A história do Vice-Almirante (Engenheiro Naval) Othon Luiz Pinheiro da Silva, presidente da Eletronuclear, preso na Operação Lava-Jato acusado de corrupção, é a história de um projeto grandioso de tentativa de domínio por parte da Marinha brasileira do ciclo nuclear que acabou se transformando em um projeto de poder político e econômico de um governo megalomaníaco, que mistura o público com o privado com a facilidade populista com que manipula os símbolos do país, seja a Petrobras ou o programa nuclear.
O vice-almirante Othon, muito justamente considerado "o pai do programa nuclear brasileiro", acabou ganhando um poder político que o fez poder escolher o comandante da Marinha e os dirigentes do programa nuclear e, segundo as acusações do Ministério Público, ganhar muito dinheiro através de uma empresa de consultoria que funcionava ao mesmo tempo em que ele comandava a Eletronuclear, que coordena as centrais nucleares brasileiras.
No comando da empresa desde 2005, teve que se licenciar em abril deste ano devido a denúncias de irregularidades em contratos firmados na construção da usina de Angra 3. Agora a empresa de consultoria está sendo investigada por ter recebido "pagamentos vultosos" de outras companhias que compõem o consórcio que atua nas obras de Angra 3.
Mesmo os companheiros de farda que se recusam a acreditar que o almirante Othon tenha cometido crimes se sentem incomodados, não apenas com o conflito de interesses claro, como também com o fato de sua empresa se chamar Aratec Engenharia, uma clara alusão ao complexo de Aramar, onde o país desenvolve o altamente secreto projeto de centrífugas nucleares implementado pelo próprio Almirante.
Ele já havia tido problemas na administração de verbas públicas durante o governo Itamar Franco, quando o ministro da Marinha Ivan de Silveira Serpa considerou que tinha muita liberdade de gastos no projeto nuclear e exigiu uma prestação de contas, que acabou não sendo aprovada.
Não chegou a haver acusações contra o almirante Othon, mas a seus métodos de trabalho, que não mediam gastos para seus homens, e em 1994, aproveitando que completava seu tempo de serviço militar ativo, deixou o programa, sendo reconhecido por todos como o grande responsável pelo projeto das centrífugas nucleares que deram ao Brasil a capacidade de enriquecer o urânio.
O seu retorno deu-se em grande estilo, quando foi convidado pelo presidente Lula em 2005 para presidir a Eletronuclear.
A partir daí, seu poder foi sempre crescente, e é atribuído a ele a ideia da criação do Prosub, uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip) formada pela empresa francesa DCNS e a Odebrecht, com a Marinha brasileira tendo uma “golden share”.
A escolha da empreiteira Odebrecht, foi dito na ocasião, obedeceu a um pedido formal da empresa francesa, o que provocou muita polêmica, pois não houve licitação.
A Odebrecht acabou criando uma subsidiária, a Odebrecht Defesa, que abriga em seus quadros diversos almirantes e oficiais da Marinha da reserva e reformados. Uma “5ª estrela” no linguajar coloquial da Marinha, comparável a postos no exterior onde os oficiais podem guardar dinheiro para a aposentadoria.
O projeto faz parte de um convênio Brasil-França assinado em 2009, e se compõe de projeto e a construção do Submarino com Propulsão Nuclear (SN-BR), a construção de quatro submarinos convencionais; uma Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas (UFEM), e um complexo de Estaleiro e Base Naval (EBN) que se encontra em construção às margens da Baía de Sepetiba, no Município de Itaguaí.
O homem forte do programa nuclear brasileiro é também considerado o responsável pela nomeação do Comandante da Marinha Moura Neto, que ficou no comando durante sete anos, de 2007 a 2014, nos governos Lula e Dilma, e do almirante José Alberto Accioly Fragelli, que exerceu o cargo de coordenador do Programa de Desenvolvimento de Submarino com Propulsão Nuclear.
Moura Neto teria sido escolhido por defender o programa de construção do submarino nuclear, ao contrário de outro também cogitado.
Tudo indica que tamanho poder político e acesso a verbas praticamente sem controle, com força até mesmo para conseguir reverter decisões do Tribunal de Contas da União (TCU), e tantas injunções empresariais, desvirtuaram o sonho do vice-almirante Othon.
Nunca a frase famosa do escritor e pensador inglês do século XVIII Samuel Johnson “o patriotismo é o último refúgio dos canalhas” teve tanto sentido quanto hoje, quando se tenta melar a Operação Lava-Jato acusando seus membros, a começar pelo juiz Sérgio Moro, de estar prejudicando a Pátria quando investigam a roubalheira na Petrobras, ou o pai do programa nuclear brasileiro.