quinta-feira, 29 de abril de 2021

"A Lava Jato quebrou as grandes empreiteiras?", questiona Arquimedes Fialho




A Operação Lava Jato tem sido acusada de ser responsável pela quebra de grandes empreiteiras, provocando um desemprego em massa, principalmente no setor de obras da Petrobras e de infraestrutura no governo federal. Há um erro nessa leitura, e neste texto descrevo o que acredito realmente ter provocado a diminuição no ritmo das obras, com perda de faturamento e quebra de muitas empresas.

O PT chegou ao poder com a ascensão de Lula à Presidência, em 2003. Ele, corretamente, rasgou o discurso retrógado de estatização e intervenção do Estado na economia, dando continuidade às medidas austeras vigentes na economia, como o controle de gastos e respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal promulgada na gestão Fernando Henrique Cardoso. Durante o primeiro e o segundo mandato de Lula, o mundo experimentou elevado crescimento e as nossas commodities tiveram bons preços, o que levou nosso país a exibir saldos na balança comercial e gerar uma boa reserva em dólares, livrando-nos de recorrer ao FMI nas crises mundiais.

Lula também deu continuidade aos programas sociais anteriores e consolidou os vários programas, principalmente na área de assistência social, ao criar o Bolsa Família, um programa mais robusto e abrangente, com acréscimo progressivo no valor do salário mínimo com inserção social de uma camada expressiva da população. O erro foi não aproveitar esse período de bonança e fazer as reformas necessárias que o país demandava, além de investir mais e melhor em obras de infraestrutura de que necessitávamos e que trariam condições de desenvolvimento com custo Brasil menor, gerando renda e trabalho. Melhor infraestrutura estimula a atividade privada a investir seu capital, o que faz a roda da economia girar; e ela depende de medidas estruturais tomadas pelo governo, usando os recursos do seu orçamento e sendo indutor e gerador de emprego e renda ao contratar obras públicas e atuar onde a atividade privada não tem interesse por não haver retorno econômico.

Quase ao fim do governo Lula, a taxa de crescimento mundial começou a declinar e, como consequência, ocorreu o mesmo com nossos superávits comerciais, mas esse fato não reduziu a grande aprovação popular do presidente. Aproximando-se a nova eleição presidencial, Lula, sem possibilidade de disputar novo mandato, escolheu como candidato uma pessoa despreparada e sem carisma, e que se tornou a ex-presidente Dilma Rousseff.

Contrariando a linha econômica do antecessor, Dilma optou, com seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, por uma política mais estatizante e intervencionista, e que resultou em uma série de medidas danosas ao país – caso, por exemplo, da área energética, com diminuição de tarifas que trouxe consequências desastrosas à Eletrobrás, hoje uma empresa sem capacidade de investir e atender as demandas energéticas do país. Outra intervenção danosa foi impor o tabelamento de juros, obrigando a um aumento na taxa Selic.

O resultado dessa má política econômica de Mantega levou a uma redução no ritmo de crescimento e da arrecadação. Entretanto, os gastos públicos continuaram crescendo compulsoriamente, como o aumento salarial dos servidores públicos e a redução dos recursos para obras públicas via orçamento. Outra política equivocada foi financiar com juros baixos alguns grupos chamados “campeões”, como JBS, Celulose Eldorado, Oi, Marfrig, Sete Brasil e outros com recursos do BNDES. Procurando manter uma política externa de liderança na América Latina e outras regiões, o Brasil também financiou obras fora do país, como em Cuba, Venezuela, Bolívia, Argentina, Uruguai, Angola, Moçambique etc., e que consumiram bilhões de dólares, gerando empregos no exterior em vez de gerar empregos no nosso país.

O governo Dilma, em vez de tentar reduzir o tamanho do Estado, fez o contrário e o aumentou, contratando mais servidores públicos; somente na área da educação foram mais de 200 mil servidores, passando o MEC a ter mais de 300 mil funcionários, que consomem 88% de seu orçamento em salários. Esse aumento na área da educação não buscou a qualidade do ensino, mas sim a quantidade através do financiamento de cursos superiores com o Fies, que gerou uma horda de endividados. Os cursos superiores não foram bem analisados; deveriam ser privilegiados os que pudessem atender às demandas reais do país como um todo, e a política correta seria aplicar mais recursos na base, começando com as creches e ensino em tempo integral, permitindo que os pais possam trabalhar. Hoje os recursos para educação no âmbito federal são aplicados, na maior parte, no ensino superior. Mesmo com a situação econômica e social se deteriorando, no pleito eleitoral de 2014 o PT venceu novamente, reelegendo Dilma Rousseff.

