres de 109 Redações em 76 países, sob a coordenação da ICIJ, dedicaram-se aos arquivos da Mossfon.
No Brasil, a investigação foi conduzida por UOL (empresa do Grupo Folha, que edita a Folha), O Estado de S. Paulo e Rede TV!.
Batizada de Panama Papers, a série de reportagens começou a ser publicada em 4 de abril de 2016. Um dia depois, o megavazamento provocou a renúncia do primeiro-ministro da Islândia, Sigmundur Gunnlaugsson.
Nas semanas seguintes, as revelações puseram em crise os governos do Reino Unido, do primeiro-ministro David Cameron, e da Argentina, do presidente Mauricio Macri, entre outros países.
No caso do Brasil, a Mossfon tinha executivos envolvidos no escândalo da Petrobras entre os seus clientes que abriram offshores.
De certo modo, um episódio em São Paulo serviu como prévia do terremoto que atingiu a elite da política e das finanças mundo afora.
Dois meses antes da divulgação dos Panama Papers, quatro funcionários do escritório paulistano da Mossfon foram alvos de mandado de prisão como parte da Operação Lava Jato.
COMO CONTAR
Os Panama Papers, que renderam um prêmio Pulitzer à equipe, mostram como grandes reportagens podem nascer a partir de consórcios globais voltados ao jornalismo de dados.
Trazer essa história à tona por meio de fontes confiáveis é a primeira parte da aula de jornalismo de Bernstein.
A segunda é que não basta ter o que contar ao leitor, é preciso saber como contar.
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O advogado Jürgen Mossack, cofundador do escritório panamenho Mossack Fonseca |
Antes de entrar no escândalo propriamente, o autor retrata com precisão os sócios-fundadores da empresa.
Inicialmente, o advogado alemão Jürgen Mossack, cujo pai cultivava extrema lealdade a Hitler. Depois, o panamenho Ramón Fonseca Mora, ex-líder estudantil que, além da formação em direito, tornou-se escritor premiado.
Não há acúmulo de detalhes para ornamentar a narrativa. Claro e elegante, o texto flui em ritmo de thriller.
SECRECY WORLD
QUANTO: R$ 47,90 (E-BOOK)
AUTOR: JAKE BERNSTEIN
EDITORA: HENRY HOLT (352 PÁGS.)
QUANTO: R$ 47,90 (E-BOOK)
AUTOR: JAKE BERNSTEIN
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Diretor de 'traffic' deve filmar caso
Vencedor do Oscar de melhor diretor por "Traffic" (2000), Steven Soderbergh planeja produzir e talvez dirigir um filme sobre o escândalo dos "Panama Papers". O cineasta norte-americano tomará como base o livro "Secrecy World", do jornalista Jake Bernstein.
O roteiro deve ficar a cargo de Scott Z. Burns, que já trabalhou com Soderbergh em produções como "Contágio" (2011) e "Terapia de Risco" (2013). O elenco ainda não foi definido