O peso da Previdência nas despesas públicas — representa quase a metade delas — e seu papel decisivo na crise fiscal levam a que o debate sobre sua reforma ocupe a atenção dentro e fora do Congresso. Mas não é apenas a Previdência que contribui para características brasileiras negativas: injustiças sociais e, em especial, desníveis de renda.
A responsabilidade do sistema previdenciário nas mazelas do país é enorme, tanto que o grupo dos servidores aposentados está na privilegiada fatia dos 2% mais ricos da população.
Não é, porém, apenas a seguridade social que opera em favor de segmentos de privilegiados na sociedade, a serviço dos quais grupos de pressão se movem dentro do aparelho de Estado, com ramificações espalhadas no Executivo, Legislativo e Judiciário.
Divulgado há pouco, estudo do Banco Mundial (Bird) encomendado pelo governo brasileiro ainda com Dilma no Planalto, para avaliar a qualidade das despesas públicas, tem o mérito, entre outros, de destacar distorções semelhantes às da Previdência existentes no ensino superior gratuito. O problema é que, segundo o trabalho do Bird, 65% dos alunos de faculdades públicas estão na faixa dos 40% mais ricos da população, e apenas 20% dos estudantes nesses estabelecimentos encontram-se no grupo dos 40% mais pobres.
Deve-se reconhecer que se reproduz aqui o mesmo mecanismo de transferência de renda dos pobres para os ricos que existe na Previdência. O Tesouro (federal ou estadual) arrecada impostos de toda a população, inclusive nas famílias de renda mais baixa, e, quando transfere recursos para cobrir déficits na Previdência e pagar os custos nas universidades públicas, são beneficiados os mais ricos — aposentados e alunos. Os números são irrefutáveis. Não devem espantar os desastrosos índices históricos brasileiros de distribuição de renda.
Sem discutir aspectos do Fies e do Prouni — crédito estudantil e bolsas para faculdades privadas —, eles são instrumentos cabíveis para facilitar o acesso do estudante de baixa renda ao ensino superior. Mas é fato que, se alunos de renda alta pagassem para estudar em faculdades públicas, os orçamentos das escolas melhorariam e seria possível conceder bolsas integrais a quem de fato necessita. O aspecto social das políticas para o ensino superior ganharia relevância.
Um lado perverso de mais esta usina de desigualdades é que a qualidade do ensino na universidade pública, com exceções, supera a de escolas privadas. E é nestas que os estudantes de renda mais baixa conseguem se matricular, com sacrifícios. Para a faculdade pública vão os de renda alta, egressos de escolas privadas. Formam-se, ocupam os postos de melhores salários no mercado de trabalho e, assim, fecha-se o circuito da manutenção das desigualdades sociais.