Órgão do Ministério da Fazenda praticamente desconhecido fora do circuito jurídico-tributário, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) surgiu no noticiário como abrigo de um dos maiores esquemas de sonegação fiscal já descobertos no Brasil.
As cifras mencionadas no caso impressionam mesmo num país ao qual não têm faltado episódios de corrupção. De acordo com a Polícia Federal, as apurações indicam que os cofres públicos sofreram prejuízo de, no mínimo, R$ 5,7 bilhões.
Para fins de comparação, vale lembrar que, pelos cálculos do Ministério Público Federal, os investigados na Operação Lava Jato subtraíram R$ 2,1 bilhões da Petrobras. Já o mensalão petista, segundo a Procuradoria Geral da República, mobilizou R$ 141 milhões.
À diferença desses escândalos, a rapinagem no Carf, pelo que se afirma, não envolvia partidos políticos. Reunia apenas representantes de grandes empresas, de um lado, e conselheiros, ex-conselheiros e servidores públicos, de outro. Uns queriam cancelar ou reduzir dívidas com a Receita Federal; os demais negociavam propinas para atender esse desejo.
Espécie de tribunal da Receita, ao qual pessoas físicas e jurídicas podem recorrer de multas tributárias, o Carf revela-se terreno fértil para um esquema dessa natureza.
Seus julgamentos ocorrem em turmas de configuração paritária, compostas por três auditores nomeados pelo Ministério da Fazenda e três representantes dos contribuintes com experiência em direito tributário, indicados por confederações de setores importantes da economia e por centrais sindicais.
Em caso de empate, o voto de minerva cabe a um único conselheiro indicado pela Fazenda, mesmo que estejam em questão milhões de reais. Proferido o veredicto, a decisão não será reconsiderada.
Não é difícil perceber como, aos olhos de certos empresários, resulta conveniente uma quadrilha como a investigada na Operação Zelotes. Nada menos que R$ 19 bilhões em débitos tributários são discutidos nos 70 processos classificados como suspeitos pela PF.
A ação policial evidencia o quanto custam o tráfico de influência e as fraudes no Carf, mas as fragilidades do órgão já eram conhecidas. Além do sistema de votação, especialistas criticam o fato de que os conselheiros nomeados pelos contribuintes, com mandato de três anos, não são remunerados.
Em muitos casos o cargo se torna um canal para obter informações privilegiadas ou atrair clientes para escritórios de advocacia.
Não bastará, portanto, punir quem tiver seu envolvimento comprovado. O governo precisa fazer uma profunda revisão do Carf, aumentando mecanismos de controle e incrementando a transparência.