segunda-feira, 19 de abril de 2021

"A prisão de um 'futuro' ministro do Supremo, que se tornou um sociopata do habeas corpus", por Hugo Studart

 

Eis que me encontro tomando uísque com um velho amigo diplomata. Ele então se recorda de uma história dos tempos em que servia na Alemanha. Trabalhava com certo oficial de chancelaria, recém-formado no Direito da UnB. Era brilhante. Cursava mestrado e não escondia o sonho de ser Ministro da Suprema Corte.

Um dia o diplomata é surpreendido com um chamado para soltar da cadeia o oficial de chancelaria.

A história é a seguinte. O jovem havia descoberto um telefone público em uma cidadezinha na divisa da Bélgica com a Alemanha, no qual era possível fraudar a telefônica ligando de graça para o Brasil.

Na ocasião ele estava apaixonado uma joia rara de sua cidade, a qual chamava carinhosamente de Pretinha. Era tanto telefonema, por tantas horas, que os moradores daquela cidadezinha de interior da Bélgica estranharam aquele estrangeiro com tipo marroquino. E se fosse terrorista? Chamaram a polícia. Ele foi preso.

Logo a polícia descobriu que a fraude havia passado de 25 mil dólares (hoje deve ser equivalente a uns 50 mil). Não havia ninguém para lhe conceder um habeas corpus. A embaixada teve que pagar a dívida para soltar seu oficial de chancelaria.

Os documentos estão nos anais do Itamaraty e meu amigo diplomata sabe onde encontrá-los.

De volta ao Brasil, já com título de mestrado, o egresso presta novo concurso público, infiltra-se no judiciário, inicia uma carreira brilhante, se esquece da Pretinha, retoma o romance com antiga paixão de faculdade e chega ao Supremo.

Tudo leva a crer, avalia o narrador desta história, que tenha sido na Bélgica que se tornou um sociopata do habeas corpus.

Hugo Studart - Jornalista

Jornal da Cidade