O presidente em exercício Hamilton Mourão disse nesta segunda-feira que não vê "nada demais" na decisão do Brasil de abrir um escritório de negócios em Jerusalém, confirmada durante visita oficial do presidente Jair Bolsonaro a Israel, no domingo. Segundo Mourão, a medida pode ser considerada um "passo intermediário" na ideia de mudar a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém, promessa feita por Bolsonaro durante a campanha.
O vice-presidente, que assumiu o Planalto interinamente no sábado, também minimizou a decisão da Autoridade Palestina de convocar para consultas o seu embaixador no Brasil, Ibrahim Alzeben. Mourão afirmou que a chamada é um "método diplomático" que faz parte das "pressões" que vã ocorrer a partir de agora, mas disse acreditar que o palestino voltará "daqui a pouco" a Brasília.
— Foi decisão do presidente. O presidente conversou com a gente, tomou essa decisão. E uma coisa é muito clara: a partir do momento que se toma a decisão, foram ouvidas todas as, digamos assim, ponderações a respeito, a gente está junto com a decisão do presidente. Eu não vejo também nada demais. É algo que não tem nada a ver com a diplomacia. Podemos até considerar, vamos dizer assim, um passo intermediário naquela ideia inicial do presidente de mudar a embaixada — declarou o presidente em exercício.
Pouco antes, em Israel, Bolsonaro sugeriu que ainda pode transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv para a cidade durante o seu mandato. Em conversa com jornalistas, ele reiterou que mantém o compromisso de transferência da missão diplomática, mas pregou "calma" no processo de transição. A proposta sofreu fortes críticas dos países árabes, que estão os principais compradores das exportações brasileira de carne, mas o recuo parcial do governo brasileiro não acalmou os ânimos.
— Tem o compromisso, mas meu mandato vai até 2022, ok? Está explicado? E a gente tem que fazer as coisas com calma, sem problema, mantendo contato com o público de outras nações, e o que eu quero é que seja respeitada a autonomia de Israel. Se eu fosse presidente hoje e fosse abrir negociações com Israel, botaria a nossa embaixada aonde? Seria em Jerusalém. Agora, a gente não quer ofender ninguém. Agora, eu quero que respeitem a nossa autonomia — ressaltou Bolsonaro.
Questionado sobre a convocação do embaixador palestino, Mourão pediu que fossem lembrado sempre que diplomacia não é o objetivo final, mas a forma de se conduzir um relacionamento.
— Faz parte das pressões que vão ocorrer a partir do momento em que foi tomada a decisão, mas eu tenho aqui uma visão clara de que uma vez que os países árabes e os palestinos, em particular, entendam o alcance dessa decisão, que não muda a nossa visão diplomática em relação à existência e à necessidade de que palestinos e israelenses tenham uma coexistência pacífica naquela região, conforme o Brasil desde 1947 o Brasil apoia, (...) não teremos problemas.
— Vamos aguardar, né? A chamada do embaixador é aquela 'chama pra consulta'. Vai lá, bate um papo e daqui a pouco ele volta - disse, sendo indagado em seguida se realmente acha que o diplomata retornará ao Brasil. - Volta, volta, volta sim - respondeu.
Entenda a polêmica
O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, afirmou no domingo que o novo escritório não terá status de representação diplomática nem significa o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel pelo Brasil. Segundo ele, seu propósito é promover cooperação em comércio e tecnologia, embora essas áreas já tenham representantes na embaixada brasileira em Tel Aviv, que fica a menos de uma hora de carro de Jerusalém.
Qualquer decisão em relação a Jerusalém é delicada porque o setor oriental (árabe) da cidade é considerada território ocupado pela ONU. Segundo resoluções do Conselho de Segurança, o status final da cidade só pode ser determinado em negociações entre israelenses e palestinos, que reivindicam o setor oriental como capital do seu futuro Estado.
Se transferir a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém, o Brasil se tornará o terceiro país, depois da Guatemala e dos Estados Unidos, a tomar a decisão.
Gustavo Maia, O Globo