Ligada ao presidente do TCU Aroldo Cedraz, a ONG Instituto de Desenvolvimento da Região do Sisal recebeu R$ 3,5 milhões do governo federal por meio de convênios entre 2005 e 2011. Um desses convênios foi suspenso por suspeitas de irregularidades.
A entidade, cuja sede foi construída com recursos de emenda parlamentar apresentada em 2005 por Cedraz, quando ele era deputado federal, foi comandada por seu cunhado Sílvio Roberto Habib entre 2006 e 2008.
Entre 2008 e 2012, Habib deixou a presidência, mas seguiu atuando como gerente-executivo e consultor, com a função de formular projetos de convênios da entidade.
Com sede em Valente, município com cerca de 27 mil habitantes do sertão baiano e terra natal da família Cedraz, a ONG tem como foco fomentar as cadeias produtivas do artesanato com fibra do sisal e a caprinocultura.
Em 2011, porém, firmou contrato de R$ 2,9 milhões com o Ministério do Trabalho com um objetivo bem diferente: treinar trabalhadores do setor do petróleo em três cidades do Ceará.
O ministério afirma que a ONG foi escolhida, mesmo não tendo atuação na área, após uma seleção pública.
Mas apenas a primeira etapa do convênio foi paga, já que o contrato acabou suspenso por inconsistências no desenvolvimento do projeto. Pela primeira etapa, a ONG recebeu R$ 884,7 mil.
Pedro Ladeira - 18.jun.2015/Folhapress | ||
O presidente do TCU, Aroldo Cedraz (esq.), e o presidente do Senado, Renan Calheiros |
Em junho deste ano, a execução da primeira etapa do convênio teve as contas rejeitadas. Na nota técnica, o ministério justifica a decisão alegando que não foi provado o cumprimento da meta de trabalhadores treinados.
O instituto é tido como um dos principais projetos apoiados por Aroldo Cedraz em Valente, cidade onde sua família tem forte inserção política: seu pai foi prefeito por duas vezes e um de seus irmãos é o atual vice-prefeito.
Em 2009, o ministro do TCU participou de um seminário na ONG sobre caprinocultura com a participação de deputados e secretários do governo da Bahia.
Procurado pela Folha, Cedraz informou que "não tem relação com a ONG, nem com a efetivação dos convênios".
A entidade ainda firmou outros seis convênios –um com o Ministério da Agricultura e cinco com o da Ciência e Tecnologia– para desenvolver projetos de artesanato e caprinocultura em Valente. Destes, cinco foram considerados adimplentes e um está com as contas sob análise.
A ONG ainda chegou a ser selecionada pelo Ministério do Trabalho para treinar trabalhadores do setor sucroalcooleiro no interior de São Paulo, num convênio de R$ 2,3 milhões. O contrato, contudo, não chegou a ser executado.
SUSPEITAS
Presidente do TCU desde dezembro de 2014, Aroldo Cedraz será o responsável por conduzir a análise das contas da presidente Dilma Rousseff (PT), que correm risco de rejeição por causa das chamadas "pedaladas fiscais".
O ministro ainda é suspeito de repassar informações sobre processo de interesse da UTC Engenharia, empresa que teria pago propina ao seu filho, o advogado Tiago.
O processo envolvia supostas irregularidades na licitação de uma das unidades da usina Angra 3. Cedraz afirma que se declarou impedido de julgar o caso.
Tiago também nega que tenha recebido informações privilegiadas do pai.
OUTRO LADO
Os gestores que presidiram a ONG IDR-Sisal desde a sua fundação negam irregularidades no cumprimento de convênios e afirmam que o ministro Aroldo Cedraz não beneficiou a entidade.
Primeiro presidente da ONG e cunhado de Cedraz, Sílvio Roberto Habib afirma que os convênios firmados no período em que comandou a entidade tiveram suas contas aprovadas.
Ele informa que deixou a presidência da ONG após lei que impede que convênios federais sejam firmados com entidades dirigidas por parentes de servidores federais, incluindo do TCU.
"Depois disso, atuei no instituto somente como consultor, e sem remuneração", afirma Habib, que também nega participação no convênio para treinamento de trabalhadores petroleiros no Ceará.
Ele também nega qualquer atuação direta do cunhado Aroldo Cedraz na entidade.
"Ele ajudou apenas na emenda que permitiu construirmos a sede. Depois que se tornou ministro, só esteve lá uma vez", afirmou.
Presidente da ONG entre 2008 e 2012, Dagoberto Rios afirma que o convênio com o Ministério do Trabalho teve a primeira etapa integralmente cumprida.
Para isso, a entidade abriu filial em Fortaleza (CE) e contratou instrutores.
Ele justifica a interrupção do contrato alegando discordâncias da entidade com os termos do convênio e nega que haja irregularidades.
O atual presidente, Eduardo Oliveira, afirma que a entidade não possui mais convênios com o governo federal. O gerente de projetos José Daniel Rios afirma que "a gestão atual não tem compromissos políticos".
O Ministério do Trabalho afirma que firmou o convênio com a ONG após seleção pública.
A pasta informa ainda que serão tomadas medidas administrativas pela rejeição das contas da ONG, como a inscrição no Cadastro de Inadimplentes.