Marcio Pochmann: gestão à frente do Ipea foi marcada por acusações de intervencionismo e aparelhamento do órgão.| Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados
Confirmado na quarta-feira (26) como novo presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o economista Marcio Pochmann acumula uma série de posicionamentos controversos nos últimos anos. Sua indicação é alvo de duras críticas de economistas mais ortodoxos e enfrentou resistência dentro do próprio governo.
Entre suas declarações polêmicas, está uma crítica ao sistema de pagamentos Pix, criado pelo Banco Central e lançado em outubro de 2020. “Com o Pix, BACEN concede +1 passo na via neocolonial a qual o Brasil já se encontra ao continuar seguindo o receituário neoliberal”, escreveu no Twitter. “Na sequência vem a abertura financeira escancarada com o real digital e a sua conversibilidade ao dólar. Condição perfeita ao protetorado dos EUA”, completou.
No mês passado, ele usou a rede social para criticar as reformas trabalhista e previdenciária, que, para ele, teriam colapsado o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). “Desmontagem do assalariamento com o estancamento econômico, deformas trabalhista e previdenciário e fiscalismo dentista colapsa o Fundo de Amparo ao Trabalhador que precisa transferir parte do que arrecada do PIS/Pasep para o pagamento das despesas previdenciárias [sic]”, publicou.
Ligado ao PT, Pochmann foi acusado de aparelhar politicamente o Ipea
Historicamente ligado ao PT e próximo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Pochmann é gaúcho, natural da cidade de Venâncio Aires, formado em economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 1984.
Entre 1985 e 1988 fez uma pós-graduação em ciências políticas no Centro Universitário do Distrito Federal, em Brasília. Na capital federal, trabalhou como supervisor no escritório regional do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), entidade mantida pelo movimento sindical.
Em 1989, mudou-se para o estado de São Paulo e tornou-se professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), conhecida por sua linha de pensamento econômico majoritariamente heterodoxa e onde obteve o título de doutor em ciências econômicas em 1993. Lá atua como pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit).
Seu primeiro cargo em uma administração petista foi como secretário municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade durante a gestão de Marta Suplicy à frente da prefeitura de São Paulo, entre 2001 e 2004.
Entre 2007 e 2012, período que compreende o segundo mandato de Lula e o início do primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), o pesquisador foi presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), fundação vinculada ao Ministério do Planejamento responsável por fornecer consultoria técnica e institucional para a formulação de políticas púbicas.
Sua indicação para o cargo foi considerada, à época, um fortalecimento da ala desenvolvimentista do governo Lula, e sua gestão ficou marcada por críticas e acusações de intervencionismo e aparelhamento político do órgão.
Em 2008, ele defendeu uma reforma tributária que extinguisse PIS e Cofins e que compensasse as perdas com o fim desses tributos sobre consumo com uma maior progressividade do Imposto de Renda (IR), que passaria a ter 12 faixas de tributação – a mais alta previa a cobrança de 60% de IR para rendimentos que superassem R$ 50 mil mensais.
Pochmann tentou ser prefeito de Campinas e deputado federal
Pochmann deixou a presidência do Ipea para concorrer, pelo PT, à prefeitura de Campinas nas eleições de 2012, quando acabou derrotado, no segundo turno, por Jonas Donizette (PSB) por 57,69% a 42,31% dos votos válidos. Em 2016, voltou a disputar o cargo e acabou em terceiro lugar, com apoio de 15,04% do eleitorado. Em 2018, tentou ser deputado federal, mas novamente não conseguiu ser eleito.
Entre 2012 e 2020, foi presidente da Fundação Perseu Abramo, think tank do PT, e em 2018 coordenou o programa econômico da campanha eleitoral de Lula, que, impedido pela Justiça Eleitoral, acabou substituído pelo atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, como candidato à presidência pelo partido.
Mais recentemente, participou da equipe de transição do atual governo Lula, no grupo de trabalho de Planejamento, Orçamento e Gestão. Seu nome foi anunciado após a saída do ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega, da comissão.
É autor de diversos livros sobre economia, desenvolvimento e políticas públicas, como “A Década dos Mitos”, agraciado com o Prêmio Jabuti em 2002.
Como pesquisador da Unicamp, defendeu, em 2007, que os ganhos de produtividade obtidos pelo mundo já permitiriam que a jornada dos trabalhadores seja de 12 horas semanais, sendo quatro horas por dia, três dias por semana.
“Os empresários podem argumentar que não há espaço para redução, assim como no início do século 20 muitos não entendiam que a jornada de 14 horas por dia diminuía a produtividade e provocava uma série de doenças no trabalhador”, disse Pochmann, segundo registrou o jornal “O Estado de S. Paulo” à época.
Economistas criticam indicação de Pochmann para o IBGE
“Pochmann é um ideólogo. Tem uma visão totalmente ideológica da economia. E não terá problema de colocar o IBGE a serviço dessa ideologia, como fez no Ipea [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada]. Estou ofendido como ex-presidente do IBGE”, disse nesta quarta Edmar Bacha, que presidiu o instituto nos anos 1980, ao jornal “O Estado de S.Paulo”, sobre a nomeação do economista.
“Uma pessoa que não entende de estatística, não tem preparo para a presidência do IBGE e não tem nada a ver com a linha da equipe econômica do Ministério do Planejamento. É uma posição partidária pura e absoluta”, disse Elena Landau, que foi responsável em 2022 pelo programa econômico da então candidata à presidência Simone Tebet (MDB), hoje titular do Ministério do Planejamento e Orçamento, pasta em cuja estrutura está o IBGE.
Pochmann assumirá a presidência do instituto no lugar de Cimar Azeredo, que ocupava o cargo interinamente desde a saída de Eduardo Rios Neto neste ano. A indicação ocorre em meio à consolidação dos dados do Censo Demográfico do país, principal pesquisa do órgão.
Horas antes da confirmação da indicação, Tebet disse, em entrevista à GloboNews, que não conhece Pochmann. “Não estamos tratando de IBGE, até porque seria um desrespeito com um presidente que está hoje lá e que tem um ciclo que não se encerrou”, afirmou.
Em resposta a críticas que circulam desde que o nome do economista passou a ser cotado para o cargo, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PT-PR), defende a nomeação. “Intelectual histórico, Pochmann tem um olhar aguçado para as pesquisas na área social, é um democrata que pensa um Brasil mais justo”, escreveu em suas redes sociais.
O IBGE é um instituto público da administração federal, responsável pela apuração, organização e divulgação de dados e estatísticas oficiais nos campos econômico, social e demográfico. Sob sua responsabilidade está, por exemplo, o Sistema de Contas Nacionais, que inclui, o cálculo do Índice Nacional de Preços ao Consumido Amplo (IPCA), indicador oficial de inflação do país, e do Produto Interno Bruto (PIB).
Célio Yano, Gazeta do Povo