quarta-feira, 8 de novembro de 2017

"Recuperação para valer", editorial do Estadão

Aumentar a chance de sobrevivência de empresas em dificuldades é o grande objetivo do governo, com seu projeto de reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência, aprovada em 2005. Se der certo, a mudança evitará o desperdício de enorme volume de recursos, protegerá empregos e fortalecerá a economia, tornando-a mais eficiente e favorecendo o crescimento. Como na medicina, a ideia é tornar a terapia mais eficiente, com maior expectativa de cura, tratamento menos demorado e menores efeitos colaterais. As novas normas poderão encurtar o processo de dez anos para quatro, em média, disse o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, num evento em São Paulo. “A ideia é ter um processo eficiente, equilibrado e com valor para a economia brasileira”, resumiu o ministro, segundo noticiou a Agência Estado. O projeto foi discutido com especialistas de vários setores durante um semestre e a intenção indicada pelo governo é enviá-lo ao Congresso em poucos dias.
Pormenores da reforma têm sido anunciados e explicados pelo ministro e por membros da equipe nos últimos dias. A lei atual, aprovada há 12 anos, proporcionou avanços importantes em relação ao regime anterior, criando melhores condições para a reabilitação de empresas. Uma das ambições do governo, com a nova mudança, é aumentar de 23% para algo entre 60% e 70%, como em economias avançadas, a taxa média de reabilitação das empresas forçadas à renegociação de compromissos.
A nova terapia deverá incluir facilidades para as companhias submetidas a tratamento e condições de segurança para quem as auxiliar nessa fase. O projeto, segundo informação adiantada pelo Ministério da Fazenda, deverá prever tratamento diferenciado para quem proporcionar financiamento à empresa nessa fase. Esse financiador terá preferência no ressarcimento, sem se submeter à fila de credores. Hoje a preferência só vigora se a companhia devedora for à falência. O objetivo do governo, ao propor essa vantagem a quem participar do socorro, é obviamente reduzir o risco de liquidação definitiva.
Também o setor público deverá envolver-se na ajuda às empresas em recuperação judicial. Os prazos para quitar débitos tributários deverão ser ampliados. O número de parcelas poderá, segundo as condições de renegociação, passar de 84 para 120, ou até 144 no caso das micro e pequenas empresas. Além disso, será possível quitar o débito com prejuízo fiscal assinalado no Imposto de Renda ou com base negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. As facilidades deverão envolver os Tesouros da União, dos Estados e dos municípios. Mas o descumprimento do acordo pela empresa beneficiária poderá resultar em pedido de falência,
Como contrapartida às facilidades, haverá exigências de disciplina, ficando proibida a distribuição de lucros e dividendos durante a recuperação, informou o ministro.
Atenção especial, segundo Meirelles, foi dada às micro, pequenas e médias empresas, em mais um esforço de modernização das normas. O pequeno empresário, observou Meirelles, é um componente cada vez mais importante do sistema econômico e a multiplicação de startups em todo o mundo, acrescentou, é mais uma comprovação dessa tendência.
O projeto de reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência é mais um componente de um programa, em execução desde o ano passado, de aumento de eficiência da economia brasileira. O programa compreende, entre outros itens, a já aprovada modernização das leis trabalhistas, a alteração de regras de exploração de reservas de petróleo e gás, a simplificação do sistema tributário, a eliminação de complicações burocráticas e novos critérios de concessão na área de infraestrutura.
O conserto das contas públicas, incluída a reforma da Previdência, encaixa-se claramente em qualquer programa sério de aumento de eficiência e de poder de competição. Sem esforços desse tipo é inútil falar sobre criação de empregos e melhora das condições de vida. Não se criam oportunidades com palavrório irrealista.