Fábio Alves - O Estado de São Paulo
Mercado ignora vitória parcial do governo na votação de vetos e foca atenção na piora fiscal e no risco de rebaixamento iminente
A reação do mercado financeiro na manhã desta quarta-feira mostra que os preços dos ativos, especialmente câmbio e juros, perderam os parâmetros.
Não houve alívio do dólar ou do mercado futuro de juros com a notícia da vitória parcial do governo na votação dos vetos à chamada pauta bomba, cuja votação entrou pela madrugada.
O nervosismo fez a cotação do dólar bater a máxima de R$ 4,1340, com alta mais de 2% ao redor do meio dia desta quarta-feira, e os juros futuros embutirem nas suas taxas um novo ciclo de alta da taxa Selic de 2,5 pontos porcentuais, ou cinco elevações de 0,50 ponto.
O mercado parece órfão em termos de parâmetros tanto do Ministério da Fazenda quanto do Banco Central. Mas essa perda de referência está além do controle unicamente do governo: a crise política não dá sinais de que está perto do fim.
Do lado do câmbio, um componente de pressão é a expectativa de um iminente novo rebaixamento da classificação de risco soberano brasileiro, depois que a Standard & Poor’s (S&P) retirou do Brasil o grau de investimento.
A Fitch Ratings atribui uma classificação dois níveis acima do patamar mais baixo do grau de investimento e a Moody’s, um.
Todavia, o mercado já não descarta uma surpresa vindo da Fitch: a agência poderia cortar a nota brasileira em dois níveis de uma vez só e retirar o grau de investimento do Brasil, deflagrando saques de fundos de pensão e de investimentos estrangeiros cujos estatutos exigem esse selo por parte de duas agências de classificação de risco.
Sim, os investidores já vêm precificando nos últimos dias um novo rebaixamento do rating soberano brasileiro, mas até que isso aconteça a incerteza e a expectativa acabam alimentando uma espiral negativa sobre os preços dos ativos.
Mais do que a curva de juros neste momento, o câmbio está obcecado com a deterioração fiscal do Brasil.
E a votação dos vetos da presidente Dilma Rousseff ontem à noite foi interpretada apenas como uma trégua dada pelos parlamentares não como um endosso ao governo. A interpretação é que os parlamentares, especialmente os do PMDB e do PSDB, votaram a favor de Dilma ontem como medida preventiva: num eventual cenário pós-impeachment da presidente, um eventual próximo governo quer ter condições mínimas para governar e sobreviver.
Se impusessem uma nova derrota a Dilma na votação de vetos a medidas que elevariam o gasto público em bilhões de reais nos próximos anos, o PMDB e o PSDB teriam, na verdade, uma vitória de Pirro, ou seja, no longo prazo (ou será curto?) estaremos todos mortos.
Para o mercado ficou claro que o alívio dado ao governo ontem na votação da maioria dos vetos – faltando ainda votar o reajuste dos servidores do Judiciário, por exemplo – foi uma questão de sobrevivência das forças políticas que já calculam suas posições numa eventual saída da presidente do seu cargo.
O teste para valer será a votação do pacote fiscal, em especial a medida que ressuscita a CPMF, que o governo vai enviar ao Congresso com o objetivo de eliminar a previsão de déficit primário de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2016.
Enquanto pesam sobre a cotação do dólar a questão fiscal e a iminência de um novo rebaixamento do rating soberano, na curva de juros a falta de uma sinalização clara do Banco Central está alimentando o prêmio de risco.
Em suas declarações públicas, nem o presidente do BC, Alexandre Tombini, nem outros diretores têm sido claros, diretos e transparentes sobre a necessidade de voltar a subir os juros no curto prazo.
O BC tem feito isso apenas em conversas reservadas com a imprensa, passando o recado de que não se afastará do objetivo de fazer a inflação convergir para a meta de 4.5% ao fim do ano que vem.
Mas será necessário mesmo um choque de juros como aconteceu quando Armínio Fraga assumiu o BC após a desvalorização cambial?
Naquela época, Fraga era novo no BC, tinha credibilidade e o Brasil não tinha reservas internacionais como dispõe hoje. Mas agora, cinco elevações adicionais de 0,50 ponto porcentual, como está sendo precificado hoje, levariam a taxa Selic para 16,75%.
Um novo ciclo de aperto monetário não é garantia de que as expectativas inflacionárias iriam convergir para o objetivo do BC ao fim de 2016, mas se o BC sair de cima do muro e sinalizar claramente que fará isso mesmo, ao menos a parte longa da curva de juros poderá reaver algum parâmetro e não simplesmente inflar o prêmio de risco.
Do mesmo modo, o Tesouro Nacional poderia indicar que, aos preços exigidos pelo mercado, não irá mais emitir papéis.
De qualquer forma, em meio a um ambiente em que o mercado parece estar obcecado com o anúncio de um novo rebaixamento do rating soberano e de avanço ou não de um processo de impeachment, o BC e o Tesouro poderiam ter uma postura mais ativa em acalmar os investidores.
Sem essa mão mais firme, o nervosismo não terá fim, uma vez que a impressão é de que o governo inteiro – inclusive o Ministério da Fazenda e o BC – está perdido e sem saber por onde ir.
Fábio Alves é jornalista do Broadcast