terça-feira, 30 de março de 2021

"O soldado de Itacaré e a simbologia de seu ato", por Marco Frenette

 

Não estava no local dos fatos e nem conheci pessoalmente Wesley Soares, o policial que enfrentou seus companheiros de farda enquanto gritava em nome da honra, da dignidade e da infâmia que é um policial prender e humilhar trabalhadores.

Porém, assisti ao vídeo que registrou a execução de Wesley. Depois de alvejado e já no chão, ouve-se ainda várias dezenas de disparos de diversos calibres.

Nenhum vagabundo armado no Brasil, seja traficante ou assaltante de banco, foi tratado com tanto ódio e desprezo como esse policial. Há uma simbologia, há um significado nesse pipocar desnecessário.

O significado é este: a vida de um policial vale muito menos do que a vida de um bandido. Se fosse um animal do tráfico que tivesse sido alvejado dessa maneira, haveria uma crise nacional de proporções épicas.

E restam as perguntas. Foram quase quatro horas de negociações. Nesse tempo a polícia não providenciou um sniper para colocar um projétil no ombro direito de Wesley? A distância era curta, o sniper acertaria um tiro desses sem o menor esforço.

Mas Wesley irritou a guarda pretoriana do governador petista ao dizer frases como estas: "Seus filhos estão presenciando sua covardia, policiais militares do estado da Bahia"; “Venham testemunhar a honra ou desonra do policial militar da Bahia”.

É evidente que Wesley não estava em seu estado normal, o que não significa dizer que estivesse em surto. Ele estava transformado em um poço de indignação, algo só possível de ocorrer com pessoas que têm valores e sabem a diferença entre o certo e o errado.

Também é evidente que o caráter e a consciência que ele demonstrou deveriam ser os parâmetros da polícia que o assassinou: “Não vou permitir que violem a dignidade humana de um trabalhador".

Marco Frenette. Jornalista e escritor.