domingo, 12 de julho de 2020

"Filmes certos, papéis nem tanto", por Ruy Castro

Como teria sido 'O Poderoso

Chefão' com Laurence Olivier

no lugar de Marlon Brando?



Morreu o ator Leonardo Vilar e, pelos obituários, descobre-se que o grande papel de sua carreira quase lhe escapou: o do pungente camponês Zé do Burro, que tenta entrar numa igreja com uma cruz, no filme "O Pagador de Promessas" (1962). O produtor preferia Mazzaroppi, famosíssimo. Mas o diretor Anselmo Duarte ficou firme em Leonardo Vilar e, com ele, venceu o Festival de Cannes. O cômico jeca Mazzaroppi arrastaria aquela cruz pelas ruas da Bahia sem nos fazer rir?
Muitos filmes escaparam por pouco de ter o ator, digamos, menos indicado. 
O Rick inicialmente escalado para "Casablanca" (1942) não era Humphrey Bogart, mas Ronald Reagan. 
Por Billy Wilder, a estrela decadente de "Crepúsculo dos Deuses" (1950) teria sido Mae West. Mas Mae não se interessou, e ele chamou Gloria Swanson. 
E o papel duplo feminino de "Um Corpo que Cai" (1958) foi escrito para a competente Vera Miles. Só que ela engravidou e Hitchcock, contrariado, substituiu-a por Kim Novak. O mundo agradeceu.
Em 1959, Jean-Luc Godard já namorava Anna Karina e a queria para o papel de Patricia em "Acossado". Mas Patricia teria de ficar nua numa cena, mesmo que de costas. A jovem Karina não aceitou. Godard então convidou a americana Jean Seberg e, por isso, fez de Patrícia a garota que vende o Herald Tribune no Champs-Élysées. Foi melhor assim.
O primeiro James Bond, desde "O Satânico Dr. No" (1962), já era para ter sido Roger Moore. Mas ele não estava disponível e, por isso, Sean Connery se tornou —para sempre— 007. Moore, como se sabe, depois assumiria o papel. 
E, ao estrear como diretor, com "Um Assaltante Bem Trapalhão" (1969), Woody Allen sonhava com Jerry Lewis no protagonista. Como Lewis nem respondeu ao convite, Woody escalou a si próprio --o resto é história.
E como teria sido "O Poderoso Chefão" (1972) com Laurence Olivier no lugar de Marlon Brando? Pois quase foi.

Mazzaropi, caracterizado como Jeca, e Leonardo Vilar em "O Pagador de Promessas" - Divulgação
Ruy Castro
Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues
Folha de São Paulo