O documento da PGR revela erro e omissões do banco que levaram à retomada do caso. Acima, depoimento em que o ex-senador Delcídio do Amaral trata da conta (//Reprodução)
O retorno da PGR ao caso deve-se a omissões por parte do BSI — como a falta de esclarecimento sobre se empresas e parentes de Romário tinham relações com o banco — e a um erro. Os procuradores perceberam que a instituição suíça, ao informar que a conta não existia, citou um código diferente. A conta secreta era identificada pela seguinte sequência de números e letras: CH58 0848 6000 C032 245AA. O banco, em sua resposta aos procuradores, acrescentou uma inexplicável letra F ao código. Ao retomar o caso, o procurador Vladimir Aras pediu ao BSI a quebra do sigilo bancário da conta certa — sem o tal F. As hipóteses: ou o BSI se enganou ao escrever, ou, ao declarar a inexistência da conta, acrescentou uma letra, discretamente, para não incorrer numa mentira — uma falta grave no caso de um banco.
A delação de Delcídio é mais elucidativa. Já se sabia que o ex-senador comentara, num encontro que acabou sendo gravado, que a conta secreta de Romário de fato existia. Mas em uma oitiva realizada em abril de 2016, na sede da PGR em São Paulo, à qual VEJA teve acesso, Delcídio mostra intimidade com o assunto. Declara que “obteve informações do sistema financeiro, de fontes bastante confiáveis, de que esta conta realmente existia”. E vai além: diz que os 2,1 milhões de francos suíços foram transferidos para duas contas offshore. Uma parcela, de 900 000, foi para uma conta em Abu Dhabi, em nome da empresa Indian Inorganic. A outra, de 1,2 milhão, foi para a empresa Ipaid International, nas Ilhas Virgens Britânicas. Somam exatos 2,1 milhões de francos suíços. Em seguida, o ex-senador comenta, a título de coincidência, que uma reunião marcada com Romário teve de ser cancelada porque o ex-jogador viajara para Abu Dhabi.
O próprio Delcídio antecipa no depoimento que a movimentação financeira do ex-jogador no exterior dificilmente será comprovada. Ele diz que as quantias enviadas a paraísos fiscais não serão “declaradas pelos bancos envolvidos e pelos mecanismos de transferência”. Quanto ao BSI, relata que “ouviu que a referida instituição financeira não seguia as normas estabelecidas” pelos órgãos internacionais — “normas estas absolutamente rigorosas sobre transparência e compliance dos bancos”.
Desde que o caso veio a público, Romário tem dado respostas variadas sobre a história. Quando VEJA divulgou inicialmente a existência da conta secreta, em 2015, ele escreveu em rede social: “Essa conta, se existe, são de recursos de quando joguei lá fora. Não é ilegal”. E ainda: “É possível que tenha sobrado algum rendimento. Honesto e suado”. Depois de voltar da viagem à Suíça, postou de novo nas redes: “Fui à Suíça e o banco admitiu que nunca tive vínculo com eles”. Após a divulgação da gravação do encontro de Delcídio, em que a existência da conta é confirmada, Romário disse ao jornal O Globo que teve, sim, uma conta no banco, mas que não sabia de seu paradeiro: “Se não movimenta, acho que fecha automaticamente”. Procurado por VEJA, o senador pediu um tempo para responder, mas não se manifestou até o fechamento desta edição.