Henrique Gomes Batista - O Globo
WASHINGTON — O caucus (reunião de eleitores) de Iowa, nesta segunda-feira, e as primárias de New Hampshire, dia 9, serão fundamentais para que os pré-candidatos dos partidos Democrata e Republicano consigam não apenas os votos necessários para embalar seu apoio popular, mas principalmente atrair os doadores. Como, pela primeira vez na História, a campanha presidencial de cada partido custará mais de US$ 1 bilhão (R$ 4,022 bilhões, ou seja, o valor dos dois partidos equivale ao total da construção da Linha 4 do Metrô do Rio), a importância dos recursos cresce. E a influência dos doadores é parte central da campanha para a escolha do sucessor de Barack Obama em novembro.
— Iowa e New Hampshire são importantes por indicar um caminho para as eleições. Mais que pelo seu peso eleitoral, pois são estados pequenos, os seus resultados mudam a dinâmica das eleições e de seus doadores — afirma Henry Olsen, pesquisador do Centro de Ética e Políticas Públicas (EPPC, na sigla em inglês), de Washington.
PACS E SUPER PACS DESEQUILIBRAM
Nos EUA, toda a campanha é paga com doações, não há sequer horário eleitoral gratuito. A Comissão Eleitoral Federal (FEC, na sigla em inglês) limita a doação de pessoas físicas a US$ 2.700 para cada candidato e uma somatória de US$ 100,2 mil a todos os candidatos, comitês e partidos. Partidos e candidatos sabem disso e viralizam e-mails pedindo recursos. Mas o que tem desequilibrado, de fato, são os grupos organizados e comitês de ação política (chamados de PACs e Super PACs), que reúnem diretamente segmentos da sociedade civil e que desde 2010, após uma decisão da Suprema Corte, não contam com limites para doações.
Isso gera distorções. Até o momento, as doações diretas aos candidatos chegam a US$ 164,3 milhões, enquanto os PACs e SuperPACs da eleição presidencial já somam US$ 353,3 milhões, segundo o site OpenSecrets.org, mantido pela organização não governamental The Center for Responsive Politics. Segundo o grupo, 81% das propagandas eleitorais de TV até o momento foram pagas pelos PACs, que podem se organizar contra candidatos.
Esses valores devem crescer. A rede de doadores dos irmãos Charles e David Koch, empresários do setor petroquímico, promete doar US$ 889 milhões a candidatos conservadores em todo os país. Segundo o site Politico, para fazer parte desse grupo de doadores é necessário doar ao menos US$ 100 mil e ser de direita. O grupo, que por si só tem um orçamento equiparável a uma eleição presidencial, é acusado de ter um peso muito grande sobre políticos, inclusive no Congresso, influenciando desproporcionalmente decisões públicas no país. No lado republicano, o ex-governador Jeb Bush era o preferido dos grandes doadores, mas devido a baixo desempenho nas pesquisas, eles migraram para o senador Marco Rubio, que tenta fazer frente aos líderes Donald Trump e o senador Ted Cruz, considerados, respectivamente, imprevisível e muito à direita.
Allan Lichtman, professor da American University, que estima um custo superior a US$ 1 bilhão por campanha presidencial, diz que a força do dinheiro nas eleições preocupa:
— O financiamento é a maior ameaça à democracia nos EUA. Em qualquer campanha para vereador é necessário gastar mais de US$ 100 mil e isso deixa a maioria dos americanos fora do jogo político.
AGENDA ACIRRADA NO ÚLTIMO DIA DE CAMPANHA
O último domingo antes do início do processo de escolha dos candidatos pelos partidos nas eleições americanas foi de intensa campanha. No lado democrata, a candidata Hillary Clinton, que aparece um pouco à frente do senador socialista Bernie Sanders, aproveitou e usou toda sua família na disputa. Já no lado republicano, todo esforço era para tentar retirar a liderança do bilionário Donald Trump.
As últimas pesquisas publicadas em Iowa indicavam uma vitória de Trump com 28 pontos, apenas cinco pontos sobre o senador Ted Cruz, que por sua vez tinha oito pontos de vantagem sobre o senador Marco Rubio. No lado democrata, Hillary Clinton tinha apenas três pontos de vantagem sobre Sanders. Para analistas, essas pequenas diferenças mostram que o resultado estava aberto para esta primeira escolha dos candidatos que vão concorrer à Casa Branca em novembro.
Além de convencer os eleitores a apoiá-los, o último dia de campanha foi marcado pelos pré-candidatos tentando fazer com que as pessoas realmente participem hoje do caucus. Para muitos, esta é a principal fraqueza de Trump: seu apoio está mais concentrado em pessoas que normalmente não participam das primárias. Cruz, por outro lado, conta com um forte apoio que recebe da comunidade religiosa para virar o resultado final no estado.
Do lado democrata, embora Sanders tenha mais apelo entre jovens, historicamente mais ausentes das disputas eleitorais, a força da sua campanha pode fazer com que ocorra uma participação maior que é usual neste caucus. Para fazer uma forte ofensiva, o ex-presidente Bill Clinton foi muito ativo ao lado da democrata Hillary em Iowa. Os resultados deverão ser conhecidos ainda na noite de hoje.
Pelo fato de ser o primeiro estado que realizar as primárias, Iowa tem uma atenção muito maior do que o merecido para o estado, de apenas três milhões de habitantes. De acordo com contagem do “The New York Times”, todos os candidatos realizaram mais de 1.500 comícios no estado e fizeram cerca de 60 mil comerciais de TV pela região. Críticos afirmam que a atenção é desmedida porque, segundo eles, o estado não reflete a atual realidade americana: a maioria (97%) da população de Iowa é branca e o resultado não tem relação com as mudanças populacionais do país.