O governo pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) para ser liberado de cumprir certas exigências da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) ao criar medidas voltadas ao novo coronavírus.
O pedido foi feito pela AGU (Advocacia-Geral da União) por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade. No texto, o governo relembra que já está liberado do cumprimento da meta fiscal deste ano por causa do estado de calamidade no país (algo liberado pela LRF).
No entanto, a AGU alega ainda haver uma série de exigências da LRF e da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) cujo cumprimento se mostraria extremamente difícil no momento de calamidade pública.
Um dos maiores problemas, diz o governo, está na obrigatoriedade de indicar formas de compensação nos casos de aumento de despesas. A previsão está no artigo 114 da LDO e nos artigos 14, 16, 17 e 24 da LRF.
O pedido é feito em um momento em que o governo tem anunciado uma série de medidas para mitigar os efeitos do novo coronavírus na economia, mas sem transformá-las em ações efetivas. Técnicos do Ministério da Economia têm afirmado que a burocracia exigida pelas leis tem atrapalhado o ritmo dos trabalhos.
A visão foi reforçada neste sábado (28) pelo secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida. “Temos leis orçamentárias extensas, que fomos colocando ao longo do temo para dificultar o gasto. Fomos criando uma série de condições. Temos que tirar todo esse empecilho burocrático”, justificou em videoconferência com investidores.
O professor Marcelo Neri, da FGV (Fundação Getulio Vargas), afirma que a maior parte da flexibilização solicitada é importante considerando o momento de emergência por medidas.
“A situação agora é extrema. Vários países têm que fazer pacotes vultosos e o Brasil precisa até mais porque é um país pobre, então a necessidade de flexibilizar nesse instante é muito importante”, disse.
No entanto, o professor diz que há risco de danos à transparência se o governo for liberado até mesmo de apresentar estimativa dos valores das novas despesas. O artigo 16 da LRF determina que a criação ou expansão de gastos deve vir acompanhada da estimativa de impacto orçamentário no exercício em que entrar em vigor e nos dois subsequentes.
O mesmo artigo determina que o gasto extra deve ter adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a LDO.
Para a AGU, a obrigação deve ser relativizada em momentos excepcionais. “É que a exigência de demonstração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício atual e nos dois subsequentes pressupõe cenário de governança política dentro da normalidade”, afirma o texto da AGU.
“O mesmo vale para a exigência de compatibilidade de novos gastos com a legislação orçamentária vigente. A adequação orçamentária é um moderador normativo do planejamento a longo prazo, que só é plena de sentido em cenários políticos de previsibilidade”, defende o governo.
O professor contesta. “Um cheque em branco é sempre complicado. Vai ter aumento da dívida pública no Brasil, algo que vai ser pago por nós mesmos no futuro [possivelmente] com mais impostos. Acho que é o momento de ter flexibilidade com transparência, por isso um cheque em branco talvez seja perigoso”, afirmou.
A AGU pede uma liminar para afastar a exigência de demonstração de adequação e compensação orçamentárias para as medidas ligadas ao novo coronavírus e que, se julgado procedente o pedido, seja definitivamente julgada em caráter de urgência especial,
Fábio Pupo, Folha de São Paulo