A proposta de privatização da Eletrobras, enviada pelo Ministério de Minas e Energia ao presidente da estatal, Wilson Ferreira Junior, estima que para a União passe a deter menos de 50% do capital votante da empresa, seria necessária uma emissão primária de cerca de 553.036.344 novas ações ordinárias. Considerando o valor por ação de R$ 20,25, registrado no dia 13 de novembro, e que a operação se restringiria apenas a deixar a União com menos de 50% do capital votante, haveria ingresso de R$ 11,2 bilhões na companhia.
Segundo a proposta, parte do valor captado pela empresa com a emissão seria utilizado para pagar à União pelas novas outorgas. O governo ressalta, no entanto, que o tamanho da emissão pode ir além do montante necessário para reduzir a participação da União no capital votante a menos de 50% e dependerá das necessidades da companhia, definidas por estudos que ainda serão contratados.
O documento explica que caso não houvesse a emissão primária, a fim de tornar a Eletrobras privada, a União teria que vender ações. “Seria necessário, portanto, negociar o equivalente a 25,4% das ações ordinárias da empresa, ou seja, cerca de R$ 5,6 bilhões, se considerado o valor da ação em 13 de novembro, e esses recursos seriam pagos pelo comprador das ações à União, e não à Eletrobras”, diz.
Após a venda, no entanto, a empresa ainda teria que pagar à União pelas novas outorgas. “A empresa poderia, por exemplo, efetuar esse pagamento por meio de recursos de seu caixa ou tomados por empréstimo. Contudo, são opções inviáveis porque a empresa não possui caixa para tanto, nem tampouco condições de se endividar… Mesmo que tivesse condições de endividamento, poderia ser comprometida a capacidade da empresa de fazer investimentos em novos projetos, o que não é desejável já que um dos motivos da desestatização é recuperar a capacidade de a empresa fazer novos investimentos”, diz o documento.
RBSE
A proposta traz ainda que a celebração de termo aditivo aos contratos de concessão de transmissão de energia elétrica, com vistas a repactuar o pagamento da RBSE, tem o objetivo de reduzir as tarifas de transmissão de energia elétrica e atua como contrapartida às novas condições de comercialização de energia elétrica em regime de produção independente, além de mitigar os riscos judiciais que envolvem seu recebimento.
Voto
Sobre a corporação, a proposta destaca que o limite de 10% para o poder de voto dos acionistas da empresa. Essa exigência, segundo o governo, visa a transformar a empresa em uma corporação de fato, democratizando seu controle, ainda que a União possa permanecer com quantidade relevante das ações. “Nesse sentido, ressalta-se que as quatro maiores empresas de eletricidade do mundo possuem capital pulverizado: Duke, Engie, National Grid e NextEra. A Eletrobras deve seguir exemplos compatíveis com a sua grandeza potencial, mirando a futura internacionalização da empresa”, diz o documento.
A pulverização com limitação do poder de voto, acrescenta, garante que as decisões da companhia serão democráticas e voltadas à sustentabilidade da empresa. “É fato que esse modelo com limitação e voto afasta o interesse de outras companhias já estabelecidas no setor, pois inibe estratégias de combinação de negócios. Mas isso é proposital, pois evita concentração do mercado e garante que a nova Eletrobras será um agente promotor da competição, com identidade preservada”, diz o documento.
Aumento de capital
A desestatização da Eletrobras ocorrerá por meio de aumento de capital mediante subscrição pública de ações ordinárias, sendo vedado à União, direta ou indiretamente, subscrever novas ações decorrentes da operação, informou o MME, em carta ao presidente da estatal. No documento, o ministério cita ainda que, caso seja necessário, recomenda que o aumento de capital poderá ser acompanhado de oferta pública secundária de ações de propriedade da União ou de empresa por ela controlada, direta ou indiretamente.
Em extenso documento sobre o processo, o MME traz informações sobre o Setor Elétrico Brasileiro (SEB); um histórico da estatal e um diagnóstico de sua condição no passado recente; a Consulta Pública Nº 33/2017, que trata da iniciativa da pasta para reformar e atualizar a legislação que rege o SEB com transparência e efetiva participação da sociedade; a proposta de desestatização da Eletrobras; e os benefícios esperados em decorrência da desestatização da estatal.
Segundo o documento, a Eletrobras tem passado por situações não condizentes com a sua importância e porte, como a suspensão em meio do ano passado da negociação das ações na Bolsa de Nova York por não ter apresentado seus balanços de 2014 e 2015.
O MME cita ainda que a empresa apresenta custos elevados em seus investimentos, com sobrecusto estimado em R$ 24 bilhões, incompatíveis com seus pares privados. Outro ponto citado é a baixa produtividade do gasto em pessoal em comparação com empresas privadas do Setor. O ministério cita dados do balanço, destacando que cada R$ 1 gasto com pessoal na Eletrobras gera um terço da receita de R$ 1 gasto na Engie e metade da receita de R$ 1
gasto na Neoenergia, por exemplo.
