Recente artigo de Gabriel de Arruda Castro, publicado na Gazeta do Povo, despertou meu interesse: “Ex-cético, cofundador da Wikipedia anuncia conversão ao cristianismo”. Tenho certeza de que você, amigo leitor, também ficou curioso.
Segundo o autor do artigo, Larry Sanger não é apenas um dos fundadores da Wikipedia, a enciclopédia mais usada do mundo. Ele também é um doutor em Filosofia Analítica, uma disciplina que tem a lógica como um dos objetos principais. E, a partir de agora, ele também não se importa em ser chamado de cristão – um cristão recém-convertido após quase cinco décadas de descrença.
A conversão de Sanger foi um processo gradual, mas o anúncio definitivo foi feito por ele em 5 de fevereiro. Sanger publicou, em sua página na internet, um longo artigo em que detalha sua caminhada do agnosticismo para o cristianismo. O relato, de 74 mil caracteres, recebeu o seguinte título: “Como um filósofo cético se torna um cristão”.
Paradoxalmente, quanto mais o mundo se afasta de Deus, mais cresce um sentimento difuso de vazio e inquietação
“Ao longo da minha vida adulta, tenho sido um devoto da racionalidade, do ceticismo metodológico e de um rigor um tanto obstinado e prático (mas sempre com a mente aberta). Tenho um doutorado em Filosofia, e a minha formação é em filosofia analítica, um campo dominado por ateus e agnósticos.” Larry Sanger encontrou Deus quando estudou mais a fundo as justificativas racionais para a existência do Criador.
Sanger não é um caso isolado. Deus está em alta. Isso mesmo. A nostalgia de valores transcendentes é patente. Impressiona-me, no Brasil, e na camada mais jovem da população, a crescente inquietação espiritual e o nível intelectual da moçada. Uma turma bem situada na vida profissional, mas que busca um sentido mais profundo para suas vidas.
A modernidade prometeu liberdade, progresso e felicidade. No altar da razão e do avanço tecnológico, muitas sociedades relegaram Deus ao esquecimento, tratando a fé como um resquício de um passado supersticioso. Mas, paradoxalmente, quanto mais o mundo se afasta de Deus, mais cresce um sentimento difuso de vazio e inquietação.
Essa nostalgia de Deus não é apenas um saudosismo religioso, mas um sintoma profundo da alma humana. O mundo contemporâneo, dominado pelo relativismo e pela cultura do descartável, assiste a uma epidemia de ansiedade, depressão e solidão. As promessas do materialismo mostraram-se incapazes de preencher o anseio por transcendência. O homem moderno, fragmentado e desconectado, sente falta de um sentido maior para sua existência.
A secularização avançou com força nas últimas décadas, impondo um paradigma no qual a fé é vista como um elemento dispensável. No entanto, a experiência concreta desmente essa tese. O esvaziamento espiritual não gerou uma sociedade mais equilibrada e serena. Pelo contrário, testemunhamos o crescimento de doenças psíquicas e uma sensação generalizada de desorientação
O filósofo francês Marcel Gauchet apontou que a modernidade não apenas afastou a religião da esfera pública, mas também retirou do homem a capacidade de compreender-se dentro de uma narrativa maior. O individualismo exacerbado e a busca frenética por prazer imediato transformaram a vida em uma sucessão de episódios desconexos, sem um fio condutor. O resultado? Uma sociedade angustiada, incapaz de lidar com o sofrimento e o mistério da existência.
Mesmo entre os não religiosos, percebe-se um desejo de espiritualidade, um anseio por algo que transcenda o efêmero. A explosão de movimentos de autoajuda, o fascínio por práticas esotéricas e a busca por experiências místicas revelam um fenômeno inegável: o coração humano clama por Deus, ainda que não o reconheça de imediato. A nostalgia de Deus está viva, ainda que disfarçada de novas roupagens.
O mundo precisa ver cristãos autênticos, que irradiem esperança e coerência. Em meio ao caos da pós-modernidade, aqueles que vivem sua fé com convicção tornam-se faróis de luz
A resposta para essa inquietação não está em um retorno ingênuo ao passado, mas em uma redescoberta genuína da fé. O cristianismo não se opõe ao progresso ou à razão, mas oferece um sentido integral para a existência. A fé cristã não é um refúgio escapista, mas um chamado à plenitude do ser. Bento XVI, um dos grandes pensadores do nosso tempo, afirmou que “a crise da modernidade é, em última análise, uma crise de Deus”. Enquanto o homem tentar construir um mundo sem Deus, encontrará apenas frustração e desespero
A nostalgia de Deus é, no fundo, um apelo à redescoberta da verdade. O que está em jogo não é apenas uma questão de crença pessoal, mas a própria sustentação de uma civilização. Sem Deus, a cultura degenera, a ética se dissolve e a vida perde sua sacralidade. A fé não é um acessório opcional, mas um alicerce indispensável para a dignidade humana
O retorno a Deus não se dará por imposição, mas pelo testemunho. O mundo precisa ver cristãos autênticos, que irradiem esperança e coerência. Em meio ao caos da pós-modernidade, aqueles que vivem sua fé com convicção tornam-se faróis de luz. Não se trata de impor uma verdade, mas de vivê-la de maneira tão íntegra que ela se torne irresistível.
A nostalgia de Deus, portanto, é um sinal dos tempos. É o eco de um chamado profundo, inscrito no coração humano. A resposta não está na fuga ou na indiferença, mas na coragem de reencontrar o sentido maior da vida. Somente em Deus o homem encontra sua verdadeira pátria, sua paz e sua plenitude.
Carlos Alberto Di Franco, Gazeta do Povo