Bolsa enchente, por Mary Zaidan
Blog do Noblat -O Globo
Entra ano, sai ano, seja no final de um ou no início do outro, as chuvas de verão matam gente e impõem o desabrigo a milhares. Em 2010, o País contabilizou 473 mortos em enchentes. No ano seguinte, 918 só na região serrana do Rio de Janeiro. Agora, Minas Gerais e Espírito Santo registram meia centena de mortos, perto de 30 mil desalojados, boa parte sem ter para onde voltar.
E é sempre a mesma coisa: a presidente Dilma Rousseff sobrevoa as regiões afetadas ao lado dos respectivos governadores de Estado, promete mundos e fundos e pouco acontece depois da estiagem.
A novidade da vez é o Cartão Desastre, anunciado pela presidente depois do sobrevoo no Vale do Rio Doce, região mais castigada pelas chuvas que despencaram sobre Minas. Na verdade, nada de novo: o cartão existe há tempos.
É um nome bonitinho, com jeito marqueteiro de bolsa enchente, para o cartão da Defesa Civil, que já é usado com frequência por entes públicos em casos de calamidade. Por meio dele foram repassados R$ 315,7 milhões para 21 estados, incluindo R$ 16,3 milhões para Minas Gerais e R$ 438,7 mil só para a cidade de Vila Velha, uma das mais afetadas no Espírito Santo.
Se não inventarem complicações depois de a presidente reinventar a tarjeta de socorro a emergências, o cartão da Defesa Civil continuará simples, sem a burocracia que Dilma reconheceu existir nas linhas de crédito do governo.
Dilma sobrevoa áreas atingidas pela enchente. Foto: Roberto Stuckert Filho / PR
Com ou sem cartão, o fato é que o dinheiro para a prevenção de enchentes não chega ao destino. Ou entra no orçamento só para eleitor ver ou perde-se nos meandros da corrupção. Os R$ 30 milhões destinados a Petrópolis que o digam. Chegaram, mas só no bolso de alguns e, mesmo depois de investigações do Ministério Público e denúncias do TCU, caíram no esquecimento quando o sol voltou a brilhar.
Dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), sistematizados pela ONG Contas Abertas e publicados nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, informam que neste ano o governo só liberou 28% do dinheiro destinado ao Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres Naturais, com dotação prevista de R$ 18,8 bilhões. Apenas R$ 5,3 bilhões investidos em um ano e meio, sendo que R$ 1,3 bilhão pertence a projetos anteriores ao Plano.
Pouco se fez e não haverá tempo para muito mais. Prefere-se o improviso, a emergência, o discurso fácil de atribuir a incompetência à fúria da natureza.
Por criar dependência dos favores do governo, remediar continua a dar mais votos do que prevenir.
Ou o País exige mudanças ou terá de rezar por menos chuva em 2014.
(*) As informações sobre o Cartão da Defesa Civil estão disponíveis no site do Ministério da Integração Nacional: CLIQUE AQUI