sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

"Greve descarrilada", editorial da Folha de São Paulo

Zanone Fraissat/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL. 18/01/2018. Movimentacao na estacao Barra funda no inicio da manha de quinta feira, greve geral dos metroviarios. (foto: Zanone Fraissat/Folhapress, Cotidiano)
Movimentação na estação Barra funda durante a greve desta quinta (18)


Não se pode acusar o Sindicato dos Metroviários de São Paulo de deixar passar oportunidades para prejudicar a população da capital, até mesmo porque a entidade cria de moto próprio a maior parte delas. Cria ou fabrica, como na greve desta quinta-feira (18).

A enésima paralisação do serviço tem motivação política, sobre um pano de fundo de interesses corporativistas. Alega o sindicato que se trata de um protesto contra a "privatização" das linhas 5 e 17, como quem emite um anátema.

Em realidade, o que se encontra em licitação é a concessão por 20 anos —e não a alienação em definitivo— da operação das duas linhas, com valor estimado em R$ 10,8 bilhões. O lance mínimo monta a R$ 189 milhões, e a empresa vencedora se compromete a investir R$ 3 bilhões no período.

Espera-se que a abertura à iniciativa privada possa destravar as duas linhas, cujos obras se arrastam há anos —fato que não parece incomodar o sindicato. 

Sob administração estatal, a malha do metrô nunca chegou aos pés do que a metrópole necessita.


A linha 5 funciona só entre as estações Capão Redondo e Adolfo Pinheiro. Deveria conectar-se à linha 2, mas a expansão esbarrou em irregularidades da licitação noticiadas por esta Folha.

A de número 17 nem mesmo começou a operar, embora sua construção tenha principiado em 2012. O plano original era que fosse utilizada na Copa do Mundo de 2014, para facilitar o transporte ao aeroporto de Congonhas. Quem dera.

Com o encurtamento do trajeto imposto pelas dificuldades gerenciais e orçamentárias de governos tucanos (para não falar das denúncias de corrupção no setor ferroviário), a 17 já nascerá sem rentabilidade adequada. Soa racional, assim, incluí-la no pacote de concessão com a 5, cuja extensão aumentará o fluxo de passageiros.

Por mais que sindicalistas queiram demonizar a concessão privada, ela parece ser hoje a via mais desimpedida para melhorar o serviço do metrô. Não por acaso a única linha a funcionar sem percalços, nesta quinta-feira, foi a de número 4, de uma operadora particular.

Fazer greve, ninguém nega, constitui um direito. Criticável é o abuso que dele fazem os metroviários, paralisando a torto e a direito (mais torto que direito) uma atividade essencial para milhões e milhões de pessoas.

Bem agiu a Justiça do Trabalho ao ordenar a manutenção de 80% do serviço, no horário de pico, e 60% nos demais. Em seu desdém pelo que é certo, o sindicato mais uma vez ignorou a determinação.