Crise de Dilma reduz postos de trabalho com melhores salários
Geralda Doca, Patrícia Cagni, Thais Lobo e Fábio Teixeira - O Globo
Aumento do número de demissões no ramo do comércio. No Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio, empregados demitidos esperam para fazer a homologação. Fabíola Brazil, ex-funcionária da Casas Bahia. - Gabriel de Paiva / Gabriel
Mesmo com a crise no mercado formal de trabalho — que já eliminou 137 mil postos até abril e fez a geração de empregos recuar ao nível de 1999 — alguns setores resistem e estão gerando empregos. Um levantamento do consultor Rodolfo Torelly, do site especializado Trabalho Hoje, feito a pedido do GLOBO, revela as 20 ocupações que mais contrataram neste ano e as 20 com maior número de demissões.
A conclusão é que a crise está levando à destruição de empregos com melhores salários, em cargos intermediários de chefias - gerentes de produção e operações, de áreas de apoio e supervisores de serviços administrativos e da construção civil, por exemplo - e à abertura de vagas nas áreas da educação (professores do ensino fundamental, médio e superior); saúde (técnicos em enfermagem, por exemplo), e na base da pirâmide, em ocupações com baixos salários e alta rotatividade.
Entre as atividades que mais contrataram também aparecem operadores de telemarketing, recepcionistas e o ramo de manutenção de edifícios, como faxineiros e porteiros, auxiliares nos serviços de alimentação em hotéis e restaurantes, embaladores e alimentadores de linha de produção. O levantamento foi feito com base nos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho.
— Estamos perdendo empregos melhores, com maior remuneração, e criando empregos na área da educação, saúde e na base da pirâmide — disse Torelly.
Em um cenário difícil para a maioria das pessoas encontrar um emprego, a professora de educação infantil Luana Miranda, 30 anos, conseguiu uma segunda ocupação. Funcionária da unidade da Creche Escola Primeira na Barra da Tijuca, ela começou a procurar uma vaga em agosto do ano passado. O envio de currículos rendeu frutos rapidamente. Em novembro já fazia entrevistas e em janeiro estava empregada na creche. No mês seguinte, assumiu uma nova turma em outra filial.
— Já trabalhava no turno da manhã e queria uma ocupação também no turno da tarde. Tem demanda, vejo muitas escolas abrindo. Há mercado para todo mundo.
Luana Miranda, professora do Ensino Infantil na Creche Primeira, na Barra da Tijuca - Fabio Rossi / O Globo
O expediente, porém, tem um custo. Cada turno é de cinco horas. Somado ao tempo perdido no trânsito, são 12 horas que Luana passa longe do marido e da filha, de 7 anos.
— É cansativo, mas é um esforço necessário para poder manter o padrão e a qualidade de vida — conta ela.
Baiana natural de Irecê, Joélia Batista, de 26 anos, que vive em Brasília, também conseguiu boas oportunidades. Ela trabalhava com coleta e seleção de materiais recicláveis e soube de uma vaga para auxiliar de manutenção de prédios, que oferecia melhores condições de trabalho e retorno financeiro. Depois de participar do processo seletivo, foi contratada. Hoje trabalha das 6h às 16h e diz sentir orgulho da conquista.
—- Quando soube da oportunidade não pensei duas vezes. Consegui aumentar minha renda mensal e deixei de correr riscos na coleta seletiva — enfatizou.
Se certos males vêm para o bem, no caso de Fabíola Brazil, de 35 anos, uma demissão trouxe boas notícias. A técnica de enfermagem trabalhava há pouco mais de um ano como vendedora das Casas Bahia, no Norte Shopping, no Rio, depois de procurar sem sucesso vagas na área de saúde. Mas o movimento fraco no comércio levou a uma redução da equipe de vendas e ela foi demitida no fim de abril.
— As vendas não são como antes, e eu trabalhava por comissão. No início, tirava R$ 2 mil, mas depois passou a R$ 120, R$ 150. Os clientes não querem mais comprar com juros e não têm mais tanto para gastar. O shopping está cheio de gente olhando vitrine e comendo na praça de alimentação, mas na loja falam que vão comprar só em dezembro —- conta.
Agora, Fabíola voltou a trabalhar como enfermeira num hospital e espera complementar a renda da família:
— Foi meu marido quem segurou as pontas nesse início de ano. Com três filhos, os gastos com alimentação pesam muito. Os meses de fevereiro e março foram terríveis — conta.
Fortemente afetado pela crise, o mercado da construção civil em Brasília já acumula 13 mil demissões na capital, entre janeiro e março. Entre elas, cerca de 250 eram engenheiros. O empresário Paulo Muniz, presidente da Associação de Empresas do Mercado Imobiliário do Distrito Federal (Ademi-DF), contou que precisou tomar algumas decisões difíceis para manter a Construtora Conbral funcionando, como a redução da equipe.
— Nenhum empresário faz isso com felicidade. É uma questão de sobrevivência da empresa. A Conbral tem 47 anos no mercado imobiliário de Brasília. O último lançamento da empresa foi em 2010. Os problemas do setor não começaram agora. Em 2010 eram 1,2 mil homens trabalhando. Hoje, são 200 profissionais que trabalham em obras de terceiros.