sexta-feira, 31 de julho de 2015

Mais novo delator, Mário Goes diz que esquema de corrupção beneficiava poderosos e o PT

Germano Oliveira, Tiago Dantas, Cleide Carvalho e Thais Skodowski - O Globo

Acordo prevê pagamento de multa de R$ 38 milhões; operador ficará em prisão domiciliar com tornozeleira



O empresário Mário Góes, na sede da Justiça Federal em Curitiba (PR) - Júnior Pinheiro/Folhapress


Mais novo delator da operação Lava-Jato, o operador Mário Goes declarou à Justiça que o esquema de corrupção da Petrobras beneficiaria pessoas poderosas e o PT. Goes fechou o acordo de colaboração com a Justiça no último dia 27 e passou os últimos dois dias prestando depoimentos. Ele se comprometeu a pagar uma multa de R$ 38 milhões e a contar o que sabe sobre transações financeiras irregulares que envolvem o ex-gerente de Serviços da estatal, Pedro Barusco, e 13 empreiteiras.

O juiz Sérgio Moro homologou o acordo de delação na tarde desta quinta-feira. A advogada de Mário Goes, Lívia Novak, afirmou que seu cliente deverá ficar em prisão domiciliar, utilizando uma tornozeleira eletrônica. O operador tem depoimento marcado na 13ª Vara Federal de Curitiba na próxima segunda-feira.

Em um dos depoimentos, prestado nesta quarta-feira, Goes é perguntado por que envolveu o filho, Lucélio Goes, nos negócios irregulares. O operador diz que “nunca imaginou pudesse ocorrer algum problema quanto a essa atividade ligada a Pedro Barusco, uma vez que segundo ele pessoas poderosas e até o partido do próprio governo estaria sendo beneficiado por esse esquema”.

Procurado, o PT informou que todas as “doações feitas ao partidos foram legais e devidamente declaradas”. Antônio Figueiredo Basto, advogado de Barusco, afirmou que o depoimento de Mário Goes, corrobora as informações prestadas por seu cliente durante as investigação da Operação Lava-Jato:

— Tudo que ele citou é mera confirmação do que o Barusco havia dito. Não há nenhuma contradição entre eles.

De acordo com o termo do acordo assinado com a Justiça, Mário Goes se comprometeu a dar detalhes sobre contratos da Petrobras com as seguintes empresas: Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Setal/SOG, OAS, MPE, UTC, Odebrecht, Carioca, Bueno Engenharia, Queiroz Galvão, Iesa, Schain e WTorre.

O CAMINHO DA PROPINA

Em depoimento de delação premiada, Mário Goes disse que os valores de propinas recebidos de empresas com contratos com a Petrobras, por meio do ex-gerente da estatal Pedro Barusco, eram pagos de três formas: por meio de contratos de prestação de serviços com a Riomarine, através de dinheiro vivo recebido no Brasil e por meio de depósitos no exterior junto às contas Maranelle e Phad, abertas no Banco Safra, na Suíça, por Denise Kos, funcionária do banco e de confiança de Barusco.

Ele disse que recebeu dinheiro vivo na sua residência por parte da UTC, entregue pelo empresário Ricardo Pessoa, por "Jaime Careca" (o policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, acusado de ser transportador de dinheiro do doleiro Alberto Youssef) e por Antonio Pedro Campello, da Andrade Gutierrez, que lhe entregou valores. Ele não se lembra o total recebido de Campello, mas disse que nas vezes em que isso acontece recebeu em torno de R$ 100 mil a R$ 200 mil em cada oportunidade.

Goes admitiu ainda ter sido usado para repassar propina referente às obras do consórcio PRA-1, formado pela Odebrecht e UTC, para erguer o prédio da Petrobras em Vitória (ES). Goes disse ter recebido dinheiro vivo de Jayme Careca também nesse caso. Citou ter recebido valores do então agente da PF: uma parte em sua própria casa e duas outras vezes - cerca de R$ 400 mil cada uma - numa sacola entregue em seu escritório na Avenida Rio Branco, no Rio, que ficava quase em frente à sede da UTC. Contou que um dos executivos da UTC, Walmir Pinheiro, era quem lhe avisava sobre a chegada do dinheiro. Disse ainda que Pinheiro também lhe entregou dinheiro, por quatro vezes, em envelopes que ia buscar na sede da empreiteira.

Goes contou que Ricardo Pessoa, dono da UTC, e Pedro Barusco, participaram de jantares em sua casa e, nestas ocasiões, ambos chegavam com malas. O operador disse que, quando estava preso na sede da PF em Curitiba, ao lado de Pessoa, o empresário lhe confirmou que as malas continham dinheiro de propina a ser entregue ao funcionário da Petrobras.

Goes voltou a dizer que a maior parte das propinas ele recebeu em suas contas Maranelle e Phad, na Suíça, mas repetiu que não tem mais os extratos das contas, que "foram destruídos junto com outros documentos por sugestão de Pedro Barusco no ano de 2014". Ele infomou que a conta Phad foi encerrada quando Denise Kos foi trabalhar em outro banco suíço, o Lombard Odier.

— O saldo que havia na Phad foi transferido para as contas de Barusco. Em relação à Maranelle, todos os valores foram transferidos para o Lombard Odier, onde existe um saldo atual em torno de US$ 7 milhões a US$ 8 milhões — disse Goes.

Ele informou ainda que abriu uma terceira conta no Banco Lombard Odier que se chama Mayana, com saldo atual de US$ 1 milhão a US$ 1,5 milhão. Goes se dispôs a devolver esse dinheiro para ajudar a pagar os R$ 38 milhões da multa que terá que pagar no acordo de delação premiada.

BARUSCO E GOES LEVARAM 'CALOTE' EM PROPINAS

Goes contou, em seu depoimento, que no ano de 2006 ele e Barusco levaram um "calote" do dono da Bueno Engenharia, Adroaldo Bueno, que firmou um contrato com a Petrobras para a construção do Gasoduto Cacimbas-Vitória, mesmo sem ter experiência para tocar a obra. Segundo Goes, Barusco lhe disse que a Bueno Engenharia pagaria um total de R$ 3,6 milhões em propinas para ele e que Goes seria procurado pelos donos da empresa para receber os valores devidos.

— Todavia, foram pagas apenas três parcelas em espécie, nos valores de R$ 250 mil, R$ 295 mil e R$ 200 mil, sendo que na última parcela Adroaldo só deu R$ 189 mil. Eu assumi o prejuízo da diferença — disse Goes, acreditando que Barusco tenha "desistido" de cobrar esses valores.

O novo delator da Lava-Jato disse que Barusco lhe informou que a "haveria valores pendentes junto à Construtora Schain" e que ele deveria procurar o executivo da empresa conhecido por Edson Coutinho "para resolver o assunto".

— Alguns pagamentos foram feitos em espécie, mas sempre de forma intercalada e com muita dificuldade. Um desses pagamentos foi feito em seu escritório pelo próprio Edson Coutinho —- disse Goes, informando que um outro pagamento foi feito no apartamento de Coutinho, que desceu à portaria com um envelope contendo em torno de R$ 400 mil.

Goes informou que houve "uma espécie de swape" envolvendo débitos da Schain e MPE, entre Pedro Barusco e o "partido", débito "que teria sido supostamente resolvido por esferas superiores".