sexta-feira, 5 de maio de 2017

Ruy Castro: "Aquele dia"

Reprodução
Texto: O compositor Noel Rosa (1910-1937).Foto: Reprodução
O músico Noel Rosa (1910-1937)


No dia de ontem, 4 de maio, só que de 1967, publiquei minha primeira reportagem assinada na grande imprensa. E logo onde: no "Correio da Manhã", ainda o jornal mais influente do país e o que mais irritava os militares. Era um texto sobre os 30 anos da morte de Noel Rosa, que se comemoravam naquele dia. Para fazê-lo, eu ouvira a cantora favorita do sambista, Aracy de Almeida, seu antigo parceiro Ismael Silva e seu amigo e biógrafo Almirante.

Dois meses antes, eu fora levado por José Lino Grünewald, editor do "2º Caderno" e editorialista, a Newton Rodrigues, redator-chefe do jornal. 

Newton disse que José Lino me tinha em alta conta, admitiu-me como repórter e não falou em salário. Tudo bem. Para trabalhar no "Correio da Manhã", o jornal que meu avô lera desde a sua fundação, em 1901, eu seria capaz até de pagar —se, aos 19 anos, levasse no bolso mais do que o dinheiro da condução.

O artigo sobre Noel era o primeiro no "2º Caderno", depois de várias saídas à rua como repórter da "geral", incluindo a cobertura de tremendas passeatas contra a ditadura, enfrentando gases e bombas. 

Era excitante, mas o que eu queria mesmo era a área cultural.

Naquela noite, haveria a abertura de uma exposição sobre Noel no Museu da Imagem e do Som. Fui até lá e vi, surpreso, minha reportagem de primeira página colada num tabique. Ouvi uma voz. Era Ricardo Cravo Albin, presidente do museu: "Você é que é o Ruy Castro? Não sabia que era tão jovem! Venha cá, quero te apresentar a algumas pessoas".

Levou-me à sala ao lado onde um grupo de senhores conversava. Eles eram Pixinguinha, Donga, João da Baiana, João de Barro (Braguinha), Paulo Tapajós, Jacob do Bandolim e o próprio Almirante. Em um minuto, apertei a mão da história. Foi há 50 anos. E, até hoje, nada superou aquele dia.