
Numa comparação entre os períodos de março a novembro de 2017 e 2018, os roubos de cargas tiveram uma queda de 19,58%. Esse tipo de crime apresentou alta durante cinco anos consecutivos, chegando a somar 10.599 casos ao longo de 2017 (o que correspondeu a uma média de uma ocorrência a cada 48 minutos). O número, para especialistas, indica que a comercialização ilegal das mercadorias virou, para grandes quadrilhas, um negócio tão lucrativo quanto a venda de drogas. Consequentemente, esses bandos conseguiram mais dinheiro para comprar armas e munição, desencadeando uma série de confrontos com policiais e grupos rivais.
Menos mortes violentas
Considerado por especialistas em segurança pública o mais importante indicador do nível de violência de um lugar, o homicídio doloso crescia no estado desde janeiro de 2016, e, mesmo após o início da intervenção, apresentou alta. Chegou a subir 9% na comparação entre abril de 2017 e deste ano, “zerou” na confrontação das ocorrências registradas em maio e, a partir de junho, entrou em queda, chegando a uma redução de 22% em outubro. No acumulado de março a novembro, a diminuição foi de 13,6%. No mesmo período, os casos de latrocínio (roubo seguido de morte) tiveram diminuição ainda maior: 33,72%.
Segundo o secretário de Segurança, general Richard Nunes, o foco no combate a roubos influenciou a queda nas estatísticas de homicídios:
— A redução faz parte de um complexo de atuações em que a ostensividade da polícia desencoraja a prática de crimes de toda a ordem, principalmente os contra a vida. Contribuímos para que houvesse uma menor possibilidade de ocorrências. Os números estão aí para mostrar isso, com vários meses consecutivos de redução dos homicídios dolosos.

A intervenção federal na segurança pública do Rio foi decretada em 16 de fevereiro pelo presidente Michel Temer. Nomeado para comandar o processo, o general Walter Braga Netto encontrou um estado falido e com as polícias Militar e Civil desestruturadas — o patrulhamento era afetado até por falta de combustível para viaturas.
— Tínhamos uma tendência de alta em quase todas as modalidades criminosas. Conseguimos reverter isso.
Além dos roubos de cargas, caíram os de veículos, a transeuntes, de celulares, a residências, ao comércio, em coletivos e de caixas eletrônicos. Outros quatro tipos, a intervenção não reduziu: os de bicicleta, de condução da vítima, a instituições financeiras e após saques bancários.
— A grande vitória alcançada foi a reversão de uma expectativa que era muito ruim. A cada mês se atingia um indicador pior no roubo de veículos, por exemplo — disse o secretário de Segurança, acrescentando que esse tipo de crime teve uma queda de 6,67% na comparação entre os períodos de março a novembro de 2017 e deste ano. — O que falta agora para que o estado alcance melhores resultados no combate a ladrões de carros é a entrada definitiva do Detran na fiscalização de oficinas de desmanche. Mas com a crise que se abateu sobre o órgão ( alvo de um esquema de loteamento de cargos que levou sete deputados do Rio à cadeia ), ficou difícil concluir o plano dentro da intervenção.
Para o diretor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF), Eurico de Lima Figueiredo, “o improviso inicial imposto pelo governo Temer” foi um ponto negativo da intervenção, mas ele acha que ficou um legado para o Estado do Rio.
— No começo, tiveram que trocar pneus furados com o carro em movimento. Não existem milagres na segurança pública, porém a queda dos índices de criminalidade é algo positivo. No entanto, considero o treinamento de pessoal o maior legado. Os militares trouxeram não apenas recursos, que estão possibilitando a recuperação mínima de eficiência das polícias, mas ensinamentos de planejamento estratégico, de doutrinas de emprego e de capacitação dos serviços de inteligência.
Mortes causadas pela polícia dispara

Por um lado, a intervenção derrubou índices de homicídios dolosos e roubos, mas, por outro, entrará para a História como o período de maior letalidade policial do Rio desde a criação do Instituto de Segurança Pública, em dezembro de 1999. Até o mês passado, foram registradas 1.444 mortes durante confrontos com forças do estado, um aumento de 38,6% no acumulado de janeiro a novembro, na comparação com o mesmo período de 2017.
Em operações do Comando Conjunto, foram mortos 46 civis e quatro militares, e instaurados 51 inquéritos. Houve, de acordo com o estado, 187 registros de ataques a tiros contra as tropas.
— Gostaria de ver esse número ( de mortes decorrentes de ações policiais) reduzido, porém, dentro do cenário encontrado, de enfrentamentos entre facções e de ataques a policiais, entendemos que esse indicador está dentro de um espectro de normalidade, até que se atinja uma desejável estabilização — defende o secretário de Segurança, general Nunes.
Para o professor Guilherme Dias, especialista em estudos estratégicos da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, o aumento da letalidade policial está relacionado a uma perda de capacidade da autoridade:
— Claro que esse tipo de política acaba levando a um aumento das mortes decorrentes de ações policiais. É algo que reflete um processo histórico de perda da capacidade da segurança pública de dissuadir a criminalidade. Mas, com o reaparelhamento e a requalificação das polícias, esse quandro tende a mudar, com criminosos passando a temer o confronto.

Outra estatística negativa registrada é a referente a roubos após saques bancários. As ocorrências aumentaram 30,5%, saindo de 563 casos, entre março e novembro do ano passado, para 735 no período da intervenção.
— Esse tipo de roubo tem que ser encarado de uma maneira qualitativa, com investigação mais apurada, para que se prendam as quadrilhas responsáveis. Entendemos também que as instituições financeiras precisam colaborar. Aquelas que adotaram as medidas preventivas recomendadas não estão tendo problemas — argumentou Nunes.
Outro gargalo longe de ser resolvido é a corrupção policial. A última operação realizada para a captura do miliciano Wellington da Silva Braga, o Ecko, fracassou. Lançada na semana passada, foi a quarta que o teve como alvo. Um PM foi preso acusado de passar informações à quadrilha.
— Não fizemos nenhuma caça às bruxas, o que poderia paralisar a própria atividade policial. Temos a convicção de que é um processo lento e demandará um envolvimento da sociedade, de todas as instituições. Não se pode imaginar um ataque apenas à corrupção policial enquanto houver corrupção em todas as esferas do poder — disse o secretário.
Elenilce Bottari, O Globo