quinta-feira, 27 de julho de 2023

“Oppenheimer” é uma bomba, diz Paulo Polzonoff Jr.

 

“Oppenheimer”: sinceramente, eu preferia ter ido assistir ao filme da Barbie.| Foto: Pixabay


Fui assistir ao tão falado “Oppenheimer”. À revelia do diretor, o filme se transformou numa espécie de antípoda de “Barbie”. E na entrada do cinema a impressão era mesmo essa: os inteligentões de um lado e os fúteis do outro. Foi assim que, munido de um baldão de pipoca e outro de refrigerante, me preparei para apreciar três horas de uma obra-prima com o selo Christopher Nolan de qualidade. Mas já na primeira hora de projeção eu dizia de mim para mim, rindo baixinho do trocadilho bobo e ouvindo mentalmente um axé das antigas (clica no link): que bomba!

Exageros à parte, e correndo o risco de soar mais contraditório que o de costume, começo dizendo que tecnicamente o filme é perfeito. Ou seja, mais uma oportunidade para Nolan se empanturrar de Oscars e outras honrarias feitas mais para quem premia do que para quem é premiado - como diria o Einstein do filme. Das atuações à música, passando pela fotografia. Se bem que só cinéfilo admira fotografia, né? Som, música, direção de arte, efeitos especiais, etc. Tudo é feito para impressionar e impressiona os mais impressionáveis – entre os quais me incluo.

Mas aí é que está o busílis: "Oppenheimer" é um filme técnico sobre tecnocratas para tecnocratas que, arrisco-me a dizer, serão incapazes de ligar os pontos entre a menção a Prometeu no começo e a cena final três longas horas mais tarde. Prometeu que roubou o fogo (conhecimento) dos deuses, entregou esse fruto proibido aos homens e, por isso, foi condenado a ter o fígado dilacerado por toda a Eternidade. Destino que ele metaforicamente compartilha com Oppie. Ops, com o dr. J. Robert Oppenheimer.

Aliás, ainda no campo das qualidades, eu destacaria três momentos, a começar justamente pela menção a Prometeu e pelas cenas que mostram como o jovem cientista enxergava a realidade. Ah, e nesse comecinho aí também estão as cenas que mostram Oppenheimer se deixando contaminar pelo niilismo e relativismo moral do chamado mundo moderno. Depois tem aquele que é o melhor momento do filme e talvez os únicos minutos em que Nolan resolve fazer cinema de verdade: a cena do primeiro teste com a bomba atômica. E, já no fim e com a plateia esgotada, tem a cena que sugere a destruição do mundo. Uma destruição que não é física, como se temia e ainda se teme, e sim intelectual e espiritual – como se constata.


Cartorário bem-intencionado

Fora isso, “Oppenheimer” é um interminável blábláblá sobre comunismo e caça às bruxas. E bota interminável nisso. Não sou desses que ficam consultando o celular durante a exibição do filme, mas estimaria que Nolan desperdiçou pelo menos duas horas e meia no lero-lero mais desinteressante da história do cinema. Já mais para o fim, entediadíssimo com aquela lenga-lenga toda e procurando qualidades improváveis, até cogitei a possibilidade de o palavrório todo ser intencional. Tipo uma metáfora para a destruição do mundo pelos homens que se embriagaram com o poder do intelecto, sabe? Mas não. Isso seria forçar a barra demais.

E eu até toleraria o blábláblá político se isso não representasse uma das escolhas narrativas mais desastrosas do cinema. (Desculpe. É que assisti a um filme com bomba atômica e estou mais hiperbólico que o de costume). Afinal, Nolan tinha em mãos a história de um homem interessantíssimo, de alguma forma responsável pela morte de mais de 200 mil pessoas. E mais: responsável por difundir, num mundo já contaminado pelo niilismo, a possibilidade de autodestruição (suicídio) em escala global.

No entanto, o diretor resolveu mostrar esse homem como um... um... um cartorário bem-intencionado que nas horas vagas faz bico como sósia do Sinatra. E, como convém à moral relativa do nosso tempo, como dedicado a justificar intelectualmente seus erros. O Oppenheimer de Nolan é um boneco de papelão; um “gênio sem sabedoria” cuja maior preocupação é como a história o retratará. Ao que dá vontade de responder: “Assim, ó!”. E isso ao longo de três arrastadas horas, durante as quais o espectador mais velho talvez se pergunte quando é que esse Sinatra aí vai começar a cantar.

Mas Sinatra não canta e eu, à saída do cinema, explodo numa sentença atômica: “Preferia ter visto o filme da Barbie”.



Paulo Polzonoff Jr., Gazeta do Povo