Eraldo Peres - 8.mai.2017/Associated Press | ||||||||||||||
O presidente Michel Temer em evento em Brasília Folha de São Paulo
O presidente Michel Temer foi gravado por um dos donos do grupo J&F, proprietário do frigorífico JBS, falando sobre a compra do silêncio do ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
A informação foi dada pelo colunista Lauro Jardim, do jornal "O Globo", e confirmada pela Folha.
Temer ouviu do empresário Joesley Batista, da JBS, que ele estava dando a Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, um dos operadores da Operação Lava Jato, uma mesada na prisão para que ficassem em silêncio.
A conversa teria sido em março deste ano. Funaro está preso, assim como Cunha, que manteve por anos relação próxima ao atual presidente dentro do PMDB.
Condenado em primeira instância na Lava Jato, Cunha, mesmo detido, encaminhou, em processos em que é acusado, perguntas a Temer a respeito de pagamentos em campanhas eleitorais.
O Planalto confirmou o encontro com Joesley, mas negou as afirmações do empresário. Nota divulgada nesta quarta (17) diz que Temer "jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio" de Cunha e que não participou nem autorizou qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça.
Joesley afirmou na delação ter pago para Cunha R$ 5 milhões após a prisão dele, em outubro do ano passado, em um "saldo de propina" remanescente que possuía.
A divulgação do caso lançou o governo em sua maior crise, paralisou a discussão sobre as reformas e gerou questionamentos sobre a capacidade de sobrevivência do Executivo.
No Congresso e em manifestações de rua, houve pedidos de saída do peemedebista e realização de eleições diretas.
AÇÃO CONTROLADA
O processo de delação dos executivos da JBS teve pela primeira vez acompanhamento eletrônico de cédulas de dinheiro, filmagens e gravações, no que se costuma chamar de ação controlada, forma excepcional de investigação policial.
Esse tipo de ação ocorre quando um criminoso, réu ou suspeito aceita coletar provas para a polícia, com a supervisão direta, apoio tecnológico e eventual intervenção das autoridades policiais no processo.
A coleta de provas faz parte do acordo de delação, no qual o investigado terá benefícios, como um tempo menor de prisão ou mesmo a extinção da pena.
INTERMEDIAÇÃO
A delação aponta também que Temer destacou o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) para intermediar interesses do grupo empresarial no Cade, órgão de defesa da concorrência.
Desde 2011, ele trabalha com o presidente, quando Temer foi eleito vice na chapa de Dilma Rousseff. Rocha Loures, na época, era chefe de Relações Institucionais da Vice-Presidência.
Loures foi filmado recebendo uma mala com R$ 500 mil enviados por Joesley Batista, do grupo JBS.
Joesley e seu irmão Wesley foram ao gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin para selar um acordo de delação premiada na última quarta (10).
O senador Aécio Neves (PSDB-MG) também foi gravado pedindo R$ 2 milhões a Joesley. A quantia foi entregue posteriormente a um primo do tucano, em ação filmada pela PF.
A delação da JBS também menciona o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como contato da companhia com o PT.
A JBS esteve na mira de investigações da Polícia Federal em diferentes frentes desde 2016. Na sexta-feira (12), a PF deflagrou operação sobre supostas irregularidades na concessão de empréstimos do BNDES. O juiz responsável, Ricardo Leite, de Brasília, negou um pedido de prisão contra os donos da empresa.
A empresa teve forte expansão, inclusive fora do Brasil, a partir da década passada e se tornou em uma das principais doadoras de campanhas.
REAÇÕES
O presidente começou a esboçar na noite desta quarta estratégia para evitar que o caso desestabilize sua gestão e afete a votação de reformas defendidas pelo governo.
Em uma tentativa de reação, Temer se reuniu logo depois com ministros, políticos aliados e com o núcleo de comunicação do Planalto para preparar um posicionamento público.
A ordem era, por enquanto, minimizar as acusações, passar um clima de normalidade institucional e defender que é necessário ainda aguardar a divulgação das eventuais gravações.
Nos bastidores, contudo, assessores e auxiliares reconhecem que, caso os áudios venham a público, podem criar a pior crise enfrentada até o momento pela gestão peemedebista, que completou um ano na semana passada.
A avaliação é de que isso pode desmantelar a base aliada e fomentar os partidos de oposição a pressionarem por seu impeachment, já que o episódio ocorreu durante o mandato presidencial.
Aliado de Temer, Maia encerrou a sessão desta quarta, bateu boca com a oposição e deixou o plenário da Casa transtornado.
"Não tem mais clima para trabalhar. Só isso", disse o presidente da Câmara ao deixar a Casa pelo cafezinho anexo ao plenário.
AÉCIO E MANTEGA
Joesley e seu irmão Wesley foram ao gabinete do ministro do Supremo Edson Fachin para selar seus acordos de delação premiada.
Segundo investigadores, o senadorAécio Neves (PSDB-MG) foi gravado pedindo R$ 2 milhões a Joesley e que a quantia foi entregue a um primo do tucano, em ação filmada pela PF.
A delação, diz "O Globo", também menciona o ex-ministro da FazendaGuido Mantega como contato com o PT.
MERCADO
Após a divulgação da existência das gravações envolvendo o presidente Temer, os papéis de empresas despencaram no mercado financeiro internacional.
Fundo que tem como referência ações e títulos de empresas brasileiras negociados nos EUA (ETF do índice MSCI Brasil) iniciou uma derrocada a partir das 19h40 (quando a informação foi publicada pelo jornal "O Globo") e chegou a afundar mais de 11%.
Um fundo similar, mas no mercado japonês, sofreu efeito semelhante. Até a conclusão desta edição, ele registrava queda de 9%
O QUE ACONTECE SE MICHEL TEMER DEIXAR A PRESIDÊNCIA?
Nos dois anos finais do mandato, a Constituição prevê eleição indireta em caso de dupla vacância, ou seja, queda do presidente e do vice por renúncia, afastamento ou morte.
Quem assumiria a Presidência?
O primeiro na linha sucessória é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) –depois vêm o do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e a do STF, Cármen Lúcia. Maia teria 30 dias para convocar uma eleição indireta.
Quem elegeria o novo presidente?
Os 513 deputados e 81 senadores, em sessão bicameral, com voto aberto e peso igual para todos.
Quem poderia se candidatar?
A Constituição não especifica se as regras de elegibilidade (ser brasileiro, ter 35 anos ou mais, filiado a um partido etc.) se aplicam num pleito indireto. Alguns especialistas defendem que se siga o roteiro geral. Outros, que essas normas não valem aqui. Caberia ao Congresso definir.
Magistrados poderiam virar presidente?
Para a turma que aponta buracos na Constituição sobre quem é elegível, sim. Numa eleição direita, só pode se candidatar quem se descompatibilizar do cargo seis meses antes do pleito.
Diretas Já é algo possível?
Seria preciso aprovar uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para alterar as atuais regras do jogo. Já há iniciativa afim no Congresso, de Miro Teixeira (Rede-RJ).
Temer pode ser denunciado?
Sim, se a Procuradoria-Geral entender que houve crime no mandato atual. Mas a denúncia só chegaria ao STF com autorização de dois terços da Câmara (crimes de responsabilidade, caso de Dilma, também passam pelo Senado). O rito não é ágil.
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