Luciana Rodrigues - O Globo
Chama atenção que num país com 12,7 milhões de desempregados o consumo tenha sido o principal componente a explicar a alta do PIB. Do crescimento de 0,1% registrado frente ao segundo trimestre do ano passado, os gastos das famílias responderam por 0,8 ponto percentual (outros setores tiveram contribuição negativa, como a variação de estoques). Foi a maior contribuição para o crescimento, superando até mesmo o 0,6 ponto percentual das exportações.
A liberação de R$ 44 bilhões das contas inativas do FGTS é só uma pequena parte da explicação. Inflação baixa - e com preços de alimentos em queda - juros esbarrando nas mínimas históricas do país e o fim de um ciclo nos quais as famílias, a duras penas, reduziram drasticamente suas dívidas (processo que os economistas chamam de "desalavancagem") permitiram a volta às compras.
Em meio a notícias ruins na política, na segurança pública e mesmo na economia, a sensação de bem estar dos brasileiros está muito longe de ter voltado ao patamar pré-recessão. Mas, com algum alívio na renda, as famílias voltaram a consumir porque, em alguns casos, não dá mais para cortar: se o fogão de casa pifou, é preciso comprar um novo; se a sandália de ir à escola arrebentou, os pais têm que substituí-la. E, com metade dos brasileiros ganhando menos que um mínimo, como mostrou pesquisa recente do IBGE, uma queda de 5% nos preços dos alimentos (em 12 meses até outubro) faz toda a diferença para fazer sobrar um pouquinho de salário no fim do mês.
A recuperação do consumo - foram três trimestres seguidos de alta - coincide com o fim da recessão brasileira. Se isso representa um refresco para as famílias, traz por outro lado perspectiva pouco auspiciosa para o fôlego da economia. Se depender do consumo, diante da expansão ainda muito incipiente e pouco disseminada dos investimentos, o Brasil poderá repetir a fórmula das "retomadas-pós-recessão" anteriores. Cresce, porém não engata uma trajetória sustentada e duradoura de desenvolvimento econômico.