O endividamento também é citado. Segundo o MME, no final do 1º trimestre de 2016, a relação Dívida líquida/Ebitda, indicador da saúde financeira de uma companhia, chegou a 9,8, nível que indica risco à capacidade da empresa de honrar seus compromissos e dificuldade de acesso a crédito junto a instituições financeiras.
A pasta lembra que entre 2012 e 2015, acumulou prejuízos que somam R$ 30,7 bilhões, sendo que a média de lucros, no mesmo período, de três empresas privadas do setor elétrico com ações negociadas em Bolsa (CPFL, Engie e Enel). Outro destaque é a demanda da empresa por recursos públicos para honrar obrigações financeiras. Em 2016, a empresa recebeu, a título de adiantamento para futuro aumento de capital, R$ 3 bilhões da União.
O ministério cita avanços feitos pela empresa, mas diz que as ações são insuficientes para garantir a sua sustentabilidade econômico-financeira. “Dado o aumento de carga previsto no PDE 2026, é importante que o setor elétrico brasileiro tenha empresas robustas e preparadas para garantir a expansão da oferta de energia elétrica brasileira de forma sustentável aos menores preços possíveis”, diz o documento.
Desafios
O governo cita ainda desafios para a Eletrobras, com o necessário saneamento das suas distribuidoras de energia elétrica, para que possam ser privatizadas. “A Eletrobras terá que realizar ajustes em tais empresas, mediante conversão de dívida em capital social ou assunção de dívidas, que somam R$ 11,2 bilhões”, diz.
As perdas na Eletronuclear, decorrentes da construção da Usina Termonuclear Angra 3, que já tornaram o patrimônio líquido da Eletronuclear negativo em R$ 4,5 bilhões (dado de 31 de dezembro de 2016) também é citado, assim como as dívidas das distribuidoras da Eletrobras com a Petrobras, oriundas das compras de Combustível. O MME lembra que a estatal firmou contratos de confissão de dívida – CCD com a Petrobras no valor de R$ 10,5 bilhões (que hoje somam R$ 15,8 bilhões) e que cujo reconhecimento para fins de reembolso da CCC está sendo contestado pela Aneel.
Proposta
Segundo o documento, a proposta de desestatização da Eletrobras reflete o reconhecimento de que o Estado brasileiro priorizará gastos em áreas nas quais o mercado falha em atuar ou atua de forma diversa àquela desejada.
Segundo o governo, a exigência da comercialização da energia elétrica em regime de produção independente permite desmontar, ainda que parcialmente, o regime de produção de energia elétrica em cotas no qual o risco hidrológico é alocado ao consumidor, que não tem condições de gerilo; a destinação de recursos com o novo contrato de concessão no regime de produção independente permite que se reduza o custeio pelo setor elétrico de subsídios; e a obrigação de investir na revitalização da Bacia do São Francisco aborda um problema crítico por que passa o Rio São Francisco e que afeta a geração de energia elétrica, além de outros usos prioritários, como dessedentação.
Está previsto na proposta, a permissão para que a União oferte novos contratos de concessão para usinas hidrelétricas alcançadas pelo regime de cotas e celebração de termo aditivo aos contratos de concessão de transmissão de energia elétrica, com vistas a repactuar o pagamento de valores atrasados relacionados a alguns ativos não amortizados ou não indenizados.
Outro item previsto é a alteração do estatuto social com vistas a criar ação preferencial de classe especial de propriedade exclusiva da União, limitar o poder de voto dos acionistas e assegurar à União o direito de indicar o Presidente do Conselho de Administração.
Também faz parte da proposta a reestruturação societária para manter sob controle, direto ou indireto, da União as empresas Eletrobrás Termonuclear S.A. – Eletronuclear e Itaipu Binacional; e desenvolvimento, direta ou indiretamente, por meio de sua subsidiária Companhia Hidro Elétrica do São Francisco- CHESF, de programa de revitalização dos recursos hídricos da bacia do rio São Francisco.
Entre as condicionantes para a desestatização da Eletrobras, o governo cita ainda a “a comercialização de energia elétrica em regime de produção independente”. “A aplicação desse condicionante significará que as controladas da Eletrobras, detentoras de concessão de usinas hidrelétricas alcançadas pelo regime de cotas, aceitem modificações nas regras contratuais dessas concessões para a comercialização da energia elétrica gerada por tais empreendimentos”, diz.
Pela proposta, as empresas controladas pela Eletrobras deixariam de comercializar a energia elétrica gerada pelas usinas alcançadas pela Lei nº 12.783/2013, com as distribuidoras de energia elétrica a um preço fixado pela Aneel para negociá-la livremente no mercado regulado ou no mercado livre. “Portanto, as empresas passariam a assumir riscos, tais como o risco hidrológico”, diz o texto.