Em seu segundo mandato, e como consequência de sua política econômica-social, o país passou a ter crescimento negativo, a inflação voltou e houve a perda de credibilidade interna e externamente. Ao deixar o governo, por motivo de seu impeachment, Dilma deixou o país com taxa Selic de 16,5%, queda no PIB de 2,5% e a taxa de desempregados em ascensão.

O vice-presidente Michel Temer assumiu o governo com a economia bastante combalida. A boa condução do novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, reconduziu o país a um processo de crescimento. O governo até que ia bem e se propunha a fazer as reformas fundamentais, como a da Previdência, hoje já aprovada por Bolsonaro e que não aconteceu antes graças às denúncias do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, consequência da revelação das gravações de um encontro de Joesley Batista com o presidente Temer no subsolo do Palácio do Jaburu. Este episódio foi o fim do governo Temer, também marcado por irregularidades envolvendo Geddel Vieira Lima, Henrique Alves etc. Ainda assim, ao fim de seu mandato ele entregou um país melhor, com taxas de crescimento positivas, diminuição na taxa de desempregados e um razoável ordenamento jurídico.

Em março de 2014, denúncias pequenas em uma estação de serviço em Brasília acidentalmente foram analisadas com mais rigor, constatando-se tanta corrupção que resultaram na operação chamada Lava Jato. Foi quando se desvendou o maior esquema de corrupção do nosso país, mostrando como a Petrobras vinha sendo administrada e sua real situação. A Lava Jato trouxe à tona o que se escondia à sorrelfa e como a corrupção no Brasil hoje é sistêmica e institucionalizada. As empreiteiras passaram a mandar no orçamento e não há mais um planejamento sério.

O governo conduziu mal o acompanhamento da Lava Jato se precisava cortar bruscamente os recursos às empreiteiras, mas poderia ter adotado a solução dos Estados Unidos, que tratam as condutas ilícitas não fechando empresas, mas afastando os dirigentes responsáveis pelos malfeitos como corrupção e propinas. Os norte-americanos não matam as galinhas de ouro, que são suas empresas e que geram emprego e recursos ao próprio governo via impostos arrecadados; eles simplesmente afastam, julgam e punem com rigor os malfeitores.

Quanto ao fato de que algumas empresas fecharam, no entanto, reafirmo que não foi por culpa da Operação Lava Jato, mas por decisões políticas do governo, como foi o fechamento da Sete Brasil, empresa responsável pela gestão de todo o processo relativo às sondas, desde a contratação dos estaleiros que constituiriam os ativos, passando pela fiscalização e acompanhamento das obras e reporte à Petrobras e a seus acionistas do processo como um todo. Até hoje confesso que não entendi esse fechamento, a não ser para atender a alguns grupos brasileiros e estrangeiros, o que não é nada republicano. O fato é que com o fechamento muitos empregos foram perdidos.

Resumindo: com crescimento pífio e orçamentos públicos com poucos recursos a aplicar em obras de infraestrutura e outras demandas, só restaria ao governo cortar o orçamento – o que os políticos não permitem – ou aumentar as taxas de juros, podendo conduzir a um processo inflacionário. Essa situação como dizem nossos hermanos, “tarde o temprano” iria atingir as empresas privadas, como aconteceu com algumas grandes companhias, muitas das quais vieram a experimentar recuperação judicial ou simplesmente falir.

Para se sair dessa imensa crise, apenas contando com capitais privados, mas que só serão aplicados se exibirem rentabilidade. Há muito espaço para se bem utilizar esse capital tão necessário ao nosso desenvolvimento via concessão de serviços públicos, como nas áreas de transportes e saneamento básico, fornecendo água tratada e esgoto. Exemplo de uma boa concessão ocorreu em Maceió, que contratou serviços de água e esgoto tratado e que, num prazo de 20 anos, terão 100% de cobertura de água e esgoto para toda a Grande Maceió. Há várias necessidades que o nosso país precisa suprir e que a atividade privada pode fazer melhor e mais barato, com rapidez e sem delongas burocráticas do Estado, que é um mau administrador. O importante é que a transferência à atividade privada seja feita sob uma rigorosa fiscalização das agências e pelo governo; que as tarifas sejam justas; e que haja um respeito rigoroso aos contratos, e que estes sejam atos jurídicos perfeitos.


*Arquimedes Fialho é engenheiro civil aposentado do Ministério da Infraestrutura


Gazeta do Povo