Parece o Feitiço do Tempo, o filme em que Bill Murray fica preso numa armadilha do tempo e repete incessantemente o dia em que uma marmota prevê até quando o inverno inclemente vai continuar, um acontecimento folclórico nos Estados Unidos.
Só que Israel não é a pequena Punxsutawney, a cidadezinha americana em que acontece o Groundhog Day.
E, aparentemente, não tem nenhum final inspirador, com uma boa lição de moral, no ciclo de repetições eleitorais vivido pelo país.
Foram três eleições em um ano, sempre como empate ou uma diferença mínima entre o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e seu principal rival, Benny Gantz.
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Com ambos os partidos, o Likud e o Azul e Branco, conseguindo um pouco mais de 30% dos votos, nenhum consegue aliados suficientes para ter maioria no Parlamento.
E dá-lhe novas eleições. É um desgaste para um país que, como sempre, vive no fio da navalha.
E ainda mais agora com a perspectiva hipotética de que os Estados Unidos elejam o primeiro presidente judeu, Bernie Sanders, mas da cepa esquerdista que nem remotamente entende as duas realidades que levaram a direita israelense a se tornar a força dominante no país.
Um resultado direto do triste fracasso da base da política de paz, que demandaria a criação de um Estado palestino em troca de garantias de segurança para Israel.
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Todas as devoluções de território acabaram em mais inimigos armados e dispostos a tocar o terror em Israel. E no consequente fortalecimento de Netanyahu e de aliados mais linha dura ainda do que ele.
Sem alternância no poder, sempre um bom areador do ambiente político, o habilíssimo sobrevivente e manipulador Bibi foi se consolidando nos efeitos naturais do poder.
Como se tornou réu em processos por corrupção, conseguir mais um mandato virou uma questão mais extrema ainda para ele.
Uma situação ruim para o ambiente político. Mesmo para os padrões israelenses, as campanhas foram se tornando cada vez mais baixas.
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Os ataques contra Benny Gantz, ex-chefe do Estado Maior das Forças Armadas, a posição militar mais importante, perderam totalmente a perspectiva.
O general da reserva é tratado como fraco, desequilibrado, assustadiço, gago e perigoso para a segurança de Israel.
O nível de baixaria atingiu o fundo do poço quando um rabino revelou supostas. confidências, feitas supostamente sob o segredo da relações entre um conselhzeiro religioso e um fiel, pelo chefe de campanha de Gantz.
“Misteriosamente”, circulou a gravação de uma conversa em que Israel Bachar diz ao rabino que Benny Gantz seria “um perigo para o povo de Israel”.
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Bachar foi demitido e Gantz ressaltou o uso vergonhoso de um recurso desse tipo, mas o estrago já estava feito.
“Até onde Netanyahu vai chegar para escapar da justiça? Usar uma conversa particular de um rabino é horrível”, espetou o ex-general. “Bibi, você está envenenando o país.”
“Até os mais próximos de Gantz entendem que ele não pode ser primeiro-ministro. É um perigo para o país”, respondeu Bibi.
Acusado de se aliar com a frente de partidos que representam os israelenses árabes, em geral ligados ao velho Partido Comunista, Gantz já garantir que vai fazer um “governo judeu” – uma vergonha sob qualquer aspecto, político ou moral.
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Os partidos árabes aproveitam para mobilizar o eleitorado: se conseguirem 16% dos votos, apenas 3% do que na última eleição, poderão boicotar qualquer aliança de governo. E, com toda certeza, irão fazer isso O ambiente tóxico não só aprofunda as divisões, desfigura a democracia, torna mais difícil as alianças obrigatórias para sair do impasse.
Pior ainda, vai continuar. E, sem maioria nem acordos, pode levar a mais uma eleição, a quarta.
A Espanha passou por isso recentemente. É claro que sem o estado de emergência permanente que existe em Israel. Saiu do impasse quando o primeiro-ministro Pedro Suárez entregou os anéis e os dedos ao Podemos, o partido de extrema esquerda que ganhou um poder desproporcional à sua representatividade eleitoral.
É assim que funciona nos regimes parlamentaristas, com suas vantagens e desvantagens.
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Em Israel, as desvantagens estão predominando.
As pesquisas indicavam um pequeno aumento nas preferências pelo Likud, o que poderia ajudar a romper o impasse.
Talvez uma parcela do eleitorado queira simplesmente se livrar do problema, seja da maneira que for.
Ninguém fica bem nesse filme.
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